A Conversa.

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Dia seguinte...

Quarta-feira, 31 de Março

P.O.V Sirilo

Os estragos causados pela tempestade na noite de ontem acabaram sendo devastadores, as ruas estavam quase intransitáveis, mais por conta da enchente do que por outra catástrofe, graças a Deus o bairro onde o novato mora não teve muitos estragos desse tipo. Por precaução, o senhor Benjamin sugeriu que eu passasse a noite na casa deles. Eu notei pela cara do novato que a possibilidade dos pais sugerirem que eu dormisse no quarto dele o incomodaria, portanto, apesar dele não ter dito nada, me prontifiquei a dormir na sala de boa, para alívio visível do novato e obviamente, alguns pontinhos extras pra mim, né?

Hoje de manhã, graças a Deus o meu carro não sofreu nenhum tipo de dano por conta da tempestade, apesar de ter passado a noite toda de frente a casa dos Spencer. Oliver teve que me emprestar outras roupas para poder ir pra escola, e vocês não imaginam como soube bem ver a cara de todo mundo na hora em que desci do carro, usando as roupas do novato, sugerindo implicitamente que havia passado a noite na casa dele. Apesar de não ter acontecido exatamente da forma como todos imaginavam, né, mas, dane-se, se era boa para minha reputação, então, deixe que rolem os boatos, ninguém se importa com os fatos. Pois é, pelo andar da carruagem, será uma questão de tempo e estratégia também, para que finalmente eu e o novato tenhamos nossa merecida e tão esperada sessão de prazer, que pelos vistos, está pra acontecer muito mais cedo do que eu imaginava.

Falei com o meu pai sobre o perfume criado pelo senhor Benjamin, e só o fato de eu ter mencionado que o homem era pai do Oliver, na hora o meu pai já quis chamá-lo pra conversar, obviamente não daria certo né, visto que estava chovendo muito, mas, ele me garantiu que hoje mesmo eles terão uma reunião, pra falarem sobre o perfume. Após o treino de futebol, meu pai me levou pessoalmente a ver a minha terapeuta. Ele ainda estava muito preocupado com a minha saúde e continuava sendo um sentimento muito ruim ter que mentir e fingir que não estava bem diante dele, era a única coisa que me fazia questionar se realmente todo esse jogo valia realmente a pena.

Na quinta-feira, o novato teve que ir fazer um trabalho em grupo na casa de uma colega aleatória lá, então, não foi necessário levá-lo de volta à casa. Era para mim a oportunidade perfeita para tratar do assunto “Kelvin”.

Com pretexto de devolver as roupas que o novato havia me emprestado fui até a casa dos Spencer. Estacionei de frente a entrada, desci do carro, com óculos de sol e a sacola de roupa na mão, pude notar alguns adolescentes da vizinhança com os celulares nas mãos, alguns gritaram meu nome e pediam que eu acenasse para eles, eu sorri e acenei, para delírio deles. Não era todos os dias que se tinha a oportunidade de conhecer o próprio irresistível ao vivo, né?

Atravessei o pequeno portão de entrada e me dirigi até a porta, toquei a campainha.

— Quem é? — gritou a senhora Spencer de dentro.

— É o Sirilo, senhora Spencer!

— Só um segundo.

Não demorou mais que um minuto para ela abrir para mim e assim que a vi, abri o meu melhor sorriso.

— Oi, filho. — com um sorriso simpático, ela cumprimentou.

— Boa tarde, senhora Spencer.

— O que te traz por cá? O Oliver teve que fazer um trabalho na casa de um colega.

— Sim, eu sei. Só passei pra devolver as roupas do Oliver. E também pra cumprimentar a senhora.

— Oh, quanta gentileza. Vamos, entra.

— Com licença.

Entrei após ela ter convidado.

— Estou aproveitando a ausência do Oliver hoje para fazer uma faxina completa na casa.

— Nesse caso eu não vou tomar muito o tempo da senhora.

— Imagina. Você quer beber alguma coisa? Sei lá, um suco? — ofereceu a senhora Spencer com bastante simpatia.

— Eu não quero incomodar...

— Deixa-te disso, filho. Você já é como um filho de casa.

Eu sorri de forma simpática.

— Realmente, não precisa, mas obrigado. Só vou aproveitar para usar o banheiro num instante, eu posso?

— Mas é claro. Fique a vontade. Qualquer coisa, já sabe onde me encontrar.

Ela retornou a cozinha para dar sequência à faxina e eu subi as escadas, me dirigi até a porta do quarto do novato. Coloquei a sacola de roupas por cima da cama e me sentei de frente ao PC do novato. Teclei num botão e a tela reacendeu. Ele obviamente não usava senha para acessar o usuário dele, porque era um garoto certinho que por ter a confiança dos pais eles não teriam motivos para mexer no PC dele sem o consentimento, facilitando muito a minha vida.

Abri o navegador e acessei o WhatsApp do novato, assim que abriu lá estava no topo da lista, Kelvin Sanchez, com o nome em meio aos emoji de corações coloridos, só de ver aquilo já me deu vontade de vomitar de tão brega, eca. Gravei o número do dito cujo para o meu celular. E automaticamente apareceu a foto dele na minha lista de contatos do WhatsApp. Missão cumprida, hora de dar um fora. Me despedi da senhora Spencer e voltei pra minha casa.

Subi para o meu quarto e me sentei na cama, retirei o celular e fiquei observando o contacto do meu maior rival, o único obstáculo que me separava do meu maior troféu. Cliquei no contacto e quis clicar no ícone de vídeo para efetuar uma chamada, porém parei por alguns segundos.

Confesso que nessa hora fiquei nervoso, meu coração batia um pouco acelerado, na minha mente soava tudo tão errado, eu juro que conseguia ouvir a voz do novato brigando comigo por ter invadido sua privacidade dessa forma, ouvia o meu pai me falando o quão decepcionado estava, essas vozes ecoavam tão alto na minha cabeça que quase desisti. Mas, imaginei o rosto do meu melhor amigo Pedro, rindo do meu fracasso por não ter conseguido domar um simples adolescente marrento idiota, imaginei o colégio inteiro rindo de mim, zombando de mim, aí me veio a memória do que eu teria que suportar o resto do segundo semestre sob as orientações do Pedro, e aquilo me deu até calafrios. Deus me livre transformar minha vida num Pedro versão 2.0.

No final, acabei clicando no ícone assim mesmo, e pude ver a tela de chamada se abrir, enquanto a ligação era completada. Seja o que Deus quiser agora. Depois de alguns longos segundos vejo o dito cujo atender finalmente.

— Você? — a cara dele de espanto ao me ver foi inevitável.
 
— Pois é, sou eu.

— Como raios conseguiu o meu número?

—  Eu não entendo por que as pessoas têm a mania de fazer perguntas tão idiota quando sabem que obviamente não terão respostas, sinceramente.

— Por que me ligou? O que você quer?

Revirei os olhos, sinceramente, eu não tenho paciência.

— Olhar para a tua cara de idiota era minha maior fantasia de vida. O que você acha? É óbvio que quer falar com você, como é óbvio né! — em tom de sarcasmo respondi.

— Eu duvido que a gente tenha algo a dizer um pro outro.

— Aí é que você se engana. Você até pode querer fingir que não, mas na verdade você sabe que temos sim. Precisamos falar sobre o Oliver. E é urgente.

Ele franziu a testa, visivelmente incomodado, porém, não disse nada.

Bem Me Quer Mal Me QuerOnde histórias criam vida. Descubra agora