80. Timothée

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  Você sente aquele vazio no peito as vezes e sabe que a culpa é toda sua por sua vida estar uma bagunça. Mas agora faz mais sentindo com o que eu já havia experimentado, a solidão.

   Meu copo de whisky está quase vazio e estou pegando no sono as duas da manhã todos os dias desde que falei com Astrid pela última noite. Não queria nem saber o que ela estava fazendo naquela noite, mas um lado egoísta meu  reverberava querendo os detalhes de tudo que ela estava fazendo, o ciúme pressionando de forma aguda no meu peito. Eu estava inundado por um abismo inquieto de pensamentos na sala vazia, o som da Tv ligado e as luzes coloridas transparecendo pelo ambiente e se refletindo nas janelas.

  O apartamento estava vazio essa noite, Katherine e Tina tinham ido jantar juntas e fiquei me permitindo relaxar para o dia de amanhã, minha agenda estava cheia e Hailey não parava de me enviar mensagens que eu ignorava o tempo todo. Eu queria mesmo me livrar dela por um dia que fosse, sentia a saudade apertada no meu peito, o egoísmo falando mais alto enquanto olhava a tela do celular plantado no sofá.  Eu sentia que não podia sair da minha zona de conforto ideal que era estar em Nova York ao invés de ser um pai presente para Luka, ele merecia algo melhor do que isso.

   Quando Astrid me disse que estava grávida a dois anos atrás, a alegria pulsante do meu peito dispensou qualquer sentimento abstrato naquele determinado momento, eu estava alegre e sabia que o rumo da minha vida seria gigantesco, mesmo assim não imaginei que isso me faria se afastar de Astrid por desejar tanto a fama desde os meus quinze anos, desejando ser independente suficiente para ser um cara melhor, mas eu sabia que não estava sendo nenhum um pouco diferente do que eu era a quatro anos atrás, eu não havia amadurecido, não havia evoluído nada além de se tornar mais egoísta e infame.

   Deslizei o polegar pelo celular, exibindo suas fotos espontâneas sorridentes, os lábios pintados de vermelhos e as bochechas esfriando pelo frio daquela cidade que visitamos no inverno. Eu sentia tanta falta de estar com ela, sentia falta dos seus beijos e da sensação térmica que seu corpo me causava. Ela era perfeita em todos os sentidos.

  Na tela o número de Hailey apareceu outra vez e decide por mim mesmo que ela não iria parar até falar comigo, eu havia passado o dia inteiro desaparecido, ignorando suas ligações, ignorando mensagens e me lamentando.

"Hailey." Falei de forma espontânea fingida.

"Por que diabos você não me atendeu?"

"Estava ocupado." Menti descaradamente, deitando as costas no sofá e me aconchegando nas almofadas. "O que foi?"

"Uma produtora quer assinar contrato com você para um novo filme que vai impulsionar sua carreira!"

   A notícia não me deixa muito motivado.

"O que eu tenho que fazer?" Perguntei. Hailey ficou em silêncio, eu sabia que havia algo nessa proposta que iria me pegar de surpresa no final.

"Eles querem notícias do seu rompimento com a Astrid." A voz de Hailey ficou abafada.

   Eu simplesmente não podia abrir minha vida toda como fiz nas últimas semanas.

"Não." Respondi decidido.

"O que?" Hailey engasgou. Eu estava confiante da minha decisão e estava surpreso por brevemente esclarecer a ela.

"Eu disse não." Afirmei novamente.

"Timothée. Deixa eu explicar uma coisa..." Ela começou. "Você está a um passo de se tornar o homem de Hollywood, não me diz que está voltando para trás..."

"Estou fazendo pela minha família, não vou expor minha..." Engoli em seco sentindo um bolo voraz na garganta queimar. "A Astrid, não vou expor a mãe do meu filho..." Ouvi Hailey bufar tenebrosamente.

"O que eu vou dizer a produtora?"

"Inventa qualquer coisa. Só me deixa em paz." Pedi, desligando o telefone antes de ouvir sua voz.

   Eu estava certo dessa vez, estava tomando minha decisão e isso mudaria muita coisa, mas eu estava cansado de meter Astrid nas minhas burradas.

   Levei a garrafa de whisky para o quarto e fiquei bebendo até de madrugada ouvindo Bon Jovi até adormecer, com o sol crescente no espaço entre mim e os lençóis, me alinhei ainda mais ao tecido fino sendo esquentado pelos raios solares e afundei no colchão por mais algumas horas até meu celular enlouquecido começar a vibrar.

  Bati a mão contra ele e o pesquei, levando a orelha ao atender.

"Papa!" O grito se estendeu pelo espaço e eu afastei o celular para checar de quem se tratava.

"Luka? Luka?" Saltei da cama vestindo nada menos que uma cueca branca. Escutei a voz de Astrid aos fundos. "É você filho?"

"Papa!" Meus olhos transbordaram de lágrimas quentes de uma mínima culpa angustiante.

"Ele disse as primeiras palavras." Astrid disse. "Eu nem acredito nisso! Eu estou enlouquecida." Astrid disse empolgada.

"Puta merda! Isso é...é..." as palavras fugiram furiosamente da minha boca quando me dei conta que estava soluçando. "Minha nossa."

"Você está bem?" A dor de cabeça me deixava angustiado e o sabor do whisky ainda estava na ponta da minha língua.

"Vou ficar." Lamentei. "Vai ficar tudo bem." Sussurrei querendo acreditar em mim mesmo naquele momento.

"Podemos conversar?" Perguntou com a voz suave e manhosa, a voz que eu adorava ouvir.

"Podemos."

"Eu estou saindo com um cara."

  Eu desabei, friamente as pontas dos meus dedos se apertaram no celular e quis desligar.

"Faz dois dias, é um amigo da Hannah e..."

"Astrid eu não quero saber dos seus relacionamentos." Trinquei os dentes. "Saía com quem quiser." Afetado, desliguei o telefone e joguei meu novo celular no embrulho de lençóis. Meus lábios cerraram com tanta força que pude sentir o gosto do sangue se movendo entre eles, meu coração se apertou de uma forma que perdi todo o ar.

  Merda, o que diabos eu estava fazendo?

  Ela tinha todo direito agora que não estávamos mais juntos, eu não tinha o direito de me sentir dessa maneira, desolado e enciumado. Eu não devia nem se quer cogitar esse sentimento inoportuno, Astrid merecia algo melhor do que isso e eu não era capaz de lhe dar isso, eu não era capaz de fazer muito e saber disso me machucava, era capaz de ser imaturo e fugir de todos os problemas tão depressa que eu não podia simplesmente argumentar na vida de Astrid, ela podia viver enquanto estávamos a distância, podíamos viver sem o outro e crescer com nossas vidas.

   Mas eu não sabia por quanto tempo iria suportar.

TOMORROW| Timothée ChalametOnde histórias criam vida. Descubra agora