98. Astrid

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    Encontro Luka sentado no gramado do outro lado do funeral,  não quero abordá-lo de maneira indiscreta porque sei que está furioso, ou não teria feito o que fez, mas ele não podia sair despejando suas emoções quando elas machucava-me outras pessoas.

"Luka." Eu me sento ao seu lado e cruzo as pernas.

"Por que ele foi embora? Por que ele tinha que ser tão egoísta?" Os olhos dele estão cheios de lágrimas, e isso é muito doloroso para qualquer mãe. "Ele nem se quer lutou por nós, nem se quer lutou por mim." Ele soca o gramado e inclina a cabeça devagar. "Eu o odeio muito! O odeio tanto por ser fraco, por preferir a morte."

"Luka." Seus olhos desviam para mim, esfrego os polegares nas suas bochechas. "Você não conhecia seu pai porque eu o afastei, mas Timothée era um homem bom."

"Eu sei que era. Mas o que isso ajudou? Ele fracassou como pai." As palavras dele cortam meu coração, é como uma faca, é doloroso demais ouvi-lo sentir raiva de Timothée. Ouço passos lentos se aproximando e olho para trás, Hannah está vindo até nós.

"Posso?" Ela aponta para o outro lado.

"Pode." Eu permito e ela se senta ao lado de Luka.

    O sol estava se pondo, e a noite estava chegando, nenhum de nós fez muita questão de se mover quando todos estavam começando a ir embora.

"Estão com fome?" Hannah diz depois de tanto tempo em silêncio.

"Acho que sim." Luka se levanta da grama e fica de pé, limpando os jeans.

  A cerimônia foi tão tensa que não consigo parar de pensar nela, não consigo parar de pensar que estamos aqui.

   Hannah nos leva até um restaurante de centro e comemos pizza com milk shake, não estou com muita fome e só bebo água. Ethan está me ligando, mas o evito desde o funeral. Luka está brincando das máquinas de vídeo game do outro lado e Hannah e eu estamos sozinhas.

"Você sabia?" Eu pergunto. Hannah limpa a boca e suspira.

"Ele mencionou que passaria algumas noites longe, mas não que...faria algo assim."

   Meus olhos se enchem de lágrimas.

"Ele disse mais alguma coisa?" Sei que Hannah passou mais tempo com Timothée durante esses oitos anos do que eu. Ela balança a cabeça.

"Ele tinha...alguns surtos..." Ela suspira mais pesado. "Quebrava coisas, se machucava, mas nunca mencionou nada sobre tirar a própria vida, ele estava fazendo terapia duas vezes na semana."

"Do que ele tinha medo?"

"Da perfeição, ele se julgava tanto, mais tanto, que era impossível entender a cabeça dele, ele fazia o possível e o impossível para ser perfeito, todos os detalhes e sempre acabava indo para um caminho errado porque sentia que era mais fácil se sabotar." Hannah esfrega o rosto que fica vermelho de repente. "Timothée me disse que ele odiava o dia de amanhã, ele acordava todos os dias, mas que odiava a sensação de viver de novo, e de novo, que odiava respirar, talvez isso tenha sido o sinal, mas acabei não percebendo..."

  Passo a mão pela lágrima que escapa dos meus olhos.

"O amanhã para ele era um enigma, ele nunca sabia o que ia acontecer, ele nunca sabia se ia errar de novo, se ia fugir ou enfrentar, mas ele tentou, até onde podia."

"Ele tentou." Repito, talvez para mim mesma, eu devia ter reconhecido seu esforço, devia ter reconhecido que ele estava se esforçando por mim. "Você acha que ele teria feito diferente se eu..."

"Não." Hannah responde firme. "Ele não teria mudado por você. Não teria mudado por ninguém."

   A magoa enche meu peito e eu começo a chorar, é tão difícil saber que ele não está mais aqui, que não vou vê-lo de novo, não vou mais sentir sua presença. Ethan está me ligando e dessa vez eu atendo.

"Onde diabos você está?" Ele pergunta em um tom furioso.

"Estou indo para casa."

"Ótimo." Desliga. Enfio o celular na bolsa e me levanto. "Obrigado Hannah."

"Eu levo vocês." Hannah se levanta e deixa alguns dólares na mesa, chamo Luka e vamos até o carro.

    Ethan está bebendo quando chego em casa, Luka vai direto para o quarto.

"Como foi?" Ele pergunta, mas sei que não está interessado. Tiro os sapatos e deixo na entrada.

"Não queira saber." Respiro um pouco aliviada ao sentar ao seu lado. Ele coloca a mão sobre a minha e aperta.

   Não é essa a vida que eu quero, não quero ser a esposa que fica em casa se lamentando, quero trabalhar, quero terminar meus sonhos, quero cuidar dos meus filhos e quero fazer valer a pena pelo Timothée.

"Ethan." Minha voz sai trêmula. "Eu quero o divórcio." Ele engasga com a bebida e cospe de volta na lata.

"Você está maluca?" Ele se levanta. "Por que?"

"Porque não é isso que eu quero, não é isso que eu queria desde o começo."

"Sua..." Ethan amassa a lata de cerveja e joga no canto da sala, eu tiro a aliança e coloco no centro da mesa.

"Vou pegar minhas coisas e vou embora com o Luka."

"Você não pode!" Eu o ignoro, um alívio intenso pressiona meu peito, estou mais leve, bato a porta de Luka e o chamo para finalmente irmos embora.

   Estou dirigindo a quase quatro horas até a casa da minha mãe, Luka está dormindo no banco, e a música na rádio preenche o carro em movimento. Ela está a minha espera na porta quando chegamos e me ajuda com as malas. Mamãe me envolve em seus braços quando começo a chorar, não pelo o que acabe de fazer, estou aliviada por acabar tudo com Ethan, mas porque sinto falta dele e isso vai doer para sempre.

"Quando isso vai parar de doer?" Murmuro, minha mãe segura meu rosto nas mãos.

"Nunca." Ela sussurra. "Vocês se amavam. Mas não sabiam como amar um ao outro da maneira certa."

  Eu queria abraça-lá de novo e de novo.

   Se ele estivesse aqui, talvez as coisas teriam sido diferentes, mas ele não está, e eu faria tudo para continuar o que ele não pode.

TOMORROW| Timothée ChalametOnde histórias criam vida. Descubra agora