Capítulo Dez

54 7 442
                                    

Abri os olhos devagar e tentei me acostumar com a pouca luz que havia dentro do quarto. O abajur de luz amarela e fraca estava ligado, e as cortinas cor de creme que iam do chão ao teto haviam sido fechadas por completo sem que eu me desse conta disso.

Eu estava agarrada aos lençóis cinza chumbo que cobriam a cama, e só entendi o motivo daquilo quando percebi que estava sem as minhas roupas. Eu não fazia ideia de que horas eram, mas sabia que ainda não havia amanhecido por conta do escuro que cobria o restante de meu pequeno apartamento.

Virei para o lado e dei de cara com as costas nuas de Vitor. Ele estava coberto apenas até a altura da barriga, e seus cabelos cobriam levemente o travesseiro com tons dourados. Fiquei em silêncio enquanto analisava aquela cena. Sua respiração baixa e tranquila de sempre parecia preencher cada canto antes desocupado. Apesar daquilo ser um erro, era bom tê-lo comigo em casa.

Saí da cama sem fazer nenhum barulho. Vesti o sutiã e a calcinha novamente, mesmo me sentindo à vontade para ficar sem as duas peças. Juntei as roupas espalhadas pela casa e organizei a sala. Ralhei com a mesinha de centro ao tropeçar nela enquanto procurava meu celular em cima do sofá.

Eram quatro e quinze da manhã. Havia uma mensagem de Charlise cancelando a conversa com Serena no dia seguinte. A velha estava resfriada, por isso acharam melhor cancelar as entrevistas pelo resto daquela semana. Achei ótimo, em um primeiro momento; eu não estava mesmo planejando ir ao trabalho na manhã seguinte.

Mais duas mensagens de Lucius confirmando que Hilda estava bem e que as noites estavam sendo mais tranquilas depois da adaptação dela em casa após o AVC. Por alguns minutos eu fiquei feliz, desejando que aquele otimismo durasse um pouco mais.

Acendi mais um abajur e fui até a cozinha. Coloquei água para ferver na chaleira elétrica e mordisquei uma maçã enquanto esperava.

Olhei na direção do quarto e vi que Vitor ainda dormia. Tudo em mim estava com o cheiro dele. Eu ainda era capaz de estremecer ao lembrar de tudo o que havíamos feito horas antes. Eu sequer sabia quando foi que decidimos dormir, estava um pouco confusa ainda. A chaleira apitou baixinho e sua luzinha colorida foi desligada. Preparei um pouco de chá em uma xícara e enquanto bebia lembrei de algo importante. A foto que tirei do papel escondido no paletó de Vitor horas antes.

Saí em busca do meu celular e abandonei a xícara na bancada. Pesquisei o endereço da foto na internet e deixei o celular cair da mão ao perceber do que se tratava. Não. Aquilo não estava acontecendo. Não poderia estar. Não deveria estar acontecendo.

O sangue começou a correr mais rápido dentro das veias. A minha respiração já não era mais regulada e todo o apartamento pareceu girar lentamente ao meu redor.

Por que Hilda havia feito aquilo? Por quê Vitor havia se sujeitado a aquilo?

Esfreguei o rosto. Eu não estava pensando direito. Tudo havia se tornado tão doloroso em menos de cinco minutos.

Cambaleei em direção ao banheiro e encostei a porta. Acendi a luz e evitei o meu próprio reflexo no espelho. Eu não queria ter o desprazer de encarar os olhos de quem havia me desprezado anos antes. Eu ainda lembrava de ouvir todos elogiarem as semelhanças que tínhamos quando estávamos lado a lado.

Me sentei ao lado do box e fiquei em silêncio. Eu sentia tanta raiva. Todo aquele desprezo e esquecimento ainda estavam vivos dentro de mim. Nenhuma nota, nenhum cartaz, nenhum folheto perguntando onde eu estava, lembrando-se da minha existência. Era como se eu nunca tivesse existido.

Meu peito doía, e eu lamentava estar sozinha naquele momento, pois pelo menos se não estivesse, não descontaria toda a raiva que sentia em mim mesma.

Imogen - Amor e VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora