Capítulo Quarenta e Três

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Antes

Apenas quarenta minutos haviam se passado desde que eu havia estacionado o carro no fim daquela rua sem saída, mas para mim, que havia ficado incumbida de dirigir após o trabalho daquele dia ser finalizado, parecia muito mais. Eu estava apurada para ir ao banheiro, sem falar na fome monstruosa que estava sentindo. O tédio que estava sentindo em ficar presa dentro daquele carro estava me consumindo por dentro, de modo que eu já estava completamente sem paciência para continuar esperando.

Olhei pelo retrovisor e vi duas garotas subindo a rua juntas, metidas dentro de seus uniformes escolares. As duas riam de algo que havia acabado de acontecer, e falando em um francês um pouco enrolado, passaram pelo carro e foram em direção ao prédio onde estávamos coletando naquele dia.

Não senti urgência em avisar a minha companheira para tomar cuidado ao andar pelos corredores, por isso permaneci onde estava, sentindo um calor absurdo dentro do carro.

Mais quinze minutos se passaram. Nada. Ninguém saindo ou entrando no prédio. Tive vontade de ligar e perguntar qual era o motivo de tanta demora, mas me contive. Eu não queria enfurecê-la e sabia que aquilo era uma péssima ideia. Pesquei o celular no console do carro e dei uma olhada nas notícias da semana. Nada de interessante acontecendo em Bruxelas, mas em Londres, a coisa estava pegando fogo. Sorri ao ler uma nota sobre o desmantelamento da mineradora que os Hawk tinham no Brasil. Após as denúncias virem a público e a polícia se envolver nas investigações, as notícias se espalharam e tudo rapidamente se tornou um escândalo de nível internacional.

Uma enxurrada de denúncias veio à tona após o início das investigações, e para a banda podre da família Hawk, não houve uma saída além daquela que os obrigava a recuar com os negócios ilegais por um bom tempo. Poucas coisas vinham me causando orgulho naquelas últimas semanas, mas saber que o meu trabalho havia contribuído para o fim da escravidão de tantos inocentes era como ter um lampejo de algo parecido com isso bem lá no fundo da minha alma.

Dois meses haviam se passado desde que eu havia chegado a Bruxelas, e exatos vinte dias que eu havia concordado em acompanhar Louisa em seus roubos. Sim. Eu havia reencontrado minha mãe, e sim, mesmo após todos aqueles anos, ela ainda sabia surrupiar o que era dos outros como ninguém.

Quando cheguei a Bruxelas, passei alguns dias hospedada em um hotel no centro, me preparando para ir ao encontro dela. De certa forma eu acho que teria sido mais efetivo se eu tivesse dado atenção a todos os alertas em minha mente, aqueles que me diziam para arrumar as minhas malas e voltar para Londres o quanto antes. Mas ao invés disso, resolvi ficar e encarar o que pensava ser o meu destino.

O que aconteceu após o nosso reencontro foi uma sequência de coisas loucas e inesperadas. Eu ainda não sabia decifrar o que é que estava sentindo depois de ter a chance de estar com ela tantos anos depois da nossa separação, mas de alguma forma, eu me sentia completa.

Não pensei muito sobre como me apresentaria para ela, ou sobre como reduziria aquela lacuna que naturalmente existiria em nosso relacionamento como mãe e filha, eu apenas surgi em sua porta e tentei entender o que a expressão em seu rosto dizia. Louisa tentava esconder o seu estarrecimento e a sua dúvida como quem esconde algo que quer comer, mas não consegue por conta do embrulho de plástico.

No fim, eu sequer precisei chamá-la de mãe para que ela soubesse quem estava diante de si naquele momento. Os meus olhos e os traços tão parecidos com os dela denunciavam tudo sem que nenhuma de nós duas precisasse falar qualquer coisa. Eu gostaria de dizer que fui recebida na casa de minha mãe como aquele filho pródigo da Bíblia, que mesmo após renegar a própria família e querer o que era seu por direito antes da hora, foi recebido de braços abertos por seu pai, mas não foi o que aconteceu. Louisa não podia ser e nem parecer mais fria e distante do que já era. Em minha recepção não houveram beijos carinhosos e abraços recheados de saudade materna, e eu sequer pude reclamar, pois todos me disseram que seria assim.

Imogen - Amor e VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora