Perdoe-me ou não

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King Island, das Cinco Ilhas.

Sujin se esgueirou pelos corredores, tentando parecer casual ao fazer isso. Ela tinha prática em fingir e atuar, então não foi muito difícil driblar os olhares desconfiados dos soldados em ronda ou em guarda pelo caminho. Mesmo assim, ela estava nervosa.

A rota dela já era questionável por si só, pois não havia nenhum outro caminho que levasse às celas sem ser o corredor, estreito e vazio, com uma única porta de pedra no fim, para o qual ela estava se dirigindo. E sendo ela a tomar aquele caminho, a situação se tornava dez vezes mais duvidosa. 

A sorte de Sujin era que os soldados eram bem menos intrusivos com ela, talvez por saberem quem ela é — apesar dela duvidar disso — ou talvez por influência de Seonghwa. De qualquer forma, ela não se importava com esse detalhe, desde que eles a deixassem ir e vir de onde e para onde quisesse. 

Ela apressou o passo quando chegou no tal corredor estreito. Não havia portas para cômodos, mobília ou decorações ali, mal havia espaço para duas pessoas caminharem lado a lado. Havia apenas aquela enorme porta de pedra no fim do corredor. Porta essa que Sujin precisou usar uma força considerável para abrir, e ela rangeu como uma criatura antiga e cansada, mas não tinha ninguém perto para ouvir — Sujin se certificou disso nos segundos em que parou e observou o corredor, à espera de algum soldado para atrapalhá-la. Nada aconteceu, ninguém apareceu, então ela atravessou para o lugar ainda mais apertado e escuro atrás daquela porta. 

Sujin fechou a porta atrás de si e toda luz se foi imediatamente. Mas ela estava preparada, sabia como era ali. Seu pé se movia cuidadosamente para encontrar o degrau de baixo enquanto ela tateava a parede rochosa. Quando sentiu confiança onde pisava, começou a descer rápido. As duas mãos espalmadas nas paredes a ajudavam a se equilibrar na escuridão enquanto descia a escada caracol de pedra. 

Não demorou até ela chegar onde havia tochas para iluminar o restante da descida, e Sujin sorriu de alívio automaticamente quando o caminho ficou claro, descendo ainda mais rapidamente. 

O andar de baixo era pequeno, úmido e tinha cheiro de carniça, causava um peso nos pulmões no momento em que se colocava os pés lá. Mas Sujin já tinha ido até lá umas duas ou três vezes para ver Kyum, a podridão do ambiente já não a incomodava tanto mais. 

Porém, independentemente de quão acostumada fosse com aquele calabouço, ela sempre tomava um susto com o corpo decomposto encostado na parede da primeira cela, com as roupas corroídas e despedaçadas ainda vestidas no esqueleto carcomido. A tocha ao lado da cela permitia ver que as roupas um dia foram de tons de azul, apesar do desgaste, e a insígnia bordada onde já fora o peito do cadáver ainda era evidente: um trovão entre duas taças. Aquele conjunto de ossos já fora o herdeiro de Hori, que morrera ali depois de Hang se revoltar com a fuga de Hongjoong treze anos atrás e mandar matá-lo. 

O herdeiro de Hala, Sujin nunca tinha visto. Nem naquelas celas e nem em nenhum outro lugar depois da Invasão. E ela não se permitia imaginar outro corpo morto de um rapaz na casa dos vinte anos. 

Por sorte —  ou destino —, não era o filho dela naquele lugar. E teria sido muito pior se fosse, pois Hongjoong era só uma criança na época, diferentemente dos herdeiros de Hori e Hala, que já eram jovens adultos. 

Então, como das outras vezes, ela passou por aquela cela ignorando o esqueleto com a mandíbula aberta, dizendo a si mesma mentalmente que era impossível uma caveira estar olhando para ela. Mais duas celas vazias e lá estava Kyum, sentado de forma assustadoramente parecida com o esqueleto. 

Iluminado por uma única tocha, Kyum tentou se mover assim que a viu, mas seu corpo estava tão pesado, tão fraco. Sujin se ajoelhou imediatamente para ficar próxima dele e começou a mexer em uma das bolsas de pano que trazia amarradas na cintura. Tirou de lá um pedaço pequeno de frango assado embrulhado em um pano de prato e um pão inteiro; da outra, ela tirou dois cantis pequenos de água e entregou tudo a ele rapidamente através das grades. 

Ele é o ReiOnde histórias criam vida. Descubra agora