Capítulo 27: Arrumando as malas

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*Esse capítulo contém conteúdo sensível.

Dias atuais. 2013. São Paulo.

Rodolffo arrumava suas coisas em duas malas. Os demais pertences ficariam ali, ele não queria levar consigo nada que pudesse lhe trazer maiores lembranças do que viveu naqueles cinco anos, sendo o primeiro o pior de todos. Foi naquele ano que ele descobriu tantas coisas e se decepcionou muito.

Seu tio João o levou a São Paulo para trabalhar, mas não por que ele era um bom profissional e o tio acreditava no seu potencial, mas sim por que seu pai e sua mãe pediram para que ele o levasse e inclusive deram dinheiro para que isso fosse possível. Foi a maior decepção da vida de Rodolffo, isso foi descoberto por ele após seis meses estando em São Paulo, quando ele cansou de ser roubado por seu tio.

Lembranças de 2009.

Rodolffo: o senhor não pode ficar com o meu dinheiro. Não pode. Eu preciso dele para voltar.

João: que voltar que nada. Sua mãe me proibiu de te deixar voltar.

Rodolffo: minha mãe jamais faria isso. Ela sabe que eu vim pra cá contra a vontade. Mas eu prometi que voltava.

João: ela não quer que você volte. Ela não quer que você fique com rabo de saia por aí.

Rodolffo: rabo de saia? Juliette não é isso. Ela é minha namorada e futura esposa.

João: esqueça essa moça, seus pais não fazem gosto nesse casamento. Tu é muito novo menino, deixa de besteira.

Rodolffo ficou bravo.

Rodolffo: devolva meu dinheiro agora, seu ladrão. - gritou com o tio.

João: dê o fora da minha casa, seu preguiçoso de quinta. Não te quero mais aqui. Seu fedelho.

Rodolffo: devolva o meu dinheiro.

João: não! Não vou devolver. Tu viveu aqui de graça e ainda é ingrato.

Rodolffo: de graça nada. Eu sempre te paguei caro por isso aqui e praticamente não me sobra nada, e tu ainda quer me roubar.

João: junte o quê te pertence e vá embora. Se não vou chamar a polícia, ainda posso alegar que você me roubou.

Rodolffo estava mortificado. Como pode seu próprio tio lhe fazer uma coisa tão terrível? Mas ele juntou o quê era seu e foi embora. Ele ainda tinha um emprego que pudesse lhe sustentar. Só precisava achar um lugar que o recebesse sem dinheiro.

...

Aquela foi a primeira chacoalhada que ele tomou e saber a verdade sobre seus pais lhe doeu, mas ele não deixou de ajudar com o quê pôde. Ele sabia que pai e mãe podiam errar, mas ainda eram para sempre.

Com sacrifício e depois de dormir uma noite na calçada, ele conseguiu alugar uma kitnet perto de onde trabalhava. Ficou ali por dois meses e sofreu um assalto. Roubaram tudo que ele tinha e até seus documentos entraram nessa lista. Quem invadiu aquele lugar queria mesmo acabar com sua vida. Rodolffo chorou por que foi a coisa mais dura que ele havia vivido até aquele dia, por sorte fizeram isso enquanto ele estava fora.

Para piorar sua situação, seu patrão lhe dispensou. Ele não entendeu o por quê. Sempre estava ali dando o duro e fazendo o máximo, como sempre fez em toda a vida, mas aquele patrão não era piedoso e lhe deu um pouco de dinheiro lhe dispensando logo em seguida. Esse pouco dinheiro deu para ele sobreviver por um curto período de tempo. As portas se fecharam para ele e não conseguia trabalhar em nada, nesse tempo ele enviava cartas a sua mãe contando a situação e também enviava a Juliette, mas ela nunca o respondeu. Ele a julgava ingrata por abandoná-lo no pior momento de sua vida, mas ele sabia que ela havia ficado chateada com ele por causa dessa viagem.

Após mais de um mês sem trabalho algum e sem conseguir pagar a kitnet, Rodolffo foi morar nas ruas. Nunca imaginou que seria possível viver daquela forma, mas ele viveu. Foi duro e ele quase morreu de fome. Ele buscava trabalho, mas nenhuma porta se abriu, nem para limpar um terreno ou coisa parecida. Ele se sentia abandonado e desfalecido. Seu destino era a morte ele pensou, de fato não conseguiria sobreviver por mais tanto tempo.

Foi aí que veio o tiro da misericórdia. Numa noite muito fria, ele dormia enrolado com papelões e sua barriga roncava de tanta fome, Rodolffo imaginou que não acordaria vivo no dia seguinte. Ele orou a Deus, pediu perdão e lembrou dos que amava, principalmente de sua Julie, talvez ela nunca mais saberia de sua existência e ele fosse enterrado ali como um indigente, mas desejou que ela o perdoasse.

Ele acabou pegando no sono e acordou sentindo e vendo seu corpo em chamas, haviam ateado fogo nele. Sua roupa era grossa, mas não impediu que queimaduras se fizessem em suas pernas, braços, pescoço e até na região do seu abdômen. Rodolffo foi socorrido pelo serviço médico de saúde e resgatado antes de morrer queimado.

Ele tinha um teto sobre sua cabeça de novo, mas seu corpo estava muito ferido e ele ficou ali por muitos dias até conseguir se recuperar.

Nessa terrível estádia hospitalar ele se alimentava e tinha ao menos condições de viver como gente. Lá ele foi acolhido e através de uma carta, já que eles ainda não tinham telefone na época, sua família foi avisada do seu estado e da gravidade dos seus ferimentos.

As queimaduras mais difíceis de sarar foram as das pernas e isso o deixava bem preocupado, mas a equipe médica o tranquilizou. Nesse lugar ele fez muitas amizades, e isso lhe abriu portas que antes estavam fechadas.

A primeira porta foi a de ser caseiro em uma casa que os patrões viviam fora. Ele teria um quarto, um salário e comida, sua dignidade voltaria. Suas funções seriam cuidar da casa e dos cachorros, assim como zelar o jardim. Ele aceitou sem pensar muito e ficou ali por quase dois anos. Era uma vida solitária, mas ele aproveitou o tempo que tinha livre e resolveu estudar. São Paulo era boa cidade por ter vários cursos interessantes e ele se interessou por coisas de sua competência, que era voltada a mecânica de máquinas e automóveis.

Nesse tempo ele resolveu se afastar de sua mãe e de seu pai por que na sua cabeça eles eram culpados por toda a dor de sua vida. Quando ele podia mandar alguma ajuda ele mandava, quando não, evitava dá satisfações. Ele enviou o dinheiro para que Bella comprasse um celular, só lhe interessava conversar com sua irmã, ela sim o amava.

Nesse tempo ele pensava menos em Juliette, isso por que também estava magoado com ela e instruiu Bella a não dá notícias de sua vida a ninguém. Só ela saberia um pouco de sua situação de vida.

Depois de concluir dois cursos, lhe foi apresentada a oferta de trabalhar num montadora de veículos. Ele aceitou sem exitar. Era um bom salário e ele faria o quê gosta, pelo menos nisso ele teria algum contentamento. Atualmente faziam mais de dois anos nessa empresa e eles o achavam um funcionário excepcional. Hoje ele tinha um bom cargo e isso lhe trazia um bom retorno financeiro. Todos os meses ele conseguia enviar dinheiro para os pais e a irmã, e além disso ele morava em um apartamento bom e confortável. Mas sua hora de voltar a Paraíba havia chegado.

Ele iria tirar férias e depois iria trabalhar na filial da empresa aberta em João Pessoa. Ele desejava voltar a sua terra, mesmo sabendo que nada seria como antes, seu desejo era se sentir em casa novamente.

Campina Grande seria sua primeira parada e ele até já sabia o lugar que queria ir assim que chegasse lá.

...


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