A superação de Juvenal

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_ Aqui na "Rádio Colher de sopa" começa mais um show de bandas, com seu locutor favorito: Juvenal Neves, direto da 88.7 de Caxias! Se você quer oferecer aquele arrasta-pé pra patroa, bate um fio pra gente, arreda o sofá da sala e faaaz a festa!
_ Seu Juvenal! Os pacientes precisam de silêncio!
A enfermeira sorri, mas explica :
_ Sr Juvenal, mesmo que o senhor seja meu locutor favorito, esse não é o lugar nem o momento para treinar seu timbre de voz e sua dicção!
_ Eu tô é de bem com a vida, enfermeira! Eu tava morto de dor com aquela rejeição da platina na minha perna... Deus me deu uma chance de acordar sem dor hoje, não acha que eu preciso comemorar?
_ Mas vai devagar com o barulho, Sr Juvenal! Há doentes aqui. E o senhor é um deles...
_ Corrigindo, enfermeira... Fui um deles. Agora, o Juvenal aqui tá novinho em folha! Quero saltar de banda dessa cama e abraçar minha patroa e o meu guri... Tô tapado de saudade da Teresinha e do Francisco!
A enfermeira, com os olhos marejados, surpreendeu-se ao ver tanto entusiasmo em um paciente que teria todos os motivos para estar triste, pois o acidente quase fatal fez Juvenal perder a
a visão de um dos olhos, e agora, o privara de uma das pernas.
_ Admiro seu entusiasmo, Sr Juvenal! Se todos os pacientes fossem otimistas como o Sr, a recuperação deles seria mais rápida...
_ Escreve aí, enfermeira! Eu vou colocar essa prótese na perna e vou sair desse hospital pedalando!
_ Devagar, Sr Juvenal!
_ Já perdi muito tempo nesse hospital, enfermeira! Mais um pouco e peço pra instalar uma rádio pirata aqui no hospital, só pra ver esse povo feliz e se recuperando mais rápido!
_ Em parte o Sr tem razão: uma pessoa feliz se recupera muito mais rápido. Veja o Sr, acabou de amputar uma perna e já quer sair pedalando!
_ Tristeza pra que, enfermeira? Deus me deu duas pernas e eu perdi só uma... Mas os doutores vão colocar uma prótese e vou sair novinho em folha, pra abraçar minha patroa e meus guris!
Ao falar de Teresinha e dos meninos, uma sombra passou pelo semblante de Juvenal. Uma grossa lágrima desce pela face...
_ Reparei que ficou triste, seu Juvenal... Tem muita saudade de sua família, não?
_ A saudade aperta e a vergonha afrouxa, enfermeira! A família é o esteio de um homem! Aquele que não tem família, não tem nada!
_ Quantos filhos o Sr tem?
_ Dois... O Francisco, de 9 anos, ele é autista. Esse piá é um pouquinho diferente dos outros... Ahh, e temos o nenê, que eu nem conheço ainda. Mas assim que eu sair pedalando daqui, vou...
_ Falando em sair... Acredito que o serviço social vai tentar encontrar uma casa de apoio para os senhor ficar durante alguns dias.
_ Casa de quê?
_ É uma casa situada nas proximidades do hospital, ou em alguma cidade pertinho daqui. Esse tipo de casa abriga pessoas em tratamento diário, aqui no hospital.
Juvenal soltou uma gargalhada.
_ Estão querendo se livrar de mim, é? Eu bem que desconfiava...
_ Não é isso, Sr Juvenal! Há pacientes na fila, à espera de leitos. Precisamos encontrar um lugar para o senhor ficar, proximo à Canoas. Assim, as consultas e sessões de fisioterapia ficarão mais acessíveis ao senhor, e outro paciente que está aguardando poderá ser atendido.
_ Tenho amigos na região metropolitana, que me salvaram no dia do acidente. Mas não sei se...
Claudio e Arnaldo ouviram as últimas palavras de Juvenal.
_ Falando de nós, Juvenal? A gente sentiu as orelhas quentes e resolvemos dar uma passada aqui!
_ A enfermeira estava me explicando o que é uma casa de apoio, vou precisar ir pra uma...
Claudio nem deixou Juvenal terminar a frase:
_ Pois já achou! Pra que acha que estamos aqui? O Dr já falou comigo.
_ Não quero dar despesas...
_ Eu moro em uma chácara a meia hora de carro daqui. A não ser que minha casa seja muito simples pra ti!
A enfermeira interveio:
_ Seria excelente para o Sr Juvenal se recuperar! As sessões de fisioterapia com a prótese, a princípio, serão diárias. Assim, facilita o tratamento e a adaptação.
_ Só posso agradecer a Deus por colocar esses dois homens no meu caminho, enfermeira!
_ Podemos contar com a ajuda do senhor para ceder um apoio para o paciente?
Claudio deu uma risadinha.
_ Sem dúvida. Até ele conseguir sair pedalando... Aí ele pode ir pra casa dele.
_ Vai ser rápido, rápido. Não quero dar trabalho... Assim que eu estiver acostumado com a prótese, ninguém vai segurar o velho Juvenal! Minha família ainda vai ter muita orgulho de mim! Não vou parar quieto não!

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