A morte de Valderez

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    Após o jantar compartilhado na casa de Claudio, todos se reuniram ao redor do fogão à lenha, para ouvir as melhores histórias. Teresinha ficou maravilhada.
    _ Que costume bonito, esse! Assim as histórias dos nossos antepassados não morrem!
    Claudio sorriu, brincando:
    _ Aqui só morre o mate e o pinhão que às vezes acompanha as histórias das noites de sábado!
    Ao terminar de falar, Claudio pousou a mão na região do estômago, fazendo uma careta de dor. Lenir percebeu:
    _ O que foi, paizinho?
    Claudio estava pálido.
    _ Nada, filha. Uma dorzinha aqui...
    A menina olhou nos olhos do pai e parecia saber o que se passara.
    _ Pai... É a úlcera que dói, né? Vem aqui, paizinho...
    Lenir puxou Claudio pela mão, ao interior do quarto das meninas. Claudio tentou disfarçar, mas a filha já conhecia as crises de dor do pai.
    _ Já vai passar, filha! Sempre passa logo... Eu não deveria ter tomado tanto mate e comido tanto pinhão.
    Tina, que notara a retirada de Claudio e Lenir da cozinha, deu por encerrada a sessão de histórias daquela noite. Teresinha olhou preocupada:
    _Precisa de ajuda?
    _ Creio que não. Essas dores do Claudio aparecem de vez em quando. Tá na hora dele fazer uns novos exames!
    _ Se precisar, me chama!
    Teresinha, Juvenal, Francisco e Miguel se retiraram. Arnaldo sugeriu:
    _ Se quiser, eu fico aqui também, e dou uma mão! O Miguel foi junto na casa do Juvenal, porque ele e Francisco combinaram de brincar com as meninas, amanhã.
    _ Não carece, Arnaldo! Essas dores dão e passam. Vou insistir pra ele fazer os exames de novo.
    Claudio saiu do quarto das filhas, apoiando-se no umbral da porta, com a mão na região dolorida.
    _ Tô bem, Arnaldo! Foi uma dor um pouco mais forte que as últimas que tive. Não te preocupa! Não vou morrer tão cedo!
    Arnaldo olhou para Claudio, sério:
    _ Com isso não se brinca, Claudio! Precisa fazer esses exames.
    _ Tenho uma endoscopia marcada pra quarta-feira. É um exame novo, que mostra como o estômago tá por dentro... Vamos ver o que tá me dando essa dor.
    _ Vou contigo. Na certa, pediram pra não ir sozinho.
    _Pode sim. Vou levar o Juvenal pra Canoas primeiro, pra terapia. Depois, numa clínica de Canoas mesmo, vamo ver o tamanho do bichinho que me atormenta!
    Quarta-feira, o alvorecer do dia recebeu a caminhonete de Claudio cruzando as cidades que separam Igrejinha de Canoas.
    _ Tá aí, Juvenal! Se tu estiver pronto na terapia, espera na recepção, que assim que eu terminar minha endoscopia, te busco lá!
    Claudio e Arnaldo dirigiram-se à clínica. Eles estavam apreensivos na sala de espera.
    _ Pelo que sei, tu não precisa entrar junto...
    A secretária interrompeu a conversa:
    _ Sr Claudio? Está em jejum?
    _ Sim.
    _ Pode se dirigir à sala 2.
    Após os preparos de praxe para realizar uma endoscopia, o médico iniciou o exame.
    _ Vamos ver esse estômago por dentro!
    Claudio permaneceu em silêncio. O Dr continuou:
    _ Mmm. Isso aqui não é nada bom... Tá vendo isso aqui?
    Além da parede estomacal avermelhada, o visor mostrava três pontos acentuados nas paredes do estômago de Claudio.
    Claudio, temeroso pelo aspecto de anormalidade de seu estômago, esperou a conclusão do médico.
    _ Essas partes avermelhadas são uma gastrite severa. Não há úlceras... Mas...
    _ Pode falar, Dr!
    _ As partes acentuadas são pólipos internos. Certamente são eles que causam a dor.
    _ Pólipos?
    _São três hérnias internas. Como elas são internas, o alimento que o senhor come fica trancado entre os pólipos, e aí surgem as dores.
    _ Tem como operar, Dr?
    _ Olha... Até agora, não sabemos de algum caso semelhante que tenha sido  solucionado com cirurgia. Se fossem hérnias externas, seria fácil operar... O senhor trabalha em quê?
    _ Sou agricultor, e faço revenda de erva mate.
    _ Pois eu sugiro que o senhor não deverá mais erguer peso. Arrume alguém pra te ajudar nas coisas pesadas. E eu vou receitar um remédio de uso contínuo que vai ajudar na sua digestão. Assim, não ficarão resíduos no estômago, entre os pólipos.
    _ Mas... Posso comer de tudo?
    _ Sugiro que evite comer alimentos muito pesados, fibrosos ou ácidos.
    _ Me diz, Dr... Posso tomar mate?
    _Por enquanto, sem chimarrão ou café preto... Faremos uma nova avaliação daqui a uns dois a três meses.
    Arnaldo, na recepção da clínica, não fazia ideia de que o amigo estava tão desolado.
    _ Então, meu guri? Como tá esse estômago?
    Claudio permaneceu cabisbaixo, sem coragem de falar naquele momento o que o médico lhe dissera.
    _ Vou ter que mudar alguns hábitos meus, meu irmão!
    Arnaldo estava curioso:
    _Mas... É tão grave assim? Quer conversar?
    _ Agora não, meu amigo. Vamos ver se o Juvenal tá pronto na terapia e vamos pra Igrejinha.
    Claudio permaneceu em silêncio todo o caminho de retorno. Ao aproximar-se de casa, baixou a velocidade, como se quisesse adiar o momento de dar a notícia para a família.
   

INFÂNCIA ROUBADAOnde histórias criam vida. Descubra agora