Juvenal é preso

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    Na manhã seguinte, após tomar conhecimento sobre a invasão de Irene na casa de Arnaldo, Juvenal sentiu que deveria tentar conversar com a mulher.
    _ Vou lá agora mesmo! Não tá certo uma pessoa ficar 10 anos fora e depois voltar e invadir a propriedade do seu Arnaldo desse jeito! Ademais, tenho que saber se os bichos do pobre homem estão sendo tratados!
    Teresinha mostrou-se preocupada.
    _ Olha... Eu vi o jeito que a mulher tava e não gostei! Ela é daquele tipo de gente que é capaz de qualquer coisa pra se dar bem. Tratou a mim e ao Chico como se a gente fosse lixo...
    _ Eu devo isso pro Arnaldo, Teresinha. Eu prometi cuidar da casa dele e dos bichos enquanto estivesse no hospital. Como vou explicar pra ele a presença dela lá?
    Teresinha franziu o cenho.
    _ Aquelazinha é até capaz de nem deixar o pobre homem entrar na própria casa...
    _ Vira essa boca pra lá, mulher! Essa senhora não pode ser tão ruim assim!
    _ Tu que não conhece ela, Juvenal! Ela é capaz de qualquer coisa pra se dar bem! Acho que ela tem pacto com o Dianho!
    _ Eu vou lá, Teresinha. Se eu não voltar em umas duas horas, pega o telefone e pede pro seu Arlindo ligar pra polícia e tu explica tudo pra eles. Eles têm o número.
    _ Ainda bem que agora o pessoal daqui tem uma extensão de ramal de telefone em casa... Tava na hora da gente ter como se comunicar com a cidade numa emergência.
    _Deixei as manas e o Chico encarregados de cuidar da rádio e da ONG. Depois que eu voltar, vou direto pra rádio.
    Juvenal calçou as botas,  pegou o chapéu e saiu na direção da casa de Arnaldo. Chegando lá, encontrou Irene sentada na varanda, tomando café. A mulher, ao ver a proximidade de Juvenal, já saiu soltando ofensas:
    _ Maís um crioulo invadindo minha casa? Tá se vendo que o Arnaldo tá mal de amigos! Ontem expulsei dois... E agora me aparece mais um!
    Juvenal tentou argumentar, em defesa da propriedade do amigo.
    _ Minha senhora... O seu Arnaldo é que é dono dessa casa e desse sítio... Pelo que eu tô sabendo, a senhora não deveria estar aqui.
    Irene reparou as limitações de Juvenal e saltou à frente dele, colerizada.
    _ Agora é um zarolho e perneta vai invadir a minha casa e me dizer que eu que não deveria estar aqui? Me poupe!
    Juvenal baixou os olhos tristemente. Aquela mulher não poderia destruir o seu amigo dessa maneira. Reuniu toda sua coragem e indagou:
    _ Onde tava a senhora quando o seu filho tava quase morrendo? Agora, depois de tanto tempo, acha que pode destruir o homem desse jeito? Não vou permitir...
    Irene pegou a xícara que estava sobre a mesa e arremessou-a na direção de Juvenal, que desvencilhou-se a tempo de evitar que ela o atingisse no rosto. Estilhaços de cerâmica ficaram espalhados pelo chão.
    _ Eu vou te mostrar o que tu vai ou não permitir, seu crioulo perneta e zarolho!
    E a mulher, enfurecida, começou a esmurrar a mesa e as louças que ali estavam. Desferia verdadeiros murros,  repetidas vezes, fazendo o pão, as geleias e frutas saírem pipocando até cair. Juvenal, ao ver que Irene já tinha as mãos ensanguentadas, provavelmente por acertar algum caco de cerâmica quebrada. Resolveu retirar-se.
    _  Vou até o galpão e cumprir com o meu prometido ao seu Arnaldo. Os bichos dele não têm culpa da senhora invadir aqui! Eles precisam comer...
    Juvenal retirou-se, em direção aos galpões. Irene  arremedou-o:
    _ "Eles precisam comer"!!! Quem precisa comer sou eu, que passei cinco anos no lixão! Eu vou vender toda essa bicharada, o trator e tudo que eu puder, pra ganhar uma grana preta, e viver bem... Eu não vou estragar as minhas unhas trabalhando, se eu tenho dinheiro...
    De repente, Irene deu-se conta do sangue em suas mãos. Olhou para o aparelho de telefone à sua frente.
    _ Ainda bem que o véio mandou instalar um ramal aqui! Tudo ao meu favor!
    Hesitou por um momento, pensativa. Em seguida, soltou uma gargalhada e pegou o telefone:
    _ Por favor, me liga pro número da polícia!
    Na central, o Sr Arlindo estranhou a voz feminina:
    _ Ué... O Arnaldo mora sozinho... Quem tá falando?
    _ Sou a mulher dele! Me liga logo com a polícia, que tem um homem invadindo a minha casa aqui! Rápido!
    Arlindo, o dono do armazém e responsável pela central de telefonia da localidade de Serra Grande, apesar de estranhar, realizou a ligação.
    _ É só aguardar! Logo eles atendem a senhora.
    Juvenal, após triturar o pasto e alimentar os animais de Arnaldo, ficou paralisado ao ver a viatura da polícia à sua frente.
    _ Mãos onde eu possa ver! O senhor está preso!
    Juvenal sabia que não poderia oferecer resistência às autoridades. Porém, tentou argumentar.
    _ O dono do sítio me pediu pra tratar os animais dele, policial!
    _ Recebemos uma denuncia por invasão e lesão corporal à dona do sítio. Aconselho o senhor não reagir, que será pior!
    Juvenal notou que os agentes estavam a ponto de usar de violência, portanto acompanhou-os até a delegacia. Lá ainda tentou justificar sua presença no sítio de Arnaldo:
    _ Foi a pedido do próprio Arnaldo que eu tava ali, seu delegado.
    _ Não foi o que a esposa dele me falou... Ela mostrou aos agentes as lesões nas mãos que o senhor provocou nela quando a atacou! Por enquanto, o senhor está detido até segunda ordem!
    Irene sentiu-se vitoriosa ao ver a saída da viatura.
    _ Tá pra nascer o crioulo que me tira da minha própria casa!
    Após uma sonora gargalhada...
    _ Agora vou comemorar! Vou dar um pulo na minha amiga Edelvina... Tô curiosa pra saber das fofocas da Serra Grande. Ela sempre tá por dentro de tudo! Assim, já faço uma propaganda pra ela espalhar pra localidade inteira que tô vendendo o trator, as vacas e os porcos. Eu não vou plantar pra tratar os bichos do véio, não... Nunquinha!!!
    Na casa de Juvenal, Teresinha olhava sem parar o velho relógio da sala.
    _ Tô preocupada com teu pai, Chico! Ele falou que em duas horas estaria de volta... E já se passaram quatro horas... Será que...
    _ A senhora quer que eu vá lá dar uma olhada?
    _ Mas nem pense nisso, Chico! Vi o jeito que aquelazinha te olhou ontem... Ela é capaz de qualquer coisa... Vamos ligar pra polícia!
    Teresinha, ao ser atendida pelo policial, ficou pasma.
    _ Sim, senhora... O homem em questão que a senhora procura se encontra detido aqui! Ele foi preso por invasão de propriedade particular e por lesão corporal.
    _ Mas como? Ele foi tratar os animais do senhor Arnaldo! Como foi que ele foi parar na cadeia?
    _ A esposa do Sr Arnaldo denunciou ele por invadir a propriedade e bater nela!
    _ Não é possível! O Juvenal jamais tocaria de maneira violenta em alguém... Ele não é capaz de fazer mal a uma mosca!
    _ Pois eu acho que a senhora está enganada. Ele invadiu a residência do senhor Arnaldo e bateu na esposa dele.  Vamos manter ele detido até segunda ordem!
   

   

INFÂNCIA ROUBADAOnde histórias criam vida. Descubra agora