15º Capítulo - "Maiara"

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"Maiara"

Ele estava bem na minha frente e eu não podia acreditar. Não dava. O fato de estar tão diferente da última vez que o vi me deixava tão perturbada que foi inevitável dar uma de imbecil: fiquei parada o encarando enquanto sentia meu rosto ferver de vergonha.

Eu devia ter me vestido melhor. E me maquiado melhor. E emagrecido. Mas não... Lá estava eu, usando calça jeans escuras, que me incomodavam na cintura porque minha barriga tinha ganhado vida própria depois que comi uns sete canapés, e uma blusa que me deixava parecendo um balão de gás.

Gorda, gorda, gorda.
Ridícula até dizer basta.
Vai pra academia, Maiara!
É o melhor que você faz. Aliás, tudo era melhor do que encarar aqueles lindos olhos verdes, sabendo que jamais – nunquinha mesmo – seria dona deles. Eles tinham muitas, muitas donas. Cada uma pagava uma quantia grotesca por aqueles olhos, acho que meu salário podia tê-los por umas duas ou três horas.
Deprimente.

Senti toda aquela depressão invadir o meu corpo quando Danilo sugeriu que eu lhe mostrasse as fotografias da inauguração.

Dava pra ser menos sutil, por favor?
A vergonha que senti só não foi maior do que minha vontade de matar o Danilo bem devagarzinho, observando seu sangue escorrer como pingos de chuva em janela de vidro.

Quando me vi sozinha, sem nem um apoio moral – todas as garotas sumiram no meio da multidão -, achei que minha vida poderia ter um basta ali mesmo. Seria um ótimo momento, o ideal. Mas, como nada para mim nunca dá certo, fiquei apenas encarando o Kaio como se ele fosse o Matt Bomer ou sei lá, o Henry Cavill. Qualquer cara muito gostoso, tesudo e que incitasse nas mulheres uma vontade de dar até a morte.

Ele sorriu. E foi como se o sol sorrisse para mim, visto que o Kaio era, basicamente, dourado. Sua pele muito bronzeada estava do mesmo jeito de que me lembrava, combinando com os cabelos castanho-claros – tristemente maiores e melhores do que o meu, mas já me vinguei quando os puxei com vontade na despedida da Maraisa – e os olhos verde-mel. Naquele instante, estavam verdes. Bem verdinhos.

Podia ver o comecinho da tatuagem que tinha nas costas – e que eu conhecia muito bem – aparecer em seu pescoço grosso, másculo.
Kaio estava vestido socialmente; uma camisa azul-clara dobrada na altura do seu cotovelo – eita, dava para ver mais resquícios de tattoo ali –, calça social e sapatos sociais pretos.
Dei mesmo uma olhada geral no sujeito, e daí? Me prendam por isso.

– É bom te ver, Maiara... – ele murmurou, parecendo meio constrangido.

Ainda bem que era só meio, porque já bastava eu estar totalmente.

– É... B-bom te v-ver ta... também – gaguejei idiotamente.

Feia, gorda e tapada.
Combinação perfeita para espantar qualquer homem com um pinguinho de amor-próprio. Por isso que não havia ligado para ele.
Ficar gaguejando ao telefone?
Fala sério, eu ainda não tinha perdido totalmente a noção do ridículo.

O que a minha gloriosa pessoa ainda estava fazendo ali?
Devia ter saído correndo, mas minhas pernas nem se moveram quando tentei.

Uma lembrança fez meu corpo esquentar ainda mais: as palavras do Danilo no dia da nossa tomada de fotografias. Ele havia me dito que o Kaio tinha gostado de mim. Uma coisa inimaginável, rara e até sem sentido, visto que minhas amigas eram pelo menos uns quinze quilos mais magras do que eu. Eu disse pelo menos. Isso me deixa em óbvia desvantagem, pois o mundo atual é delas. Não me resta nada além de me conformar e me matricular em uma academia nova a cada mês, tentar gostar de puxar peso e aguentar a monotonia que é ficar correndo sem sair do lugar em cima de uma esteira.

The Trip  "Danisa"Onde histórias criam vida. Descubra agora