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Estamos sentados na sala de embarque enquanto espero impaciente pelo meu avião, que está alguns minutos atrasados conforme a voz robótica que anunciou há algum tempo, aproveito para colocar todas as informações que recebi nos últimos minutos em dia, organizar meus pensamentos. 

O que me faz lembrar, filho, de alguma maneira esse assunto chamou minha atenção e ficou parado em algum canto em minha mente esperando o momento pior para vir a tona, por exemplo, agora. 

Calvin disse que não poderia ter filhos, mas o que ele realmente quis dizer com isso? Ele é operado? Não pode por problemas de saúde? Até porque ele teve o Yan quando mais novo, o que o impediria de ter filhos agora? 

E por que isso me incomoda tanto?

— Posso te fazer uma pergunta? — falo enquanto brinco com os dedos de uma das suas mãos em meu colo, viro o rosto para ele que está com a cabeça apoiada na outra mão do outro lado, seus olhos sobem dos nossos dedos para mim e apenas acena um sim com a cabeça — você disse que não pode ter filhos, como sabe que não era a Martha o problema? 

Calvin não parece se incomodar com a minha pergunta, ele apenas suspira mas continua me encarando, uma pequena ruga se forma entre seus olhos e sua boca se aperta por alguns segundos parecendo pensar até que finalmente fala.

— Realizei alguns exames, não me recordo se ela fez algum, mas no meu caso, é muito difícil — comenta me encarando e entrelaça os dedos aos meu trazendo minha mão para o seu colo, acariciando a mesma com o polegar, um breve sorriso aparece e levanta a cabeça da mão virando o corpo para mim — está preocupa em engravidar de mim? — sua voz sai baixinho mas o sorriso safado continua ali, faz meu corpo tremer e preciso apertar as pernas, cruzando as mesmas em um movimento lento para controlar a sensação de queimação ali, entre elas.

— Na verdade não — falo calmamente tentando não mostrar o quanto ele consegue me atingir, penso um pouco sobre o assunto, eu acho que não teria medo disso, lógico que seria uma tremenda bagunça, mas não tenho medo de uma gravidez, não agora, me sinto tão seguro de mim mesma que uma gravidez não seria tão ruim assim — eu só me interessei pelo assunto, afinal, você tem o Yan — esclareço dando de ombros e fitando ele que apenas me observa.

— Yan foi um descuido — brinca rindo baixinho, leva minha mão aos lábios em seguida e beija o nó dos meus dedos com cuidado, sorrio com o gesto e posso notar algumas pessoas ao nosso lado nos encarando e até alguns comentários maldosos, tento ignorar até alguém soltar "ele é velho para ela" que faz meu estomago embrulhar — você quer ter filhos? — Calvin questiona totalmente alheio aos comentários chatos e inconvenientes. 

— É uma conversa muito estranha para se ter agora — resmungo desviando os olhos dele para as senhoras sentadas a alguns passos de nós, encarando elas que ficam totalmente sem jeito e desviam os olhos depressa e eu volto a olhar para ele que tem os olhos também nelas, um olhar fechado, as sobrancelhas juntas formando um pequena ruga entre os olhos. 

Talvez Calvin não esteja assim tão inerte a esses comentários e olhares desagradáveis, mas ao contrário de mim só optou por ignorar. 

— Mas é uma conversa necessária, se vamos começar isso — diz voltando a me encarar, mas seu olhar não parece se suavizar, novamente um comentário que mal posso ouvir direito e seus olhos voltam para elas, ele vai estourar, eu sei que vai.

— Isso? — pergunto levanto a mão livre para o seu rosto e virando para mim, ele sorri assim que seus olhos encontram os meus e acaricio a sua barba com a ponta dos dedos — quer dizer nós dois?

— Sim, nós dois — seus dedos se apertam mais aos meus e suas palavras fazem meu peito se encher, puxo a respiração sem conseguir segurar o sorriso e o coração que dispara no peito fazendo meu estomago se embrulhar.

— Existe um nós então — brinco fazendo uma careta, tirando com a sua cara a fim de mudar de assunto mas Calvin bufa e revira os olhos.

— Não muda de assunto Vitoria, é importante — chama minha atenção apertando os dedos aos meus e eu paro de sorrir respirando fundo.

Tiro a mão do seu rosto e passo pelo meu tentando pela primeira vez pensar nisso com mais amor, ou realmente dar uma atenção maior, eu nunca parei para pensar nesse tipo de coisa, é estranho, diferente. Mas assim, do nada, não sei exatamente o que responder a ele. 

— Eu nunca parei para pensar nisso — digo com sinceridade dando de ombros e desviando os olhos dele para nossas mãos entrelaçadas — quer dizer, eu sempre quis uma família, e acho que isso automaticamente em minha cabeça sugere filhos — continuo, dessa vez a voz saindo mais baixa, isso me lembra o Yan, todas às vezes que imaginei uma família, ele estava lá, mas pela primeira vez em minha mente não é ele que está ao meu lado, é Calvin — mas há muitas maneiras de ser uma família mesmo sem crianças — concluo voltando a olhar para ele me lembrando do que me disse sobre ter filhos.

— Você é mais madura do que eu imagine — fala sorrindo e leva de novo minha mão em seus lábios plantando um beijo na palma e novamente aquela sensação de queimação e o arrepio percorre pela minha pele.

Antes que eu possa responder alguma coisa a voz alta soa, chamando meu voo que está prestes a decolar, engulo em seco e de repente tudo ficou pior, meu peito se aperta e meus olhos procuram os dele com urgência, mas Calvin apenas sorri, não é o mesmo que eu gosto, mas ainda é um sorriso, mesmo que breve.

— Fique, me deixe continuar cuidando de você — diz enquanto me levanto assim como todos em nossa volta, que começam a recolher as suas coisas e ir para o portão de embarque. 

Eu não posso negar de novo, é difícil, a cada não para ele é como uma facada em mim, seus olhos ficando tristes, a decepção em sua face... ele precisa entender que não é um não para nós, eu só preciso ir e resolver tudo sozinha primeiro para poder ser feliz com ele.

Sem pensar em muita coisa, dou um passo em sua direção soltando sua mão e levando a mesma até o seu rosto e o beijo, encostando os lábios aos seus que me recebem de bom grado, fecho meus olhos e aproveito essa sensação, aproveito o seu gosto, até o beijo ser parado aos poucos com doces e leves selinhos. 

— Você me beijou em público, estamos sendo julgados — sussurra se afastando devagar apenas para poder me ver melhor, eu sorrio olhando em sua boca e depois subo o olhar para ele.

— Eu não me importo, só quero me lembrar disso — falo e o beijo novamente e dessa vez ele passa os braços ao meu redor e me aperta em si. 

É um beijo de despedida, mas não é uma despedida da gente, nós vamos continuar, eu tenho certeza disso, é apenas um te vejo em breve e eu espero que esse breve realmente seja breve, só de imaginar já estou morrendo de saudades de Calvin Carson. 

DOCE TRAIÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora