DÁRIO MARTINELLI
Quando fiquei na frente de Alana para ela se esbarrar em mim, não imaginava que iria ter o desejo de levá-la para casa, para descobrir mais sobre ela. Não imaginava que iria me encantar ao ouvi-la sorrir, ou que iria conseguir enxergar seus desejos e medos; ela é tão transparente. Chego na casa dos meus pais às dez e meia. Eu aluguei meu apartamento em Albuquerque para um conhecido de Caetano; não usava, e achei besteira deixá-lo vazio. Penso que a última vez que fiz sexo foi no domingo; preciso encontrar alguma diversão. Mas vou deixar para amanhã. Hoje só quero buscar um certo anjo de olhos tristes.
Assim que deu meia-noite, eu já estava estacionando em uma das vagas do restaurante e espero por Alana. Ela demorou vinte minutos para sair; Alana não me vê estacionado, e eu a observo parecendo preocupada olhando o celular. Ela está usando uma calça jeans e um moletom largo. Está com os cabelos soltos, o olhar triste, e então eu aperto a buzina do carro, ela leva um susto e quase derruba o celular. Eu sorrio e desço da picape, e então me aproximo dela. Ela não sorri, e isso me deixa preocupado.
— Tudo bem, Alana? — analiso seu rosto; seus olhos estão tão transparentes, e eu vejo tristeza e dor neles.
— Ei, o que foi? — pergunto preocupado.
— Nada, Dario, só não estou em um bom dia. — ela quer passar, mas eu não permito.
— Calma, respira. — só assim ela fica no lugar e parece desacelerar um pouco e me olha nos olhos.
— Melhorou? — indago.
— Sim, obrigada.
— Ótimo, achei que teria que lançar uma das minhas cantadas para te fazer se sentir melhor. — ela me olha de uma forma estranha.
— Você faz mesmo isso? — pergunta, parecendo perplexa; eu tenho vontade de rir.
— Oh, eu faço sim. — respondo só para vê-la sorrir. E consigo.
— Então me conte uma; quero ver se são boas mesmo. — Agora fodeu. Eu busco dos meus pensamentos alguma piada patética para parecer que sou mesmo um cara de cantadas.
— Se beleza desse cadeia, você pegaria prisão perpétua. — ela me olha incrédula e depois começa a gargalhar, de se dobrar de rir. E eu acabo rindo também; ouvi isso em algum lugar e achei que daria certo. E deu, ela sorriu.
— Meu pai eterno... Dario, você é muito ruim... — eu espero ela se recuperar e então olho para seu rosto, e vejo uma mecha de cabelo perto dos seus olhos; eu retiro eles e coloco atrás de sua orelha, não antes de tocar no cachinho e puxá-lo devagar. Alana solta um suspiro, e eu sorrio de lado. Mas logo me recomponho.
— Pelo menos cumpri minha missão de fazê-la sorrir. — ela me presenteia com um sorriso verdadeiro.
— Meu dia hoje foi uma merda desde a hora em que me levantei até agora. — Alana não é só transparente com os olhos; ela também não parece ter filtros, e eu estou gostando disso.
— Sabe quando acordamos com o pé esquerdo? — eu confirmo com a cabeça.
— Sei exatamente como é.
— Então, foi isso que aconteceu, e olha que eu tentei voltar para cama e deitar novamente para ver se mudava alguma coisa. — eu olho para ela, tentando ver se ela estava brincando; nenhum sorriso.
— Você fez mesmo isso? — perguntei um tanto abismado.
— Claro que sim. Pena que não funcionou. — eu balanço a cabeça e tento não sorrir.
— O que é? Eu acredito em algumas superstições. — ela conta, e eu a encaro novamente; cada vez que conheço Alana, eu descubro uma nova faceta, uma nuance diferente, e eu gosto do que eu vejo.
— Quais tipos de superstições, Alana? — Pergunto me encostando na frente da RAM. Ela pensa por alguns instantes.
— Passar por baixo de uma escada dá azar. — ela faz uma carinha tão engraçada e bate o dedinho no rosto.
— Ah, e não pode deixar o chinelo virado para baixo, senão a mãe morre. — ela fala como uma criança, e eu acabo rindo.
— O que mais? — ela parece puxar uma do fundo da memória, até mesmo pisca os olhinhos; eu não paro de ficar observando seu rosto, olhando cada cara e boca que ela faz para se lembrar de alguma outra superstição.
— Eu vou te contar uma que eu sempre fiz quando era criança, mas não quero que você ria de mim. — Eu já quero rir antes mesmo dela me contar.
— Certo, prometo. — Ela olha dentro dos meus olhos, primeiro se demorando me encarando de uma forma estranha, e então ela resolve falar, tentando segurar o riso.
— Eu pegava uma vassoura e colocava atrás da porta quando eu queria que uma visita fosse embora. — eu seguro o riso e tento não encará-la, ou eu não iria conseguir.
— E dava certo? — ela gargalha, e quando se recupera, ela responde.
— Claro que sim, todas as vezes. — eu já ia acreditando quando ela completa:
— É que as visitas viam eu colocando a vassoura atrás da porta. — eu acabo gargalhando alto.
— Alana, você não fez isso. — ela ri junto comigo e balança a cabeça confirmando.
— Oh, se eu não fiz em. — eu balanço a cabeça inconformado.
— O que sua mãe fazia com você? — pergunto, querendo saber o final da história.
— Uma vez ela me bateu; outra, ela me colocou de castigo, e então eu parei de colocar a vassoura nas vistas das pessoas, mas colocava na porta dos fundos. — ela dá de ombros.
— Você era uma coisinha indecente, hein? — comento, e ela balança a cabeça sorrindo.
— Sempre fui meio maluquinha. — e então ela olha o celular.
— Nossa, Dario. Você me distraiu, e vou perder meu ônibus. — já vai saindo quando eu seguro sua mão. Sua pele na minha parece provocar uma sensação de choque; tenho vontade de me afastar; sempre que estou com Alana, me sinto diferente, e isso não é bom para mim, mas é inevitável.
— Eu vim até aqui levá-la para casa. — Alana me olha com curiosidade e certa desconfiança.
— Por que? — sua pergunta é direta.
— Por que sim. Por que não? Eu tenho um carro, estava de bobeira em Albuquerque. — minto, dando de ombros.
— Então você estava por aqui e resolveu passar aqui para me ver? — ela pergunta, parecendo impressionada.
— Sim.
— Euzinha? — eu seguro um sorriso.
— Isso... — Alana parece duvidar por alguns instantes. E depois ela desfaz o sorriso e fica séria. E então ela me encara novamente.
— Você está participando de alguma aposta? — Agora sou eu que não entendo a pergunta dela.
— Como assim?
— Eu sou uma moça negra, pobre, comum. Não duvidaria nada que um homem rico e bonito como você, que tem a mulher que desejar a hora que quiser, esteja participando de alguma aposta para fazer a tapada aqui suspirar por você. — se ela soubesse que a única mulher que eu realmente quis não me correspondeu. Que depois disso eu jurei não deixar ninguém se aproximar, que eu só desejo sexo sem compromisso, mas não digo nada disso.
— Eu não sou desses idiotas que fazem apostas, Alana. Eu sou um homem de verdade. E não estou aqui para fazê-la suspirar. E sim para ajudá-la. — resolvo abrir o jogo.
— Eu não gosto da ideia de você passar tarde da noite por aquele terreno baldio sozinha, e se eu posso de alguma forma não deixá-la fazer todo aquele caminho, por que não? — ela fica sem palavras. E abaixa o rosto.
— Me desculpa, Dario. É que ninguém quase nunca me ajuda. Eu sempre tenho que enfrentar tudo sozinha; quando alguém me oferece ajuda, é de estranhar, sabe. Mas eu agradeço muito. E não vou rejeitar a carona. — ela sorri de forma contida, e eu fico satisfeito por ela permitir que eu venha buscá-la às vezes.
— Vamos? — ela confirma com a cabeça, e seguimos para a porta do passageiro. Eu abro a porta, e o estribo elétrico aparece; eu percebo que ela sempre fica surpresa com o movimento. Eu sorrio e estendo a mão para ela, que pega e se firma para subir na picape. Quando ela se acomoda, eu fecho a porta e dou a volta para o banco de motorista e começo a dirigir. Quando eu disse a ela que colecionava picapes, caminhonetes e caminhões, não estava mentindo; é uma paixão que tenho desde criança, quando eu via meu pai dirigindo pela fazenda, e eu pedia para ficar na caçamba e achava aquilo tudo uma aventura. Eu sempre dizia que seria como ele, que ficaria na lavoura no meio do cafezal sentindo a terra, os grãos. Sempre fui o mais chegado ao contato com a natureza; Paolo nunca gostou, nem mesmo de tomar sol. Já Corrado trabalhou algum tempo com os capazes, assim como eu, mas sendo o primogênito, teve que assumir o legado do meu pai. Eu poderia ter me tornado um engravatado, mas prefiro ficar onde estou. Me sentindo em casa, onde eu faço o que eu gosto sem ter que cumprir horários em um escritório pequeno e com várias pessoas me sufocando. Gosto da minha liberdade, e ganho tão bem quanto qualquer um dos dois; tenho meus investimentos por fora, e estou de boa quanto a isso. Saio dos meus pensamentos quando Alana começa a falar.
— O que você veio fazer aqui? Já que você mora no Vale do Café.
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uma farsa com o milionário
Romance○ Slow Burn ○ Friend To Love ○ Fake Date ○ Mocinho Protetor ○ Mocinho quebrado Dario Martinelli, aos 28 anos, é um homem de negócios bem-sucedido que acreditava ter toda sua vida planejada milimetricamente. Metódico, imaginava ter tudo sob controle...