DARIO MARTINELLI
Acordo cedo e observo Alana dormir por um tempo. Às vezes, tento ser indiferente a Alana, afastar-me dela por ser o certo a se fazer. Penso em alertá-la de que é apenas uma coisa física, que não possuo um coração para amar alguém. Mas é só observar sua luta, garra e força que me desarmo. Como erguer muros e afastar alguém tão pura e inocente como ela? Alguém que não me pede nada em troca, a não ser eu e meu tempo. Às vezes, fico pensando até onde vamos com isso, quem sairá mais ferido no final? Eu ou ela? Ou ambos sairemos ainda mais despedaçados? Pensar no filho da mãe que tirou a virgindade de Alana com tanta brutalidade me deixa furioso e à beira da loucura, com desejo de caçá-lo e fazer com que ele pague pela dor que causou. Não entendo o porquê, mas isso ainda não explica sua hesitação quanto ao toque e aproximação de um homem, algo a mais nessa história. Eu deixo um beijo em seus cabelos e saio do quarto dela para o banheiro, lavo meu rosto, saio do banheiro e vejo dona Sônia na cozinha.
— Bom dia, dona Sônia. — a cumprimento.
— Bom dia, Dario. Estou passando um cafezinho; já já estará pronto. — diz animada.
— Vou à padaria comprar os pães e já volto. — digo a ela, saindo para fora da casa delas. Se alguém me perguntasse se eu faria todas essas coisas que faço por Alana para alguém, chamaria a pessoa de maluca. Nunca peguei um ônibus, nunca precisei dormir encolhido em uma cama minúscula ou usar um banheiro onde o espaço mal me cabe. São coisas pequenas que nunca fiz que não me incomodam como pensei que fariam. Eu me adaptei por Alana, e não entendo como isso aconteceu. Depois de comprar alguns pães de queijo e pães de sal, manteiga, mortadela que descobri que Alana gosta, voltei para casa dela e a encontrei na cozinha ajudando a mãe dela a preparar a mesa para o café. Quando me vê, ela sorri radiante, nem parecendo que ontem se quebrou em vários pedaços por duas vezes. Ela se recupera tão rápido que é admirável.
— Bom dia, Dario. — Alana vem ao meu encontro, eu enlaço sua cintura e deixo um beijo leve em seus lábios.
— Bom dia, Alana, dormiu bem?
— Sim. Muito bem. — responde, e eu ergo minha sobrancelha.
— Duvido. — ela mostra a língua para mim, pela primeira vez, e seu atrevimento me deixa aturdido.
— Pois dormi maravilhosamente bem. — continua a mentir.
— Vou deixar você dormir na sua maravilhosa cama sozinha, Alana. — desafio ela, que faz um biquinho enorme, e sorrio torto por ter ganho a discussão.
— Vamos tomar o café logo. — diz chateada, e eu prendo o riso. Logo que sentamos à mesa da cozinha de seis cadeiras, aparece Vivian e, por incrível que pareça, sem Cláudio.
— O que houve que Cláudio foi embora de madrugada, Vivian? — indagou Sonia. Vivian olha para Alana, e parece que se entenderam.
— Ele precisou viajar para participar de uma reunião com o pai dele. — dá de ombros.
— Ah, entendi. — diz Sônia desconfiada. Eu tomo um pouco do café e me surpreendo com o sabor; dona Sônia e Alana sorriem.
— Como está o sabor do café, Dario? — pergunta Alana com o ar de diversão.
— Me digam vocês, o café Martinelli é o melhor, não é? — sondo, e ela confirma.
— Não posso negar que possui um diferencial. — elogia Sônia ao provar o café.
— Eu, como Q-Grader, já degustei diversos tipos de café, e posso afirmar que não existe café melhor que os dos Martinelli, não por ser nossa marca, longe disso, mas é o processo de qualidade que investimos para garantir os padrões consistentes. — explico ao bebericar mais um pouco o café. Nós, Q-Graders, somos treinados para identificar todo o processo feito até ele estar em nossa xícara.
— Uau, está me dizendo que eu comprei o melhor café do mundo?
— O melhor do mundo seria um pouco exagerado, mas um dos melhores do nosso país, sim. A maioria dos lotes do nosso café passa pela minha avaliação; eu e mais um outro Q-Grader de BH classificamos a qualidade do café. — explico orgulhoso.
— Esse café que está tomando, sabe qual a qualidade? — pergunta dona Sônia, parecendo duvidar do meu trabalho; sorrio de lado.
— É um lote do café arábica, considerado de alta qualidade. Os sabores dele são complexos, aroma refinado e a acidez mais suave. Na nossa fazenda tem café de origem única, os de especialidade, entre outros. — elas me olham como se eu fosse um extraterrestre, e eu fico envergonhado.
— Você consegue enxergar tudo isso provando café? — indaga Alana de boca aberta.
— Existem várias etapas, mas resumidamente é isso: avaliamos o aroma, com o café moído antes do preparo, depois a fragrância molhada, e aí passa por outras etapas até chegar à degustação para identificar o sabor e aroma, e até mesmo avaliamos o corpo, que seria a sensação do café na boca, como também a finalização, que é o sabor que persiste após engolir. — Alana toma o café dela e sorri alto.
— Eu não tenho paladar para isso. Como vocês sabem disso tudo só por provar um café?
— Nem eu mesma serviria para isso, e olha que pensava ter os sentidos apurados. — revela Vivian pela primeira vez de uma forma relaxada, sem a pose de fedelha.
— Eu não imaginava que era assim que funcionava a classificação de qualidade do café. — comenta Sônia impressionada. Claro que não são só essas etapas; existem várias outras técnicas que usamos para avaliar detalhadamente o café.
— Para me tornar um Q-Grader, eu ralei muito, são várias etapas; fiquei vários meses em BH e em outros estados, procurando aprimorar minhas habilidades para estar apto a exercer e atender os requisitos da nossa fazenda. Por isso, passei por um treinamento sensorial intensivo para desenvolver essas habilidades para melhor avaliação. — adoro falar de café, pois é uma paixão minha, a única que permito ter; sei que não vão me tirá-la. O conhecimento que possuo ficará comigo para sempre, e sem falar na grana que me rende a mais, pois tenho certificado. Falamos mais um pouco sobre café, e Sônia até passou café de uma concorrente nossa e me fizeram experimentar e avaliar; foi uma brincadeira saudável onde todos rimos muito. Logo após, eu e Alana saímos para comprar a tal cama que me custou muito para convencê-la, à base de algumas discussões e insistência da minha parte. Compramos uma cama box, um bom colchão, mas sem cabeceira, pois ela disse que não iria caber. Retiramos a caminha dela e colocamos no quarto de Vivian, e então a cama nova foi colocada no lugar.
— Nossa... esse colchão é maravilhoso! — expressa Alana ao pular em cima da cama como uma criança, e eu meneio a cabeça, tentando não rir de sua atitude infantil.
— O que é? Nunca ganhou uma cama, não é? — pergunta me desafiando e jogando o travesseiro em minha cara; eu o pego. Comprei dois travesseiros; queria dar uma TV de 50 polegadas a ela, mas a encrenqueira faltou pouco me agredir na loja. Então, resolvi dar cinco mil reais à dona Sônia, escondido, para comprar lençóis e o que mais precisarem, já que Alana não queria aceitar mais nenhum real meu; foi o que me disse, muito marrenta. Isso me faz sorrir ao lembrar, mas logo volto minha atenção para a mulher passando as mãos pelo colchão com um sorriso enorme no rosto bonito.
— Eu nunca fiz questão dessas coisas e me surpreendo com sua alegria. — explico.
— Claro, você nasceu em berço de ouro. Eu tive aquela caminha com aquele mini colchão por uma vida toda. Isso aqui para mim é estar no céu. — fala ao se afundar no colchão, fechando os olhos, e eu me pego sorrindo ao contemplar a felicidade dela.
— Igualzinha uma criança! — repreende Sônia ao ver Alana rolando na cama.
— Ah, mãezinha, até a senhora? — pergunta Alana um tanto contrariada. Meu celular toca, e eu me distancio para poder atender. Então, percebo a presença de Jorge; ele não vai com a minha cara, e nem eu vou com a dele. O olhar que ele direciona a Alana, quando pensa que não está sendo observado, me faz ter desejos assassinos. Passo por ele fingindo que não o vejo, e ele me segue.
— Você me deve respeito, rapaz. — vem com o falso moralismo para cima de mim. Eu continuo andando para que ele venha atrás de mim. Não quero que Sônia ou Alana ouçam o que será falado aqui.
— Essa casa é minha, Dario, e se eu não quiser, você não pisa mais aqui dentro. — vocifera, e então o fito de cima a baixo, mostrando todo meu descontentamento por ele.
— Eu respeito muito dona Sônia, Jorge. Mas existe algo em você que me faz repudiá-lo, e torça muito para ser apenas uma cisma minha. — eu chego mais perto dele e olho em seus olhos.
— Pois se pelo menos eu desconfiar de algo, vou até no inferno atrás de você. — ele aperta o punho das mãos, e eu espero que ele me agrida, que eu tenha algo para descarregar o meu desejo de encher a cara dele de soco até vê-lo desfalecido. Ele não dá sequer um passo, e eu sorrio de escárnio, passando a mão pela minha barba, medindo ele.
— Não tem coragem, não é? — me aproximo dele sorrindo de escárnio e sentencio.
— Cuidado, Jorge, pois eu não tenho medo de ninguém, menos ainda de você. E se for esperto, ficará longe da minha mulher. — aviso e me afasto dele. Torço para que ele saiba que desconfio de algo, e espero que minha ameaça o mantenha longe de Alana. Farei o que for preciso para mantê-la a salvo. Meu celular toca novamente, e eu atendo sem verificar quem era.
— Alô.
— Oi, Dario, bom dia. — Engulo em seco.
— Bom dia, Eloá. Aconteceu algo? — Raramente ela me liga.
— Não. Só queria saber se Alana irá à reunião de hoje à noite.
— Sim, ela vai. — Respondo sucinto.
— Ah, que maravilha! Eu e Elena adoramos Alana. Ela combina com você, Dario. É gentil, comunicativa, alegre, te faz sorrir, e a leveza dela encanta a todos, assim como... — ela começa a enumerar as qualidades de Alana, e queria mandá-la parar com aquele blábláblá todo. Às vezes, penso que Eloá me liga para testar minha paciência. Sabe quando você não quer falar com a pessoa, não quer vê-la, não quer ter que estar no mesmo lugar? É isso. Não sei se já passou do sentimento genuíno para algo deturpado, ou sou eu querendo colocar limite à minha dor. Me perco nessas divagações que não a ouço falar.
— Vou deixar você cuidar da sua namorada. Te vejo mais tarde, Dario.
— Tchau, Eloá. — desligo e passo as mãos pelos meus cabelos. Abro a porta da caçamba da minha picape, me sento e encaro a paisagem à minha frente: várias árvores ao longe, alguns terrenos vazios precisando ser capinados, cercas de arame em volta, galinhas com pintinhos andando livremente pela estrada de chão com poças de lama, casinhas humildes com algumas telhas quebradas, varais feitos de arame farpado usados para estender roupas, algumas crianças correndo atrás de uma bola que já teve dias melhores. Tudo tão diferente da minha realidade, mas é o que me chama a atenção, para como a vida é. Alguns com muito dinheiro, poder, regalias e luxo, outros com nada além de suas casinhas humildes e o olhar cansado. A desigualdade é gritante, onde uma pessoa pode ficar tão feliz por ter uma cama melhor? Algo que nem fez cócegas em meu bolso, mas que faz toda a diferença para ela.
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uma farsa com o milionário
Romance○ Slow Burn ○ Friend To Love ○ Fake Date ○ Mocinho Protetor ○ Mocinho quebrado Dario Martinelli, aos 28 anos, é um homem de negócios bem-sucedido que acreditava ter toda sua vida planejada milimetricamente. Metódico, imaginava ter tudo sob controle...