ALANA REISOs dias ao lado de Dario vão de zero a cem muito rápido. Já observei que essas mudanças ocorrem sempre que ele está em família, há um clima pesado e estranho, abafado. Chega sufoca, como se tivesse algo entre linhas que não consigo desvendar. A família parece estar sempre em alerta, todos olhando para Dario e Corrado. Eu não entendo e isso me deixa aflita. Achei que ele iria gostar de ser chamado para tal surpresa que Eloá está planejando para toda a família, onde apenas Ana, Elena e Paolo sabem. Elas não disseram o que era, mas que iria trazer muita alegria à família. Eu fico encolhida em um canto observando a interação entre Eloá e Dario. Como ele está com o corpo rígido, o maxilar cerrado, expressão sóbria no rosto, centrado, mas os olhos dele são perdidos, o olhar quase oco e, ao mesmo tempo, revolto. A cor que antes era azul piscina escureceu para um azul mar. Um mar tempestuoso e turbulento. Ele me encara, parecendo agora perceber minha presença. Ele parece sair do transe em que se encontrava, caminhando até onde estou com passadas seguras e decididas, corpo reto, mãos nos bolsos da calça, e então ele para ao meu lado, e ficamos em silêncio. Penso na mulher que foi tão vulgar ao chamá-lo para transar tão explicitamente, o que me deixou envergonhada, constrangida e magoada. Como era de se esperar, a mulher era loira, bonita, alta e magra, parecia ter nascido em berço de ouro como Dario. Às vezes, penso no tamanho da burrada que fiz ao deixá-lo se aproximar, ao permitir que ele não só entrasse em minha vida como se instalasse em meu coração e fizesse morada em minha alma. O que eu sinto por Dario já deixou há tempos de ser paixão, aquele sentimento passageiro que queima e nos devora, já virou amor, algo calmo, mas contínuo, algo que me traz calmaria mesmo nos momentos de maior agitação. Virou amor ao ter certeza de que me entregaria a ele em um piscar de olhos, sem medo ou reservas, que nem mesmo meus maiores traumas são suficientes para me fazer temer a ele ou repudiar seu corpo. E saber disso me destrói, pois sei que ele nunca corresponderá a mim, que posso até ter uma noite em seus braços, mas não passará disso. Sexo, satisfação sexual. Será que vale a pena? Será que, se eu me entregar a ele, sairei inteira? Ou é melhor viver para sempre pensando que fazer amor dói? Que me machucará me deitar com ele? Talvez seja o melhor, não saber como é... Tantas perguntas permeiam minha mente, tantas dúvidas. Eu saio de perto dele quando sua presença me deixa cheia demais. Cheia de conflitos, cheia de dúvidas, cheia de medos, mas também cheia de sentimentos, sentimentos de afeto, sentimentos de amor. Eu preciso me recompor; ele parece me chamar, mas não dou ouvidos. Quando chego ao lavabo que tanto me acostumei a limpar, solto o ar que estava prendendo e encaro minha imagem no espelho, ficando ali pensando por minutos intermináveis. E se eu terminasse com isso agora? Doeria menos? Conseguiria sobreviver? Eu já estou ligada a ele de todo o coração. O quanto isso me doeria?
— Nunca é fácil, querida. — Ana Martinelli me surpreende ao entrar no lavabo e me analisar.
— O “e se” ficará para sempre se você desistir agora. — diz ao começar a lavar as mãos e secá-las com as toalhas.
— Como sabe que quero desistir? — indago; ela levanta sua sobrancelha feita impecavelmente.
— Eu vi por seus olhos, Alana. Você é transparente. E meu filho também percebeu; ele soube o exato momento em que você quis desistir dele. — eu solto uma risada sem humor.
— Dario é muito complicado, Ana. E eu já o amo, e sei que sairei ferida disso tudo. — as lágrimas despencam dos meus olhos de forma dolorosa.
— Infelizmente, não vou negar, Alana. Você provavelmente sairá machucada de uma forma ou de outra. — sua voz é doce, mas sincera. Ela organiza seus cabelos e então olha o meu reflexo pelo espelho.
— Dario tem várias questões para resolver. Questões essas que acredito que começarão a quebrá-lo ainda esta semana. — confessa de maneira enigmática.
— Mas acredito que, quando ele resolver suas pendências e questões, estará livre, Alana. Livre de amarras, de ódio e segredos. — ela então se aproxima e passa as mãos pelo meu rosto.
— Você o ama, não é? — eu concordo com a cabeça.
— Então, querida, lute por ele. — aconselha e sai, deixando-me sozinha. Vale a pena lutar por alguém, mesmo sem a ideia clara de pelo que estou competindo? Tenho vontade de chorar, de me encolher em um lugar e ficar ali para sempre. Às vezes, perco minhas forças, perco a vontade de colocar um sorriso no rosto e fingir que estou bem. Porque na maioria das vezes é isso: usamos máscaras. Fingimos não nos importar, não nos afetar, mas por dentro estamos mortos. A porta do lavabo se abre, e me surpreendo ao ver Dario ali. Seus cabelos estão desalinhados, seu olhar confuso e agitado me deixa preocupada.
— Aconteceu alguma coisa, Dario? — pergunto, e ele se aproxima, segura minha cintura com uma mão, e a outra vai para minha nuca. Ele enverga o corpo e me beija com desespero, nunca me beijou assim antes, é um beijo carregado de confusão e desespero, onde ele agarra minha cintura, apertando-a contra seu corpo, e seus dedos se enterram em meus cabelos a ponto de dor. Eu solto um arquejo, ele continua em seus desesperos, e eu o beijo com tudo de mim, entregando o amor que tenho por ele nesse beijo desesperado. Quando ele se dá por satisfeito com nossas respirações agitadas, ele me deixa um selinho e descansa sua testa na minha, de olhos fechados. Ficamos assim por vários minutos.
— Não vá, por favor... — Dario implora com a voz carregada de sentimentos que não consigo identificar.
— Para onde eu iria? — indago confusa.
— Para longe de mim.
— Eu só trago problemas para você, Dario. Talvez se deixássemos esse... — ele não permite que eu complete a frase. Ele me silencia com outro selinho.
— Não... — eu entendo, e também não tenho força para lutar. Como eu teria? Eu o amo. Não faz sentido lutar contra.
— Ainda não estou pronto. — revela baixinho. Uma lágrima escapa dos meus olhos.
— E se, quando estiver pronto, me destruir, Dario? — sussurro.
— Seremos dois... — essas palavras dele me esgotam, seremos dois destruídos. Dois perdidos. Dois... somos interrompidos quando Eloá e Elena entram no banheiro. Eu tento me afastar de Dario, mas ele não permite.
— O jantar já será servido. — avisa Elena simpática.
— Obrigada, Elena, já vamos. — Respondo, e Eloá ainda nos olha por algum tempo até sair do banheiro. Então eu encaro Dario, que estava de costas para elas.
— Vamos? Seu pai deve querer dar início à reunião. — ele concorda com a cabeça, e seguimos em silêncio para a sala, onde estavam vários convidados, todos bem vestidos e conversando sobre negócios, até mesmo o Rivera está aqui. Eu aperto a mão de Dario, e ele me encara.
— O senhor Rivera está aqui. — ele procura por meu chefe e o cumprimenta com um aceno de cabeça.
— Sim. — respondeu assim tão simples. Eu aperto sua mão novamente.
— Ele é meu chefe. — cochicho.
— E? — indaga ao levantar uma sobrancelha.
— Não era para eu estar aqui. — explico, ele nega com a cabeça.
— Seu lugar é ao meu lado. — diz com convicção. E então o senhor Rivera vem até nós para cumprimentar Dario.
— Boa noite, Dario. Boa noite, Alana. — Eles trocam um aperto de mão.
— Boa noite, senhor Rivera. — ele acena com a cabeça, e começam a falar sobre negócios. Sentam-se, e eu me sento ao lado de Dario. As vozes se alteram quando Francesco acusa um dos gerentes de alguns dos estabelecimentos dos Martinelli, —que descobriu que são vários—, não estão dando o rendimento esperado. Então, os três filhos do senhor Francesco entram em ação, deixando o pai orgulhoso. Eles falam com propriedade e convicção. Os responsáveis pelos estabelecimentos terão uma semana para prestar contas do rendimento atual ou enfrentarão uma investigação, algo assim. Quando percebo as mulheres se levantando, eu também me levanto, seguindo as quatro para um espaço reservado com sofás, uma enorme TV na parede oposta e um espelho grande com adornos banhados a ouro.
— Melhor deixar os homens se resolverem. — explica dona Ana.
— Eu nunca vi Paolo tão alterado antes. — comenta Elena um tanto assustada.
— Eu já presenciei Corrado assim algumas vezes, por isso não fico surpresa. — comenta Eloá sorrindo.
— Claro, Corrado vive com aquela cara de bravo, é raro dar um sorriso. — comenta Elena, tirando um sorriso de Eloá e Ana.
— Eu conheço cada qualidade e defeitos dos meus meninos. Corrado é comprometido com o trabalho, mas é orgulhoso demais. Paolo é mais família, amoroso, mas é um tanto distraído. — Elena gargalha.
— Ele sempre foi assim, Ana? — perguntou ainda sorrindo.
— Toda a vida. Uma vez ele estava jogando bola com alguns colegas dele, quando voltou para casa, eu perguntei onde estava a bola, e ele perguntou “que bola, mãe?” — até eu tive que sorrir pela maneira engraçada que Ana contou.
— E aí? Ele se lembrou? — quis saber Elena.
— Lembrou, mas disse que não iria buscar, que o amigo que tivesse pego ela faria melhor aproveito. Graças a Deus sempre tivemos uma boa condição, e quando eles tinham essa “bondade”, eu não me importava. — explicou saudosa, sorrindo com os olhos.
— Agora, meu caçula? Não sei se por ser o mais novo ou por ser o último filho, e por ter dois irmãos mais velhos, soube ser mimado por todos os lados. — narrou Ana olhando para mim.
— Dario... ele foi o filho mais amoroso que eu tive dos três. Ele colhia flores do meu jardim todas as manhãs e me presenteava, tinha orgulho de falar que era sua mãe. — Sorri radiante, e eu acabo sorrindo ao imaginar uma versão mais jovem de Dario.
— Eu conheci Dario ainda muito nova, e ele era o melhor amigo que uma pessoa poderia ter. — confidenciou Eloá, triste, e algumas coisas iam se encaixando em minha mente, mas seria loucura demais. Pelo pouco que eu sei, devo estar criando ideias.
— Sim, ele era muito coração. — Era, por que sempre falam no passado? Como se ele não fosse o mesmo.
— E o defeito dele é ser cabeça dura. Quando coloca algo na cabeça, ninguém tira. — fala Ana sentida.
— Acredito que esse é um mal de todos os Martinelli. — rebate Eloá.
— Eu acho Paolo um pouco flexível. Entre os três rapazes, ele é o único mais apaziguador. — defende Elena o marido.
— Sim, Paolo sempre foi pacífico. — concorda dona Ana.
— As personalidades fortes ficaram para Corrado e Dario. — sentencia Ana. Falamos mais um pouco sobre os rapazes, quer dizer, elas falaram, eu só ouvi. Não prestamos atenção na conversa dos rapazes, que durou algumas horas. Resolvemos comer algumas coisas, e tenho que confessar que tudo que comi é um sonho. Só fico imaginando a fortuna que esse jantar não deve ter custado. Acredito que nem em um ano de trabalho conseguiria pagar. Eu me cansei de ouvir sobre as conversas das meninas e resolvi me afastar um pouco para as janelas. Fico imaginando se eu me daria bem em uma vida dessas, sendo mulher de um homem importante. Sei que é apenas um sonho, mas posso sonhar, não é? Ser assim leve, sem me preocupar com quantos reais vai sobrar para o mês que vem, o que vai faltar de alimentos, qual conta ficará para o próximo mês ou ter o luxo de comprar algo que desejo sem me preocupar com o valor. Estou perdida em meus pensamentos quando sinto o perfume e depois os braços de Dario envolvendo minha cintura.
— Não se assustou dessa vez? — Dario comentou ao afundar seu rosto em meu pescoço. Senti sua barba roçando em minha pele, o que me deixou arrepiada.— Não. Sei que é você pelo seu perfume, pela maneira como se aproxima bem devagar, um pouco hesitante. — ele sorri baixinho.
— Olha só, temos alguém com habilidades sensoriais por aqui. — quis bater nele por ser debochado.
— Viu só? Não é só você que tem esses superpoderes. — fui na onda dele, e deu certo, pois ele sorriu novamente.
— Acredito que, por estarmos a muitas semanas juntos, passei um pouco dos meus poderes para você. — falou tão sério que, por um momento, acreditei, e depois foi minha vez de sorrir.
— Sabe que eu nunca vou devolver, não?
— Por que não? — perguntou curioso.
— Quando a gente é agraciada por algo tão especial, não se pode desprender depois. — não sei se estou falando dos superpoderes ou de nós dois. Ele me aperta mais em seus braços e fala bem baixinho.
— Queria ter te conhecido antes... — eu não pergunto o que ele quer dizer com isso.
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uma farsa com o milionário
Romance○ Slow Burn ○ Friend To Love ○ Fake Date ○ Mocinho Protetor ○ Mocinho quebrado Dario Martinelli, aos 28 anos, é um homem de negócios bem-sucedido que acreditava ter toda sua vida planejada milimetricamente. Metódico, imaginava ter tudo sob controle...