CAPÍTULO 41

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                       ALANA REIS

Não posso fraquejar agora e permitir que tudo volte a ser como antes. Não é certo receber apenas migalhas de tempo ou sentimentos, apenas uma mentira, quando para mim significa muito, significa tudo.

— Alana, não faça isso com nós dois. — pede. — Dario sai correndo do carro quando eu penso que ele me deixaria ir sem lutar, pois estava cansada de ser a única a se entregar e queria pôr um fim nesse sofrimento todo.
— E existe “nós dois”, Dario? Algum dia existiu para você? — Ele bagunça seus cabelos e passa a mão por sua barba, parecendo nervoso.
— Eu precisava de um tempo para me resolver, Alana. Eu precisava estar inteiro para você. — responde, parecendo atormentado.
— Eu gosto de estar com você, entende? Eu jurei não deixar mulher alguma se aproximar de mim. — confessa, e isso me paralisa; eu lembro do que Bianca disse.
— Eu não queria me envolver com mulher alguma, Alana, nada que estabelecesse conexões. E tinha conseguido isso até você. Você mudou tudo. Virou minha vida do avesso e transformou o que já era uma desordem em um tumulto ainda maior, mas foi isso que me fez querer ficar. Foi saindo da minha zona de conforto, foi me preocupar com você ao desejar sua proteção que me fez te ver. Te enxergar, entende? — Eu viro para olhá-lo, e pude ver verdades em seus olhos.
— Não posso te prometer um conto de fadas, Alana, nem mesmo um “felizes para sempre”. Não ainda. Existem muitas coisas para resolver dentro de mim para só então poder me doar inteiramente a alguém, a você. Não vou prometer ou mentir para você sobre sentimentos, pois não seria correto. — Ele se aproxima, e eu permito, pois tudo que ele está me dando é muito mais do que ele já me ofereceu alguma vez.
— Existe uma confusão enorme aqui. — ele toca sua cabeça.
— E aqui. — coloca a mão em seu peito.
— Eu pensei que me afastar colocaria meus sentimentos conturbados no lugar, mas senti sua falta. — sussurra baixinho, encostando sua testa na minha.
— Não só falta do seu corpo, mas da sua companhia, dos seus sorrisos, das nossas conversas, senti falta do que eu sou quando estou com você. Você me faz bem, Alana. Você traz uma versão minha que não aparecia há muito tempo. E eu gosto disso. — comenta, e eu seguro sua nuca e beijo seus lábios; ele se surpreende, mas logo me puxa pela cintura, me colando ao seu corpo, e eu solto uma lufada de ar. Como senti falta disso, como eu desejei estar assim com ele novamente. Nosso beijo dura vários minutos, e então nos soltamos, e eu sorrio para ele.
— Promete me avisar quando for se afastar? Pelo menos me dizer que precisa de um espaço, que vai voltar, que está tudo bem entre a gente. — peço baixinho.
— Não vou mais me afastar de você, Alana. — promete, e meu coração entra em um estado de alegria tão profundo.
— Isso é bom. Agora vamos entrar? Aqui está frio. — ele concorda, e entramos de mãos dadas, minha mãe sorri para nós dois.
— Gostei de suas palavras para minha filha, rapaz. Tomara que cumpra o que disse. — Dario estava vermelho, mas balança a cabeça concordando.
— Pode deixar, dona Sônia. Não vou mais me afastar de Alana. — Eu deixo os dois conversando e vou para o banheiro tomar meu banho, sorrindo de alegria. Visto um vestido soltinho e passo meu hidratante preferido; depois, vou para a sala, vejo que Dario continua a falar com minha mãe, e aproveito para preparar um suco para podermos tomar com as batatinhas que comprei na hora do intervalo. Levo os copos de suco para meu quarto e uma travessa para colocar as batatinhas. Depois de tudo organizado na cadeira, volto para a sala.
— Mãezinha, eu fiz suco e deixei um saquinho de batatinhas para a senhora na cozinha, mas não coma muito, tá bom? — Ela sorri para mim, e meu coração se enche de amor; agora me sinto completa novamente.
— Venha, Dario. Eu fiz suco de acerola. — Estendo minha mão, e ele se levanta.
— Só vou no meu carro pegar o notebook e trancá-lo. — avisa e sai para fora.
— Esse rapaz é muito bom, minha filha. Só penso que tem algo que o impede de se doar por inteiro. Tome cuidado para não se ferir. — aconselha, e eu a olho.
— Sabe, mãezinha, eu já o amo, não tem muito o que fazer. — Confesso baixinho, e então Dario aparece com o notebook, e seguimos para o meu quarto.  
— Seu quarto ficou um pouco sem espaço agora. — comentou Dario ao chegar à porta.
— Sim, mas não vai me ver reclamando. Esse colchão e essa cama espaçosa fizeram milagres para meu corpo. — falo inocentemente.
— Estou vendo. — seu sorrisinho safado me faz revirar os olhos.
— Venha, suba na cama que você se “presenteou”, e vamos tomar o suco de acerola. — chamo. Ele retira os tênis e as meias e se encosta na parede, já que não aceitei a cabeceira da cama. Conversamos sobre trabalho; eu queria perguntar o que aconteceu para ele se afastar tantos dias de mim, mas, como sempre, piso em ovos com ele, guardei para mim a curiosidade. Depois de enchermos a barriga, fui guardar os copos e a travessa. Vi mãezinha se queixar de dores e a ajudei a ir para o quarto. E depois voltei para a cama, onde Dario estava concentrado em seu computador.
— O que está chamando sua atenção aí? — indago curiosa.
— Procurando um filme de ação para assistirmos.
— Logo ação, Dario.
— Sim, porque tem uma ideia melhor?
— Que tal um de comédia. — bato meus cílios, e ele sorri de lado, depois faz uma carinha safada.
— Se você se sentar no meio das minhas pernas, eu deixo escolher o filme que quiser. — Eu penso por um momento, mas acabo aceitando. Coloco um filme de comédia; depois de colocar alguns travesseiros atrás dele, me sento entre suas pernas. Dario me abraça, e ficamos assim juntinhos, matando nossa saudade e curtindo.
— Por que quis que eu me sentasse aqui? — pergunto baixinho. Já passava das uma da manhã.
— Estava sentindo falta de ter você pertinho de mim. — Eu me derreto toda, viro para ele e beijo seus lábios; nosso beijo evolui, e quando percebo, estou deitada na cama e ele com o corpo por cima do meu. Meu gemido baixo faz ele parar de me beijar.
— Está se sentindo desconfortável? — Nego com a cabeça e puxo sua nuca para mais um beijo; ele esfrega seu quadril no meu, e eu abro minhas pernas, meu vestido cai em minha cintura, Dario passa sua mão por minhas coxas, e eu suspiro; ele chega ao meu bumbum e aperta. Ele beija meu pescoço, e arrepios correm por meu corpo.
— Sentiu minha falta, gatinha?
— Muito... — Sussurro em seu ouvido, beijando seu pescoço, e ele solta um gemido contido.
— Alana... — Meu nome sai como um rosnado de sua voz. Continuamos com nossas provocações até que ouvimos a porta da sala se abrir em um rompante, e então a voz de Jorge; meu corpo se retesa, e Dario sai de cima de mim. Eu ouço as passadas pesadas dele até a porta do meu quarto, e ele vira a maçaneta da porta, e minha respiração acelera.
— Alana... sua puta... você está em casa? — Outra vez ele tenta abrir a porta, empurrando e fazendo barulho ao forçar a maçaneta, e Dario se prepara para se levantar, e eu não permito. Então ouvimos as passadas com certa dificuldade de mãezinha.
— Jorge? — Sua voz denota mágoa e decepção.
— Sônia. Vai dormir, mulher... me deixe em paz. — Sua voz sai arrastada, e ele parece estar bravo.
— O que faz na porta do quarto da minha filha? — indaga minha mãe.
— Aquela puta de esquina? Sua filha... é uma prostituta... — Ouço um tapa estalando no ar. E então ouvimos um barulho de empurrões abafado e gemidos. Dario se levanta da cama e abre a porta em um rompante; eu vou atrás dele e vejo Jorge empurrando mãezinha contra a parede, apertando seu pescoço com o braço, a sufocando. Dario entra no meio deles, erguendo o braço de Jorge, dando alívio ao pescoço de mãezinha. 
— Tire as mãos dela, Jorge! — Sua voz era fria e letal. Jorge solta minha mãe com um último empurrão, socando a cabeça dela contra a parede e cambaleando.
— O que foi? Está dormindo com a vagabunda da filha dela e pensa que manda em alguma coisa aqui? — Dario parte para cima de Jorge, empurrando-o com as duas mãos, o arremessando longe, e Jorge cai como um saco de batatas podres no chão. Dario segura Jorge pela gola da camisa, armando um soco, fazendo o monstro arregalar os olhos e estremecer de medo.
— Por favor... por favor, Dario, não bata nele. — Implora minha mãe. E na mesma hora aparecem Vivian e Cláudio, que não víamos há muitos dias. Dario aperta ainda mais os dedos na camisa de Jorge, ao ponto de Jorge tossir e o chacoalha várias vezes, olhando em seus olhos com expressão mortal.
— Da próxima vez em que você chamar Alana de puta, eu vou arrancar todos os seus dentes podres da boca, seu porco imundo. — Dario solta a camisa de Jorge, que, de tão bêbado, cai com a cabeça no chão, fazendo um barulho oco. Minha mãe corre até ele, se ajoelhando no chão. Eu olho para Vivian, que está tão decepcionada quanto eu pela cena que estamos presenciando. Dario entra para dentro do meu quarto, muito nervoso, e nossa mãe chora ao redor de Jorge.
— Jorge, acorde! — Bate no rosto dele com cuidado.
— Me ajude aqui, meninas. Precisamos levá-lo para o quarto, ele precisa acordar. — Nós duas ficamos sem reação. Eu não tenho coragem de tocá-lo; parece que o passado está de volta, e odeio lembrar de quando ele me tocava, da impotência que eu sentia. Fico me perguntando por que minha mãe acoberta esse cara? Como ela pode... Dario vê meu estado e me puxa para o quarto.
— Preciso sair daqui. Você vem comigo. — Não é uma pergunta; ele exige, e não querendo ficar sozinha, faço uma pequena bolsa com roupas de modo automático. Quando voltamos para a sala, minha mãe já não estava lá, nem Jorge. Vejo Vivian e Cláudio saindo do quarto deles.
— Ele apagou de tão bêbado que estava, mas está bem. — Comenta Cláudio ao ver que estávamos saindo.
— Cuida da mãezinha, Vivian. Ele tentou agredi-la, Vivian, não sei o que está causando essas atitudes dele. Você sabe que ele não faz isso há anos. — Eu cochicho, mas Dario ouve, e sinto seu corpo rígido.
— Também acho que algo está acontecendo. Você vai aonde? — Inquiriu Vivian.
— Dario precisa de um tempo longe daqui. E eu vou com ele. Se a mãezinha precisar de mim, me ligue.
— Ok. — Vivian parecia não querer ficar ali sozinha, e eu entendia, mas Dario precisa de mim, e eu dele. Saímos os dois em silêncio. Dario parecia furioso e apertava o volante com frequência. Quando chegamos à cobertura, ele deixou as chaves no aparador e saiu para o banheiro do quarto dele. Eu me sentei no sofá da sala de estar e fiquei pensando na merda que é minha vida, em quantas vezes presenciamos aquela cena dele a encurralando, os cochichos, as amantes, os choros de mãezinha. Um relacionamento abusivo e tóxico, onde não existe amor e sim dependência emocional e manipulações. Perdida nos pesadelos da minha família, não sinto a presença de Dario. Ele se senta ao meu lado e me puxa para seu colo, e eu vou de bom grado. 
— Sua família é sempre assim, Alana? — Perguntou baixo.
— Às vezes, Dario. Jorge é estranho, e mãezinha parece ter uma dependência estranha dele. Ela o protege mesmo sabendo dos seus erros. — Isso me faz refletir se ela não sabe do que ele já tentou fazer comigo. Mãezinha não seria capaz de algo tão desprezível. Ou será que seria?
— Ele... sempre tenta invadir seu quarto daquela forma, Alana? — Sua pergunta me deixa tensa, meu corpo todo entra em alerta, e sinto minha respiração oscilar.
— Ei, foi só uma pergunta, não precisa ficar dessa forma. — Ele fala ao puxar meu rosto para olhar seus olhos quase cinzas de tão claro. Eu me perco ali e me acalmo; ele acaricia meu rosto com as costas de seus dedos, e eu solto a respiração que prendia. Eu me aninho em seu abraço e deito a cabeça em seu peito.
— Não quero falar sobre isso, Dario. — Falo baixinho.
— Mas essa não é a primeira vez e nem será a última. — Confesso, sentindo dor só de lembrar. Odeio como tudo que passei nas mãos de Jorge deixa minha mente tão perturbada. Como é horrível ter alguém tentando abusar de você quando você mais se sente vulnerável e paralisada. O pânico, o sentimento de impotência, o suor frio, os olhos e o corpo que paralisam, a voz que não sai. Eu me perco nos traumas; eu odeio falar sobre isso, eu odeio lembrar dessa parte da minha vida, eu me sinto suja, eu me sinto falha. Parece que foi eu quem cometeu os abusos que eu aceitei, que eu gostei. Minha mente é perturbada. Não sinto que estou chorando aos soluços até que Dario me embala.
— Shhh, estou aqui para você, Lana. Só para você. Você está a salvo aqui, meu bem. Você está segura. — Suas mãos deslizam por minhas costas e braços, e aos poucos os soluços passam, e o que perturba minha mente novamente se vai para um lugar escuro, onde eu os escondo, onde eu não preciso pensar no quão horrível e aterrorizante é a minha vida.
— Ele não vai mais tocar em você, Alana, é uma promessa. — Ele sussurra baixinho, e ficamos nesse abraço até eu adormecer. Lembro-me dele me colocar na cama e me cobrir, e assim eu durmo, sabendo que estava segura com o homem que eu amava.

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