Viva o fim do mundo

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Nós dois estávamos de cara para a grade, nos preparando em silêncio, afastados do grupo, sem tirar os olhos do lado de fora - "Vocês têm certeza de que essa é uma boa ideia?" - Ethan se aproximou, cheio de desconfiança, enquanto me passava o meu arco e a minha aljava.

Comecei a me ajeitar com as flechas ouvindo o Liam responder, carregando sua arma antes de guardá-la nas costas - "Vai ficar tudo bem, só... Toma conta de todo mundo e não abre essa grade por nada. Pode me chamar no rádio, mas só se for uma emergência".

"Ok, mas..." - Ele lançou um olhar para mim - "Ela tem mesmo que ir com você? O pé dela está ferrado, vai te atrasar. Eu é que devia ir".

Bufei - "Babaca".

"Você sabe que eu tenho razão".

"A única coisa que eu sei é que mesmo com o pé enfaixado eu ainda sou mais rápida, mais forte e mais esperta que você".

Ele abriu a boca para discutir, mas Liam logo se botou no meio - "Ei, ei, dá para vocês se concentrarem?".

Revirei os olhos e me inclinei para apertar mais as minhas faixas enquanto Ethan fazia cara feia. Pelo canto do olho vi o Liam se aproximar dele e murmurar como se eu nem estivesse lá - "Eu também preferia que ela ficasse, mas acha mesmo que ela vai me obedecer?".

"Ué, não foi você que disse que a gente não devia nunca se separar? Pois aonde você for, eu vou" - Debochei.

Em resposta, Liam só voltou os olhos para o Ethan, em silêncio, mas com uma expressão de quem pensa "eu te disse". Ignorei os dois e virei para o grupo - "Tudo bem pessoal, a gente já vai" - Anunciei - "Lembrem -se... O Ethan está no comando. E ninguém passa por essa grade. Sob nenhuma circunstância".

Eles assentiram, sem ânimo e cabisbaixos, sem dar um pio - Como já era de se esperar em face da possibilidade de termos sido invadidos e de três dos nossos terem morrido: Alycia tinha deixado o rádio em sua cama, e Mel e Stefan não respondiam os seus. A Mel, pelo menos, eu já sabia o porquê. Mas não fazia ideia do que tinha acontecido com os outros dois.

Então íamos fazer o quê nos restava, simplesmente - Liam e eu íamos até a sala de controle ver se achávamos os dois pelas câmeras. O plano, por enquanto, era só encontrá-los e deixá-los seguros, levando-os de volta para os dormitórios. A partir daí só Deus sabe no que ia dar.

E parecia que isso, o pessoal sentia também; a falta de opções que o universo estava nos dando. Tudo estava indo de mal a pior já há um tempo. Não tínhamos folga. E, sinceramente, o fato de agora hospedeiros estarem conseguindo entrar tinha uma sensação de gota d'água. O grupo estava esgotado. Compreensível.

Mas é quando se está cansado que os piores erros são cometidos. Eu sabia disso. Liam também. Por essa razão não íamos perder tempo - Quando eu vi, já estávamos no fim do corredor, percorrendo o espaço, rápido e silenciosamente, cobrindo um ao outro como numa operação tática. Porque, na verdade, era isso mesmo o que aquilo era.

Eu avançava até a esquina, espiava o hall seguinte, dava sinal para ele e Liam fazia o mesmo. Sem o menor barulho. Sem a menor dificuldade. Sem o menor transtorno. Nem sinal de um hospedeiro que fosse, nem mesmo da passagem de algum. Tudo na mais perfeita calma.

Aí chegamos no nosso destino. A sala escura no segundo andar, cheia de computadores e dispositivos. Escutei Liam trancar a porta atrás de mim enquanto eu já praticamente pulava em cima dos monitores. Comecei a percorrer cada um deles, procurando qualquer movimento estranho que fosse. Do meu lado, quieto, Liam fazia o mesmo. O único som que eu ouvia era o da respiração dele.

Até que toda a aparente calma que tinha se pintado na nossa frente desvaneceu, de um segundo para o outro. E a primeira coisa que eu pensei foi que era óbvio. Claro que havia um motivo para tudo ter parecido estar tão sob controle nos corredores. Era só para a situação parecer ainda pior agora. E realmente parecia.

Polaris - Sobreviva ConoscoOnde histórias criam vida. Descubra agora