Eu não vou morrer

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"Posso te trazer mais alguma coisa?" - Stefan me perguntou com a voz macia, acariciando o topo da minha testa com cuidado como se só quisesse demonstrar afeto. Mas não era isso. Ele estava era testando minha temperatura. De novo.

"Você é a milésima pessoa que me diz isso hoje" - Comecei a reclamar da gentileza culposa num sussurro, mas precisei parar no meio do caminho. Porque ele me olhou daquele jeito que todo mundo olhava ultimamente... Como se aquela pudesse ser a última vez que ele estava me vendo... E isso, de instantâneo, sempre me fazia sorrir e concordar com o que quer que fosse que qualquer um dissesse para mim nos últimos dias.

Então mudei o tom da conversa, me dando por vencida - "Eu estou bem... É sério. Não se preocupa".

Não, eu não estava. Nunca me senti pior em toda a minha vida. Mas se era visível, eu não precisava dizer.

Ele suspirou então, olhando para mim, sentado na minha cama improvisada enquanto a luz fraca das velas refletia de leve em seu rosto. Parecia cansado. Com certeza não estava dormindo, tentando achar um jeito de me fazer melhorar. E isso só me deixava ainda mais ansiosa.

Já estávamos acampados no mesmo lugar há alguns dias; desde o momento em que todos se deram conta de que eu não aguentava mais viajar. Não sem gritar de dor. Então, como se isso não fosse nenhum problema, eventualmente só paramos de tentar e sem uma previsão de saída dali. Bom... Não uma que fosse explícita pelo menos.

Porque para mim a coisa era clara: se não fosse por minha causa o acampamento já estaria longe. Num lugar melhor, provavelmente. Se eu morresse... Eles não teriam motivo para ficar ali por nem mais um dia.

Não era uma sensação muito boa. Ainda mais sabendo que ficarmos parados só tinha desvantagens. Para mim, o problema era acumularmos muito barulho ou esgotarmos os recursos do local, sem a chance de aumentar nosso estoque; mas, para eles, eu sabia... O problema era o tormento de não saber o fim da briga no acampamento do Joshua; não saber se eles estavam atrás de nós.

E tudo bem, eu entendia. Nem todos tinham um irmão como o Noah aparecendo em sonhos e os mandando parar de fugir.

Depois de um tempo, então, isso tudo ficou tão certo para mim, que minha preocupação finalmente se tornou maior do que a minha dor constante. Eu sabia que tínhamos que continuar; sabia com tanta certeza que minha própria saúde deixou de ser uma lembrança sem fim; e se tinha alguém que tinha o direito de dizer isso ali... Esse alguém era eu.

Então eu ia dizer. Começando pelo Stefan... E se eu desse sorte... Ele faria o resto - "Seja lá o que você estiver se segurando para não me dizer... Devia dizer logo" - Murmurei baixinho, examinando o rosto dele, estudando sua reação.

E como resposta ele me olhou como se eu o tivesse ofendido; só por ter trazido à tona a conversa em que ninguém queria tocar perto de mim: o fato de que eu estava morrendo de verdade e devagar.

"A única coisa que eu tenho para te dizer é que vamos trocar seus curativos mais cedo amanhã, nada mais" - Deu de ombros enquanto ajeitava meu travesseiro, num tom manso e cheio de normalidade. Aí colocou uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha logo em seguida, evitando me olhar nos olhos.

E eu só o encarei de mal jeito. Já tínhamos o hábito de trocar as bandagens umas quatro vezes ao dia. Então o fato de que agora ele queria aumentar para cinco só queria dizer uma coisa: eu estava piorando de todas as formas possíveis. Não que eu fosse prestar atenção nisso agora.

"Eu ainda estou esperando você dizer 'eu te avisei'" - Comentei, lembrando daquela noite na barraca, em que ele me deu um ultimato - "Sua previsão aconteceu, não percebeu?".

Polaris - Sobreviva ConoscoOnde histórias criam vida. Descubra agora