Tudo ficou escuro

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Cobri bem os meus rastros por pelo menos 10 km de distância do acampamento.

Eu sabia que só era questão de tempo até que o diretor tivesse outra brilhante ideia e colocasse equipes de busca atrás de mim - E isso me deixava bêbada de fúria, só de pensar. Porque foi isso mesmo o que eu tentei evitar esse tempo inteiro. Gente me seguindo quando eu partisse. Embora tivessem me prometido no início que trocariam a mim e o meu "grupo de 10" pelo acampamento inteiro do Joshua, também tinham me prometido que aquela parceria acabaria ali. Então, o fato de terem tentado me levar a força provava que eles não tinham problema nenhum em quebrar contratos.

Assim, por vários quilômetros, eu fiz questão de não deixar pegadas; de andar sobre pedras; até escolhi nadar ao invés de andar, usando um rio como transporte. Molhei as únicas roupas que eu tinha e me arrisquei com a hipotermia, mas pelo menos ganhei tempo. Porque, mais cedo ou mais tarde, eles viriam; a captura de espécimes e o meu caminho sem rastros ganhariam tempo para mim, mas não eram soluções eternas. Mais um pouco de espera e eu estaria lutando de novo.

Então, segui atenta. Passei a minha primeira noite na mata, ainda molhada, acordando de quinze em quinze minutos, achando que eu tinha escutado passos. E não comi. Mesmo se eu caçasse alguma coisa, não poderia fazer uma fogueira para cozinhar. Era sinalizar para Deus e o mundo aonde eu estava. E apagar rastros de fogueira era praticamente impossível.

Mas, não parei em nenhum momento. Assim que levantei com o sol na manhã seguinte, comecei a me preocupar com o primeiro item da minha lista. Eu tinha que conseguir um mapa.

Segui o rio. Eu sabia que a água sempre levava às pessoas antes, então agora me levaria às coisas que as pessoas deixaram para trás. Devo ter feito isso por dois dias. Vivendo só da água da correnteza e de peixes que eu caçava, limpava, e comia dentro da água, crus. Dois dias inteiros assim, até eu ver a sombra de uma estrada. Aí mudei de direção e comecei a seguir o asfalto. De longe, é claro. Gente que tinha carros em estado conservado o bastante para usar as estradas não valia a pena conhecer hoje em dia.

Aí caminhei por mais um dia até enfim achar um posto de gasolina. E lugares assim já deviam ter sido saqueados há muito tempo, claro. Eu não esperava achar comida ou água lá, mesmo estando faminta... Mas, torci para que pelo menos não tivessem levado todos os mapas do balcão.

Entrei pelas portas de vidro da loja de conveniência com o sol fervendo, às três da tarde, com os raios laranja inundando as estantes viradas, vazias. Olhei em volta um instante. Virei para o balcão. Só aí vi letras gigantes e manchadas em vermelho na parede da frente, logo depois da registradora, dizendo três vezes: "EU EXISTO EU EXISTO EU EXISTO".

Franzi a testa. Dei de ombros e decidi acreditar, pela minha própria sanidade, que aquele vermelho escurecido na parede era tinta spray barata ou tinta guache. Nada demais. E comecei a revirar as coisas no balcão.

Nada. Olhei por cima dele e vi que tinha um monte de coisa jogada no chão do outro lado. Dei a volta na bancada e entrei no espaço do atendente; me abaixei para ver o que tinha lá e saí revirando as tralhas e papéis. Foi quando eu escutei. Vindo de bem longe, ferindo o silêncio da estrada abandonada: um carro grande estava se aproximando.

Continuei no chão. Sequer respirei. Concentrei-me no som, torcendo para que o carro passasse direto. Mas, logo me dei conta de que ele parou de repente, bem em frente ao posto - Aí me encolhi o máximo que pude e fui para debaixo do balcão, apertando a faca do Noah entre meus dedos até minha mão doer.

Escutei várias portas baterem. Era um carro só, mas várias pessoas. E pelo barulho, era um carro com carga acoplada, talvez uma carroceria. Suspirei e esperei o pequeno sino da porta chacoalhar, anunciando a entrada de alguém - Meio minuto depois foi exatamente o que aconteceu. Escutei passos.

Polaris - Sobreviva ConoscoOnde histórias criam vida. Descubra agora