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Lyana

A luz da lareira lançava sombras dançantes pelas paredes escuras do quarto, criando formas fantasmagóricas que pareciam ganhar vida na penumbra da Corte dos Pesadelos.

O calor do fogo mal chegava até mim, apesar de eu estar sentada bem próxima das chamas. O vento gelado que soprava pelas fendas das janelas fechadas não deixava esquecer o frio lá fora. O manto pesado, forrado de peles macias, envolvia meus ombros, o tecido de um azul profundo quase negro, refletindo o brilho laranja das chamas. Minhas botas de couro macio, feitas para enfrentar a neve das montanhas, estavam cobertas por uma fina camada de gelo derretido, agora formando pequenos riachos que escorriam até o chão de pedra.

Olhei para Eris, repousando na cama grande e intricadamente esculpida que dominava o quarto. Seu rosto estava pálido, e as bandagens que cobriam seu torso revelavam a gravidade dos ferimentos que ele havia sofrido na batalha. Seus cabelos ruivos estavam bagunçados sobre o travesseiro, e mesmo assim, ele conseguia ser encantador de uma forma que me irritava e atraía ao mesmo tempo. A batalha parecia ter acontecido em outra vida, embora o cheiro de sangue e a lembrança do calor do combate ainda estivessem frescos na minha mente.

Eu podia sentir o poder pulsando dentro de mim, uma presença constante que parecia crescer a cada dia, a cada nova morte que eu causava. A imagem do coração de Beron em minhas mãos, ainda quente, fazia meu estômago se revirar, mas a sensação de triunfo, de vingança, era uma tentação doce demais para ser ignorada.

A guerra estava mais próxima do que nunca. Eu podia sentir isso na forma como a escuridão parecia mais densa, mais palpável. As muralhas da Corte dos Pesadelos pareciam respirar, como se também sentissem a ameaça iminente. O ar era pesado, carregado com a promessa de mais sangue derramado, mais vidas perdidas. Não havia mais espaço para dúvidas, para hesitação. Eu estava me tornando algo que jamais imaginei, algo que Beron, em sua arrogância, jamais teria antecipado:

— Você vai ficar aí me ignorando por quanto tempo, Lyana? — A voz de Eris, carregada com aquele tom de sarcasmo familiar, me arrancou do meu devaneio. O sorriso em seus lábios era fraco, mas ainda presente, como se a dor que ele sentia fosse apenas mais um obstáculo a ser superado com graça e charme.

Virei-me lentamente para ele, permitindo que meus olhos deslizassem sobre seu corpo ferido, mas meu coração apertou-se de leve ao ver a fragilidade que ele tentava esconder:

— E o que você espera que eu diga? — Respondi, minha voz soando mais suave do que eu pretendia. Havia algo em Eris, algo além da fachada arrogante e dos jogos políticos, que eu não conseguia ignorar. Algo que fazia meu coração acelerar e meu sangue correr mais rápido.

Eris soltou uma risada baixa, entrecortada por um suspiro de dor, mas seus olhos brilharam com aquele fogo que parecia nunca se apagar, não importava quão escura fosse a noite:

— Eu esperava pelo menos um elogio. Ou talvez uma promessa de que não vai deixar que eu morra nesse quarto escuro e deprimente.

— Não seja dramático, Eris. — Repliquei, mas um pequeno sorriso curvou meus lábios. — Eu cuidarei de você. Pelo menos até você estar bem o suficiente para me irritar de novo.

Eris inclinou a cabeça para o lado, os olhos escuros traçando as linhas do meu manto de viagem. O silêncio se estendeu entre nós, carregado por um entendimento tácito, até que ele finalmente quebrou o momento:

— Vai a algum lugar? — A pergunta saiu casual, mas havia uma ponta de preocupação que ele não conseguiu esconder.

Meu olhar se voltou para o fogo por um instante, como se as chamas pudessem responder por mim, mas logo voltei a encará-lo:

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