— Ele é um idiota. — falou Ronan quando estávamos voltando para casa.
— Eu sei.
— Ele podia ter machucado você.
— Eu sei.
— Você sabe falar outra coisa além de "eu sei"?
— Lesly sorriu para mim quando pegou meus livros. — falei com um sorriso largo no rosto.
Ronan suspirou, mas prosseguiu andando.
— Você devia me pagar por aguentar você falando quase todo minuto dessa garota.
— Dessa garota não. O nome dela é Lesly.
— Tanto faz. Só acho que você devia aproveitar a oportunidade que vai fazer o trabalho com ela e dar uns amassos nela ao quadrado da hipotenusa. — Ronan riu e por incrível que pareça eu também.
— Não vou estragar nada que nem tenha começado. — Afinal, eu nem era amigo dela para ter esperança de algo.
— Você que sabe. Vou aproveitar cada momento para infernizar a vida de Daniela.
Chegamos na minha casa e Ronan se despediu. Entrei e vi a sala e a cozinha vazia.
— Cheguei!
Joguei a mochila no sofá e fui para os fundos da casa. Nada.
— Tia?
Apenas o silêncio.
A casa estar vazia é um evento raro, pois Tia Veronica e Tio Luis vivem dizendo que não é bom eu ficar sozinho em casa. Peguei o celular e disquei o número de Tio Luis. Depois de dois toques ele atendeu.
— Tio? É o Breno. Onde você está? A tia Veronica não está em casa também.
— Estou na mecânica fazendo hora extra, sua tia foi ao banco. Quando chegar ela te explicará tudo.
Explicar o quê? Afinal não eramos uma família que guardavamos segredos uns dos outros. Joguei o celular no sofá e milhões de coisas passaram pela a minha cabeça.
****
Duas horas depois ela chegou. Estava usando um terno feminino e se assustou quando me viu ao lado da porta.
— Oi, Breno. Está tudo bem? Você já lanchou? — ela disse, tirando o casaco.
— O que você foi fazer no banco, tia? — perguntei.
Ela me tirou da cadeira me fazendo sentar no sofá. Ela se sentou ao meu lado e pegou minha mão.
— Bom, Breno. Acho que já está na hora de você se decidir o que vai fazer com o dinheiro que seus pais deixaram para você.
Por isso ela foi ao banco. Com certeza eles ligaram aqui perguntado sobre meus pais, pois não se mexia na conta à mais de sete anos.
— A senhora sabe que nunca vou mexer naquele dinheiro. — falei tentando desviar do olhar doce de tia Veronica.
— Querido, olhe para mim — Me virei e vi minha tia pálida, cansada e com alguns cabelos brancos nascendo. — Você já tem 18 anos, daqui a pouco vai ter que ir para uma universidade. Você pode usar o dinheiro para seus estudos. O seus pais ficariam orgulhos.
— Eu não sei...
— Breno! — ela interveio. — É triste e ainda me dói o que aconteceu. A minha única irmã morreu naquele acidente. Dói tanto em você quanto em mim, mas precisamos aceitar. Quero ver você feliz, construindo uma família e uma carreira.
— Posso pensar primeiro sobre o assunto?
— Darei o tempo que você precisar. — tia Veronica concluiu alisando meus cabelos.
****
Mais tarde fiquei trancado, deitado no meu quarto. Não saía da minha cabeça sobre a conversa com minha tia. Eu sempre me lamentei pela morte dos meus pais. Mas durante todos esses anos me esqueci que minha tia perdeu a irmã dela também. A única irmã. Fui egoísta só pensando em mim mesmo, fiz ela e meu tio perderem seus anos de recém-casados quando tive que vir morar com eles. Nunca vi eles sairem sábado a noite por conta da preocupação comigo ou fazer algo que casais comuns fazem.
Chega de se fazer de coitadinho.
Eu tinha perdido o movimento das pernas naquele acidente, não a minha dignidade e força de vontade.
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Amor Sobre Rodas
RomansBreno fez fórmulas, resolveu equações e tentou telefonar para o além do túmulo de Albert Einstein, mas não conseguiu entender. Lesly fez rascunhos em guardanapos, comprou a última versão da gramática e releu os clássicos, mas também não conseguiu en...