Lesly

6.1K 553 31
                                    

Quando abri meu armário da escola no dia seguinte milhares de convites para o baile caíram no chão. Contei e no total eram vinte e três convites de garotos diferentes.
Me abaixei para pegá-los. Não estava nos planos ir para o baile, porque primeiro: odeio festas e segundo: odeio festas que tenha pessoas da minha escola.
Juntei os convites em uma pilha e os coloquei dentro do armário sem ler nenhum. Me senti mal por aqueles garotos terem gastado dinheiro em um convite que seria descartado de qualquer jeito.
Assim que fechei o armário, avistei alguém do meu lado. Alguém que eu conhecia muito bem.

—Então é assim? Descarta os convites sem nem saber de quem vieram. Como você cresceu. — falou o alguém. Era Hugo.

—Será que dá para você me dar um tempo? — falei áspera, sem nem olhar para ele que encostou no armário do lado.

—Poxa Lesly. Sério, eu sei que nesse ano eu fui um completo idiota..

—Não só esse ano como em todos que passei com você. — falei.

—É — Hugo falou sorrindo — Eu não sou a melhor pessoa do mundo e todos cometemos erros sabia? Vai me dizer que você nunca fez mal a ninguém.

Não respondi e fui andando para a minha próxima aula. Como imaginava, Hugo veio atrás de mim e foi andando do meu lado.

—Eu queria me desculpar. Por tudo sério e te fazer um convite — ele segurou o meu braço e paramos em frente a minha sala de aula — Vai para o baile comigo. Seria a forma de mostrar para você que estou mudando. Por favor.

Me virei finalmente para Hugo e eu vi aquele garoto esnobe, de cabelos ruivos que estava se humilhando por mim.
Eu podia xinga-lo e dizer para que ele me deixasse em paz. Mas eu ouvi a palavra mudança sair de sua boca. Coloquei uma das mãos em seu ombro.

—Hugo, você é um garoto mimado e irresponsável que eu passei mais de quatro anos do lado. Fico feliz que você queira mudar, porque aliás você precisa mudar. Eu precisei e olha só. Mudei. É possível mudar nossas vidas e a atitude daqueles que nos cercam simplesmente mudando a nós mesmos, antes eu era amada por todos e hoje sou odiada — parecia que Hugo ia falar algo, mas o cortei e continuei a falar — Eu não te odeio mesmo você sendo detestável comigo e com os outros. Eu tenho pena de você. Pena porque sei que no futuro você vai olhar para trás e se arrepender de tudo que fez. Hoje você fala de mudança, mas amanhã eu sei que você vai continuar atormentando minha vida. Mude por você, não por mim.

Tirei minha mão do seu ombro e não vi Hugo demostrar reação alguma. Antes de entrar na sala me virei novamente para ele:

—E sobre o baile, tenho planos com outra pessoa.

****

Estava no meu quarto me preparando para o jantar de Daniela. Era não havia parado de falar naquilo a semana inteira. Eu sabia que ela passaria metade do tempo com Ronan, então foi um alívio quando ela me pediu para convidar Breno também.

—Posso entrar? — Mamãe falou já abrindo a porta do quarto.

Meus pais finalmente começaram a se falar novamente e tudo em casa começou a voltar ao normal. Mamãe usava a aliança e voltava a se preocupar com a aparência, meu pai a beijava e abraçava e todos sorriam.

—Para onde minha filha vai toda produzida? — mamãe falou me abraçando e alisando o meu vestido de listras que ia até os joelhos.

—Produzida? Me mostre — falei rindo — Vou comemorar o aniversário de Daniela.

—Não gosto dessa garota. Ela é péssima para você. — Mamãe falou e estragou o momento mãe e filha.

Me soltei do abraço e peguei um par de brincos sobre a escrivaninha da cama.

—Ela é uma pessoa maravilhosa mãe. Não julgue quem não conhece.

Mamãe se sentou na minha cama e me encarou. Ela fez um sinal para que eu sentasse ao seu lado.

—Querida, eu sei que não foi uma semana fácil para todos nós. Houve brigas entre seu pai e eu. Só quero que você saiba que isso acabou, tudo bem? Somos ainda aquela família linda e feliz que sempre tivemos.

Concordei com a cabeça e ganhei um sorriso de mamãe. Ela estava linda. Parecia que sempre depois das brigas que ela tinha com meu pai sua beleza rejuvenecia. Mamãe pegou minhas mãos e deu beijo. Ouvi de lá de baixo alguém gritando meu nome.

—Acho que eles chegaram. Até a noite mãe. — falei saindo do quarto.

—Volte antes das onze. — ouvi ela gritar do meu quarto.

****

Abracei Daniela de uma maneira tão forte, que suspeitei que quebrei a coluna da minha velha amiga. Ela estava linda, os cabelos negros estavam em uma trança e o vestido preto com lantejoulas costuradas fazia ela brilhar naquela noite. Sim, Ronan era um garoto considerado pelos outros de sorte.

—Estou me sentindo feia ao seu lado.— falei enquanto entrávamos no carro. Cumprimentei Ronan com um aperto no ombro. Ele estava no banco do motorista e Daniela sentou-se ao seu lado. No banco do passageiro.

—Ora, cale a boca. Você está linda.

—Uma garota bonita não é aquela de quem se elogiam as pernas ou os braços, mas aquela cuja inteira aparência é de tal beleza que não deixa possibilidades para admirar as partes isoladas. — Ronan falou de repente, dando um beijo no rosto da namorada.

—Nossa! Você falou igual o Breno. Sempre poeta. — Daniela retrucou o beijo.

—Falando em Breno — falei e os rostos dos dois se afastaram rapidamente — Melhor irmos buscá-lo.

—Vamos! — Ronan gritou e acelerou o carro pelo bairro.

****

Ronan estacionou em frente a casa de Breno. Ele não precisou buzinar nem nada, Breno saiu de casa com Dona Veronica falando em seu ouvido o que fez Daniela e eu rir.
Abri minha janela e deu um sorriso para Breno. Ele notou e deu um meio sorriso totalmente desanimado.

—Então.. Vamos? — Ronan falou saindo do carro e cumprimentando Dona Veronica.

—Breno não vai poder ir — Dona Veronica respondeu gentilmente. — Ele não pode ir nesse carro. Sem proteção alguma.

Me senti horrível. Havíamos nos esquecido que Breno precisava de um carro adaptado para ele.

—Mas e o carro do seu Luís? Ele não pode não emprestar. — gritei da janela do carro.

—Meu tio foi com o carro até a cidade. Não sabemos a hora que ele volta. — Breno murmurou me olhando nos olhos.

Daniela saiu do carro e deu um abraço em Breno. Ele estendeu uma caixa embrulhada para ela que recebeu com um sorriso.

—Não precisava Breno.

—Feliz aniversário. Aproveitem o jantar.

Ronan abraçou o amigo também e eu fiquei no carro, olhando para o carpete. Eu queria tanto que Breno fosse conosco, não seria a mesma coisa sem ele. Pela primeira vez senti uma distância entre Breno e eu. Senti saudades dele. Olhei para a janela na tentativa de cruzar com os olhos dele uma última vez naquele noite, mas foi em vão. Ronan já havia acelerado o carro pela cidade.

Amor Sobre RodasOnde histórias criam vida. Descubra agora