Me impressionei com a diferença do carro do Seu Luís para os outros carros comuns que eu já havia dirigido.
Parecia mais largo que o normal e na banco do passageiro era totalmente adaptado para um cadeirante. Ao lado do banco do motorista havia um espaço vazio que deveria ser do banco do passageiro, segundo dona Veronica, seu Luís tinha pagado para tirarem o banco para ser o meio de entrada de Breno, assim ele não precisaria sair da cadeira de rodas quando fosse andar de carro e também havia uma rampa servindo de suporte para a entrada de Breno no carro. De resto o carro era comum e fiquei mais tranquila e feliz por ter tido a confiança de dona Veronica me emprestar o carro.
Eu havia feito a besteria de ir buscar Breno com o carro dos meus pais, que não era seguro para um cadeirante, aproveitando o sono pesado de Breno fui de volta para casa e voltei sem o carro.—Está tranquilo Breno? — Perguntei assim que ele estava seguro com a cadeira no carro. Eu não havia tirado o carro do lugar ainda. — Posso ir? — Breno apenas assentiu nervoso. Liguei o carro e acelerei devagar.
Ele estava com os olhos fechados, como se estivesse rezando ou algo parecido.
—Você é muito corajoso Breno — falei tentando acabar com seu nervosismo. —Sabe, se fosse eu no seu lugar nem imagino o que faria. Acho que não teria coragem de enfrentar meu maior medo.
Breno estava agora com os olhos abertos, mas continuava calado.
—Quer que eu ligue o rádio?
Breno assentiu positivamente e liguei o pequeno rádio. Chiados estridentes era o som que transmitia, fui para outras estações, até que achei uma que tocava uma música bem conhecida.
—Essa música é linda! I Lived. — falei animada e aumentei o volume do rádio, deixando no máximo. — Cante comigo.
Breno me olhou confuso, mas não me importei, diminui a velocidade e comecei a cantar:
—Espero que quando você der esse salto, você não sinta a queda. Espero que quando a água subir, você já tenha construído um muro. Espero que quando a multidão gritar, eles estejam gritando o seu nome. Espero que, se todo mundo correr, você tenha escolhido ficar. — olhei rapidamente para Breno que continuava imóvel. —Vamos Breno! Cante comigo.
—Espero que você se apaixone, e que doá muito. — Breno cantou alto para minha surpresa — É a única maneira que você pode saber, que deu tudo o que tinha e eu espero que você não sofra, mas tire a dor. Espero que quando o momento chegar.. Você diga..
— Eu, eu, eu, Eu fiz tudo. Eu, eu, eu, Eu fiz tudo. Eu aproveitei cada segundo que este mundo me deu. Eu vi tantos lugares, as coisas que eu fiz. Com cada osso quebrado. Eu juro que eu vivi! —Breno e eu cantamos alto.
—Eu queria poder ver toda sua alegria. Toda a sua alegria e toda a sua dor. Mas até a minha vez chegar, eu vou dizer. Eu, eu, eu, Eu fiz tudo. —Breno cantou sozinho.
—Viu? Cantar te fez ficar mais relaxado. — falei sorrindo.
Breno deu um meio sorriso, mas continuou sem se mover na cadeira.
—Para onde estamos indo? — Breno perguntou finalmente.
—Uma capela. — falei tranquilamente, enquanto continuava com as mãos sobre o volante. — Ela fica na região norte. Perto daqui.
—Mas por que uma capela? Podíamos ter pensado em outro local mais perto da cidade.
—Não é uma simples capela Breno. Você conhece as lendas que tem nessa cidade? — Como eu esperei Breno assentiu negativamente — O terreno que hoje está a capela abandonada já foi uma biblioteca pública, mas foi demolida pelo vereador da cidade. No subsolo da capela existe livros de todas as épocas deixados por conta das despesas para transportar tantos livros e artigos velhos. Existe lendas que estudantes cabulavam aulas e iam para a capela que estava sempre vazia, dizem que em uma dessas fugas de aula uma garota morreu e foi enterrada no mesmo subsolo que está os livros.
Breno me olhava perplexo e por um momento achei que ele iria perguntar algo, e ele perguntou:
—Você quer que a gente estude em uma capela assombrada?
—A história é uma grande farsa Breno, mas qual foi a última vez que você fez algo desse tipo? Quando você saiu da sua zona de conforto?
—Nesse momento eu estou fazendo algo animado. — Breno falou olhando para o carro.
Eu não sabia o que Breno havia passado, ninguém além dele sabia que andar de carro era um dos maiores desafios de sua vida.
—Sabia que eu saí da minha zona de conforto? — falei — Sempre tive uma vida regrada e cheia de padrões, me sentia em uma completa escuridão. Até que um dia, eu vi a luz e essa luz me mostrou uma vida cheia de possibilidades e coisas para conquistar. A vida começa no final de sua zona de conforto.
—A vida começa no final de sua zona de conforto — Breno repetiu ainda concentrado na paisagem da estrada que era baseada em grandes pinheiros — Obrigado Lesly.
—Obrigado por quê?
—Por me ajudar a enfrentar esse medo. Meus pais morreram assim, mas isso não quer dizer que aconteça novamente. O medo atrasou minha vida em muita coisa.
—Breno, se você permanecesse na sua zona de conforto certamente não iria muito mais longe. Mas agora estou aqui — falei enquanto parava o carro em uma esquina deserta, onde havia apenas um pequeno trilho entre as grandes árvores. Peguei a mão de Breno que parecia fria — Eu vou te ajudar a superar isso, como você também me ajudou.
—Lesly, mas afinal por que vir para essa capela? O que ela tem de impressionante além dessas histórias de terror infantis? — Breno perguntou.
Respirei fundo e soltei a mão de Breno que aparentemente continuava mais fria do que estava.
—Meus pais se casaram nela, eles fizeram uma jura de amor que dizia: "Nossa amor vai durar até quando as flores do estreito jardim da capela continuarem de pé; Nosso amor vai durar até o momento que ela estiver cheia de vida;". Acho que as flores murcharam e a vida que havia ali morreu, pois o casamento dos meus pais está por um fio, enfim eles tiveram um lugar especial, que virou um símbolo do amor que sentiam — engasquei nervosa naquele momento — E eu também quero isso com você.
"Eu odeio o silêncio" pensei, assim que ficamos alguns minutos apenas se encarando.
Breno se virou para mim e pegou minhas mãos.—Meu amor por você durou por mais de quatro anos e eu não precisei simbolizar o que sentia, pois não haveria como. Não existe lugar, objeto e nada que consiga demostrar como eu amo você.
Me curvei até Breno e o abracei. Não existia lugar mais reconfortante que um abraço dele. Breno levava com ele uma energia positiva para o ambiente, parecia que ele tinha paz em meio a uma grande guerra.
—Melhor que o seu beijo, só seu abraço — sussurei — Vamos! Quero te mostrar onde vamos estudar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Amor Sobre Rodas
RomanceBreno fez fórmulas, resolveu equações e tentou telefonar para o além do túmulo de Albert Einstein, mas não conseguiu entender. Lesly fez rascunhos em guardanapos, comprou a última versão da gramática e releu os clássicos, mas também não conseguiu en...