O que só serviu para provar que ele estava certo quanto à contratação dela, para começo de conversa. E, na próxima vez que falasse com Mitchell, ele diria isso ao velho amigo em termos inequívocos. Se ele não tivesse introduzido Ivy em sua vida, então o mundo de Tanner continuaria exatamente como sempre fora. Silencioso. Controlado. Ordenado.
Bem, em sua maior parte.
Afinal, Hairy também era parte de seu mundo agora. E o cão se tomara parte da rotina de Tanner, que mal conseguia se lembrar da vida sem aquele pequeno vira-lata. Um banho clareara a cor do pelo do cão até assumir uma tonalidade de mel, e um par de boas refeições foi o bastante para começar a engordá-lo.
Engraçado: quando criança, tudo o que Tanner sempre quis era ter o seu próprio cão. Claro, mudar de hotel para hotel não era vida para um cão do tipo que ele queria. Um cão de criança, não um daqueles de raça pura, do tipo que as mulheres idosas e jovens sofisticadas transportavam em suas bolsas.
Entretanto, ao crescer e ter a sua própria casa, ele jamais considerara ter um cachorro. Não parecia mais importante. Agora, ele não conseguia imaginar como pudera acreditar naquilo.
Tanner e Ivy haviam levado o cão ao veterinário para tomar as vacinas e tiveram a boa notícia de que, apesar de estar desnutrido, Hairy estava em condição de saúde surpreendentemente boa. O veterinário estimou a idade em cerca de três anos e disse que com amor, boa alimentação, amor e exercícios, ele deveria ficar perfeitamente bem em mais ou menos uma semana.
Levou muito menos tempo do que isso.
Hairy assumira o comando do palácio de vidro e madeira a que Tanner chamava de lar. Dormia nos sofás de grife ou na cama de Tanner, tinha as suas próprias tigelas de água e alimentos na cozinha e deitava-se aos pés de Tanner enquanto este trabalhava. Ivy o levava para passear quase todos os dias, quando ela chegava para trabalhar e, às vezes, Tanner os acompanhava. Contudo, tais caminhadas eram sempre tranquilas, uma vez que eles não só se recusavam a falar sobre o que havia ocorrido entre eles como também evitavam tocar um no outro. E a luxúria represada dentro dele estava ameaçando afogá-lo completamente. Mas aquela maldita mulher era mais teimosa do que ele poderia imaginar.
Ivy o tratava como trataria a um conhecido. Alguém com quem ela não tivesse muita intimidade e desejasse manter as coisas como estavam. Não houve mais sorrisos fáceis, toques casuais de mãos e nenhuma visita ao seu escritório para ver o que ele estava criando. O que era conveniente, dizia Tanner para si mesmo, uma vez que o jogo no qual estava trabalhando tinha agora um anjo vingador com o rosto e o corpo de Ivy Holloway.
Ele não conseguia tirá-la de sua mente do mesmo modo que não conseguia evitar que o seu corpo respondesse a ela.
Meu Deus, como ele a desejava.
Toda vez que ele a via, ele se lembrava do que tinham compartilhado naquela noite incrível. Mas sempre que ele pensava em reavivar a paixão entre eles, algo o detinha. Talvez fosse aquela última conversa. Ela deixou claro o bastante que não estava interessada em mais uma rodada de sexo selvagem. E ele preferia morrer a forçar uma mulher a deitar em sua cama, pelo amor de Deus.
Além disso, havia algo mais.
Ela tinha sido muito vaga sobre por que se afastara dele. Aquilo o deixara pensativo. Por mais que ele a desejasse e admirasse, Tanner não podia negligenciar o fato de ela ser uma variável desconhecida. Ele gostava de ordem em sua vida pela simples razão que, quando criança, sua vida fora um caos. Com regras e ordem, não havia espaço para confusão.
Não havia espaço para a dor ou a traição.
Mas você tem um cão, argumentou-lhe a mente.
Mas Hairy era diferente, assegurou a si mesmo. Um cão aprendia regras e, principalmente, obedecia a elas. Mas e uma mulher como Ivy? Quente e depois fria? Ele não podia prever o que ela diria ou faria de um momento para o outro. Ela nem mesmo acreditava em regras. A vida com Ivy certamente seria um tumulto.
As vezes, ele pensava sobre o toque de sua pele, o gosto de sua boca, a sensação inebriante de possuí-la e dizia para si mesmo que talvez o caos tivesse algum espaço no mundo dele. Então, ele voltava a si e percebia que o sexo só causaria problemas. Era melhor manter o equilíbrio. Manter a relação tão platônica quanto ela parecia estar querendo.
- Provavelmente seja o melhor a fazer - murmurou.
Tanner só queria poder parar de pensar nela a cada minuto.
Ele acariciou o cão e então se recostou na cadeira do escritório. Em seguida, mandou um e-mail para os programadores de sua empresa. Ele já estava quase acabando os esboços dos personagens para o novo jogo e, enquanto pensava, olhou para a mulher que desenhara naquela manhã. Era a cara de Ivy estampada naquela página. Seus olhos, seu nariz, sua boca inchada pelos seus beijos. A mulher brandia uma espada luminosa no ar e as asas que saíam de suas costas estavam carregadas de poder.
Primeiro, ela se tomara Lady Gwen. Agora, pensou, era Aurelia, a Vingadora.
Ele estava em má forma.
- Maldição - murmurou Tanner, afastando os pensamentos de sua mente. Ele estava começando um novo jogo. Algo que ele geralmente fazia muito bem. Construindo personagens, criando cenas, inventando as regras e meandros a serem seguidos. Regras. Jogos, assim como a vida, precisavam de regras. Mas Ivy continuava quebrando todas.
Ele esfregou a nuca com a mão e resmungou baixinho. Ele cumprira o prazo de Nathan, sua empresa estava prestes a se tomar o que havia de mais quente em termos de jogos de computador e ele estava ali sentado, como se estivesse de luto.
O que diabos estava acontecendo?
Por que, perguntou Tanner, ele se sentia como faltasse fazer algo? Como se houvesse algo errado?
Ivy deu os últimos retoques no bolo de chocolate que ela fizera para Tanner e disse para si mesma que aquilo simplesmente não poderia continuar. Os últimos dias tinham sido tão difíceis que ela simplesmente não poderia deixar que aquilo continuasse como estava. Ela tinha de dizer a verdade. Tinha de abrir o jogo com ele. Ela sentia como se estivesse carregando cem quilos em cada ombro. Ou dentro de seu coração.
Ela não foi feita para mentir.
(๑♡∀♡๑)Eenie Meenie