Capitúloo 58

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Era verdade, admitiu Tanner silenciosamente. Mas a traição ainda era um fato.

- Eu confiei em você.

- E ainda deveria confiar, - ele riu, sem humor.

- Por quê?

- Porque eu sou seu amigo, Tanner - disse Mitchell em meio a um profundo suspiro. - Nós nos conhecemos há muito tempo.

- E, no entanto, você me esfaqueou pelas costas.

- Caramba, você deveria ter sido ator, não desenhista - murmurou Mitchell.

- E você deveria ter me dito quem ela era.

- Você nunca a deixaria entrar na casa.

- Exatamente - disse Tanner. Então, no momento seguinte, lembrou-se de tudo o que ele teria perdido caso não tivesse conhecido Ivy Holloway. Lembrou-se de dezenas de imagens dela, uma mais impressionante do que a outra. Ivy rindo. Ivy abraçando-o. Ivy debruçada sobre ele, ajudando-o a resolver problemas do jogo de computador. Ivy encharcada enquanto dava banho em Hairy.

Ivy.

Sempre Ivy.

- Como você descobriu? - perguntou Mitchell depois de um longo momento de silêncio.

Tanner foi até a janela da cozinha e olhou para o crepúsculo que avermelhava o horizonte. Logo seu olhar voltou-se infalivelmente para o que ele podia ver da fazenda. O teto da casa de Ivy destacava-se como uma sombra mais escura em meio à penumbra. Ele a imaginou ali dentro, sozinha, assim como ele estava sozinho em sua própria casa. Mas logo disse para si mesmo que não deveria se preocupar com o lugar onde ela estava e nem com o que ela estava fazendo.

Ele confiara nela e ela mentira para ele.

Simples assim.

- Eu a ouvi ao telefone, falando com o gerente da fazenda disse ele. - Quando eu a confrontei, ela me contou tudo. Queimou o seu filme, também, embora eu não ache que ela pretendesse fazê-lo.

Mitchell deu uma risadinha.

- Eu sei cuidar de mim.

- Por que fez isso, Mitch? - A raiva se fora, restando apenas a perplexidade. - Por que você me enganou? Por que você ajudou Ivy a me prejudicar?

- Não foi para prejudicá-lo, Tanner. Foi para ajudá-lo. Eu o amo como um irmão, mas você está se isolando. Fora eu, seus irmãos e primos, você nunca vê ninguém. Você está se fechando, e eu não gosto de vê-lo assim.

A voz do amigo soava séria, preocupada. Tanner era capaz de admitir, ao menos para si mesmo, que talvez Mitch tivesse razão. Nos últimos dois anos ele andava mais fechado do que de costume. E ele nem tinha certeza do porquê. Foi algo que aumentou pouco a pouco, puxando-o para longe do mundo. Ele simplesmente virara as costas para quase tudo.

Droga, ele não visitava nenhum de seus irmãos havia dois anos. Nem sequer falava com eles ao telefone, deu-se conta subitamente. Trabalhar no jogo com Nathan fora a única atividade social que Tanner conseguia estabelecer ultimamente.

Mas a escolha fora sua, não é mesmo?

- E esta foi a solução que encontrou?

- Pareceu uma boa ideia na época.

Luzes se acenderam na fazenda. Pequenas luzes brancas cintilantes, enfileiradas entre os postes e os galhos das árvores que separavam a fazenda de sua casa. Tanner perguntou-se se aquilo sempre estivera ali. Como nunca tinha percebido?

O que mais ele não tinha percebido?

- Tanner, não seja tão duro com Ivy.

Ele riu e esfregou os olhos, tentando aliviar a dor que se acumulava por trás deles.

- Por que não?

- Essa coisa toda foi ideia minha, afinal - disse Mitchell. - tente ver isso a partir da perspectiva de Ivy. Você estava ameaçando a casa dela, o sustento dela. O nome King é muito poderoso na Califórnia. Ivy sabia que, caso você quisesse, poderia se tornar um grande problema para ela e para o vale. A vida dela estava em jogo.

- Sim, eu acho que... - Ele se voltou, puxou uma cadeira da cozinha e sentou-se. Em seguida, passou um dedo sobre a cobertura do bolo e trouxe-o à boca. Delicioso, é claro.

- Além disso, o que ela realmente fez de tão terrível? - perguntou Mitchell. - Ela o despertou. Apresentou-lhe aos seus vizinhos. Mostrou-lhe como viver. Mas ela tinha de mentir para fazer tudo isso. Se você soubesse o que ela pretendia, você nunca teria aceitado, portanto, dê um desconto para ela.

Ela fizera mesmo tudo aquilo. E mais, pensou Tanner. Mas não o disse em voz alta. Havia algumas coisas que ele não admitiria nem mesmo para o melhor amigo. Coisas como, por exemplo, o que ele estava sentindo por Ivy. Que os seus sonhos estavam cheios dela. Que seu corpo ansiava por ela. Que desde que ela fora embora, ele sentiu como se o seu coração tivesse sido arrancado de dentro de seu peito.

- Ainda quer me despedir?

- Não - disse Tanner e se recostou na cadeira, esticando as pernas à sua frente. - Mas se eu o encontrar pessoalmente nas próximas duas semanas, eu vou lhe dar um chute no traseiro.

- Entendido. E obrigado pelo aviso.

Ao desligar, Tanner percebeu que, apesar de Mitchell tê-lo decepcionado, aquela relação era segura. Ele não abriria mão de uma amizade de tantos anos mesmo que Mitch tivesse participado daquela mentira.

Então, por que ele também não poderia esquecer o que Ivy fizera?

Porque, disse para si mesmo, Ivy o traíra em um nível muito mais profundo.

Ela despertara nele algo que ninguém jamais conseguira despertar.

Ela dissera que o amava.

E essa mentira ele não poderia perdoar.









L(*OεV*)E(๑♡∀♡๑)( ˘ ³˘)♥٩(๛ ˘ ³˘)۶♥

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