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12 de março 

            Michael tinha-me obrigado a ir com ele ao centro comercial com o intuito de comprar uma prenda a Lillian que, daí a dois dias, faria dezoito anos. Sair com Michael era sempre uma animação, sendo que o rapaz, agora loiro, nunca se mantinha calado nem por um segundo. Variados assuntos fugiam dos seus lábios e eu, ouvindo-o atentamente, ria-me, feliz por ter um melhor amigo assim. Sabia que o seu pretexto para me ter arrastado até aqui não era somente o de arranjar um presente que se adequasse à personalidade esfuziante da sua namorada; Michael queria passar mais tempo comigo, pôr a conversa em dia e divertir-se, como nos bons velhos tempos.

            – E sabes o que eu disse? – o rapaz gesticulava dramaticamente, tentando descrever todos os pormenores da situação. – Eu olhei-o bem nos olhos e disse: "Se tu não me deres já essa fatia de pizza, eu arranco-te os tomates, embrulho-os numa caixa e envio-os à tua mãezinha". O tipo cagou-se de medo!

            – É realmente interessante. – murmurei, balançando levemente a cabeça. Quando Michael soube que a minha professora de inglês tinha adoecido e que eu não iria ter a segunda aula da manhã, praticamente me arrastou para este centro comercial quase vazio. Ele baldara-se às aulas, contudo, não parecia minimamente ralado com isso.

            – Pois é, intimidei-o com o meu grande poder persuasivo. – Michael concordou, parando de caminhar. O seu olhar encontrava-se agora fixo na montra da loja à nossa frente e pude ver admiração passar-lhe pelo rosto. – As raparigas gostam de peluches, certo?

            – Não sei se será o mais adequado... – comentei, fitando o grande urso de peluche exposto. – São dezoito anos, Michael, não cinco.

            – Pensava que comprar presentes era mais fácil. – ele bufou, virando costas à loja de brinquedos. – Eu ofereci-te um porta-chaves do Winnie The Pooh no natal e tu não te queixaste. Eu sei que a Lillian é minha namorada e isso tudo mas... será mesmo necessário oferecer-lhe uma coisa especial?

            – Não a queres ver feliz? – Michael assentiu, relutante. – Então nesse caso sim, é necessário.

            Com um suspiro, o rapaz deu meia volta e dirigiu-se até às escadas rolantes, esperando por mim antes de subir os degraus. Assim que o alcancei, subimos em silêncio, observando as variadas lojas que nos rodeavam. Na verdade, durante todas as nossas pausas de silêncio, eu só conseguia pensar no que estaria Luke a fazer. Provavelmente encontrar-se-ia sozinho, no seu prédio, à espera que a hora da terceira aula chegasse para que pudesse fazer calmamente o seu percurso até ao liceu. Era estranho imaginá-lo assim, tão só e abandonado no mundo, enquanto eu, aqui a deambular pelo centro comercial, estava tão bem acompanhada. Tinha vontade de sair a correr pela rua e trazê-lo connosco. Talvez o rapaz de olhos azuis se pudesse divertir um pouco e até melhorar a sua relação com Michael.

            – Sophie? – a voz grave do meu melhor amigo acordou-me do transe em que me encontrava. Ele riu-se quando eu quase tropecei, porém, segurou-me no braço de modo a evitar que caísse. – Estavas a pensar no quê, sua distraída?

            – Nada importante. – respondi, recompondo-me do susto. Quando Michael retomou a caminhada, segui-o, mordendo furiosamente o lábio. – Tu nunca te sentiste sozinho?

            – Eu sabia! – Michael exclamou. Ele virou a cabeça para trás e encarou-me com um ar vitorioso, entrando numa loja de acessórios femininos. – Estavas a pensar no Luke.

            – És tão irritante. – revirei os olhos, continuando à espera da resposta à minha pergunta.

            – Com todo o gosto. – fez uma vénia, soltando um adorável riso. Quando voltou a adotar uma postura mais séria, pareceu refletir um pouco. – Não, nunca me sinto sozinho. Tenho-te a ti, tenho a Lillian, tenho os videojogos e tenho pizza. Não me posso queixar. – afirmou convictamente. – Mas porquê, Sophie? Tu sentes-te sozinha?

Naive ಌ l.hOnde histórias criam vida. Descubra agora