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25 de março 

            Foi em silêncio que eu e Luke entrámos no elevador do seu prédio. Na rua as nuvens cobriam o céu escuro, tornando o ambiente mais sombrio e pesado, no entanto, existia algo de confortável nessa envolvência tão suave e noturna. Tínhamos caminhado até ao prédio verde menta debaixo de uma chuva quase torrencial e, portanto, os nossos corpos encontravam-se molhados, gelados, arrepiados e encolhidos; as nossas roupas, tão encharcadas e frias, teimavam em descolar das nossas peles e os nossos queixos tremiam, no entanto, tanto eu como Luke sorriamos um para o outro, como se aquele fosse só um pormenor insignificante. O que importava realmente era a companhia que fazíamos um ao outro, e isso não superava uma chuvinha inofensiva. Como já se tornara habitual, eu dirigia-me todas as terças-feiras até à Academia de Música, esperava que os ensaios do loiro terminassem e acompanhava-o até sua casa, para depois darmos início a mais uma sessão de explicações. Durante as duas semanas que se passaram, nada tinha realmente mudado, só os testes que realizáramos, que tinham o poder de decidir o nosso sucesso na vida académica.

            – Porque é que és tão lento? – amaldiçoou Luke, batendo com os punhos nas paredes metalizadas do elevador que nos transportava. Do seu queixo caiam gotas de água, tão frígidas e cristalinas como a sua pele, que tão pálida se encontrava. – Vais ficar doente por minha causa...

            – É a menor das minhas preocupações, Luke. – sorri, enrolando o meu cabelo de modo a retirar o excesso de água. Depois de alguns segundos, acabámos finalmente por ouvir o tilintar que anunciava a chegada ao piso do rapaz e, consequentemente, vimos as portas a abrirem. Ambos corremos até à porta número oito, tentando não molhar a carpete vermelha que adornava todo o pavimento do edifício.

            Luke foi rápido a manusear as chaves, abrindo a porta de madeira num ápice. Ele correu até ao interior da sua habitação e desapareceu por momentos, deixando-me sozinha junto ao hall de entrada. Acabei por descalçar as minhas botas e, posteriormente, as minhas meias. Tinha perdido a conta ao número de poças que acabámos por pisar e, prova disso, eram os meus pés, tão frios e engelhados. Despi o meu casaco e mantive-o suspenso nos meus braços, cautelosa para não sujar nada.

            – Sophie! – ouvi o meu nome ser proferido pela voz rouca de Luke e dei um passo em frente, tentando averiguar se o rapaz se encontrava em apuros ou se somente precisava da minha ajuda para algo. Ele apareceu-me à frente minutos depois, já quase totalmente seco e com uma nova roupa no corpo. Ele estendeu-me a toalha que tinha na mão e assim que eu peguei nela, vi os seus olhos fixos no casaco que eu suportava. Ele voltou a esticar os braços e estremeci por instantes, chocada com a proximidade dos nossos corpos. Luke não parecia afetado, porém, era visível a rigidez nos seus músculos e percebi que ele estava a ser muito cauteloso para não me tocar. Por fim, entreguei-lhe o meu casaco ensopado e limpei-me com a toalha, que continha um agradável aroma a flores. – Tens de vestir roupas secas. – o rapaz murmurou, recuando alguns passos para trás.

            Fiquei a olhar para ele fixamente, sem saber o que dizer. Não lhe queria dar trabalho e, muito menos, destabilizar a nossa rotina. Respirei fundo e baixei o rosto, fitando os meus pés roxos. Quase não sentia as mãos e era difícil mexê-las devido às minhas articulações dormentes. Era certo que precisava de me aquecer, porém, sentia-me ligeiramente desconfortável com o facto de estar sozinha com Luke. Sabia que ele não me iria deixar ficar mal, contudo, também sabia que o rapaz não tinha experiência a lidar com estas situações e provavelmente sentir-se-ia tão ou mais embaraçado que eu.

            – Eu vou arranjar-te umas roupas, não te preocupes. – ele proferiu, tentando mostrar um sorriso confiante. – Anda comigo, Soph.

Naive ಌ l.hOnde histórias criam vida. Descubra agora