16 de julho
Naquela manhã de sábado, uma semana depois de Ashton me ter convencido a sair de casa às escondidas em plena madrugada, a minha cabeça parecia estar a explodir. Deixara de pensar tão incessantemente em Luke, ou até mesmo na história avassaladora que nos fez chegar ao ponto de rutura, mas naquele sábado especialmente, todas as minhas emoções se viraram na sua direção, fazendo-me sofrer e conter a angústia e os remorsos que sentia a respeito de mim mesma. Sentia-me egoísta e não merecedora da vida que escolheram para mim e, constantemente, pensava que preferia dar um pouco da minha estabilidade a Luke ou a alguém como ele, que pudesse precisar de um rumo a seguir ou de um propósito eminente e durador. Ashton era esse propósito, mesmo que no fim de contas a nossa relação não passasse de uma farsa. Vim-me a aperceber disto no momento em que entrámos naquele carro, na noite de há uma semana atrás. Funcionávamos às mil maravilhas como amigos, disso não restavam dúvidas, mas, no momento em que passámos a ser namorados, os laços que nos uniam acabaram por desvanecer. Não passávamos de uma estranha amostra dos tempos em que eu balançava entre Ashton e Luke; nessa altura o perigo da traição, a adrenalina de estar perante um rapaz mais velho e mais intimidante, pareciam ser fortes condicionantes à atração, e na verdade não houve nunca ninguém que me deixasse tão confusa como Ashton, mas agora, no meio da monotonia, toda essa euforia parecia ter sido substituída por uma demoníaca angústia. E a verdade é que Ashton parecia diferente. Já não tinha oscilações de humor, ao invés, andava sempre bem-disposto e exageradamente afetuoso, o que me sufocava por vezes. Tinha saudades da imprevisibilidade a que ele me habituou, ou talvez estivesse tão iludida pelo que sentia por ambos que me esqueci de o conhecer verdadeiramente.
Passei grande parte da manhã a ajudar a minha mãe na preparação do almoço. Ela e o meu pai tinham convidado alguns amigos do trabalho para almoçar e por isso viam-se atarefados com tarefas domésticas, deixando para trás o seu foco de atenção em mim. Eles ainda desconheciam o facto de eu namorar, ainda para mais com um rapaz mais velho, e, honestamente, eu não fazia intenções de lhes contar, pelo menos para já. Se eles viessem a descobrir antes, então teria aquela conversa com eles, mas por enquanto, tentava encobrir todos os indícios que os pudessem levar a desconfiar. Eu não tinha medo, nem nada do género, até porque já tinha dezoito anos e era livre de fazer o que quisesse, mas no fundo, sabia que eles iam desaprovar.
No fim do almoço, já abstraída da conversa desinteressante que os meus pais alegremente travavam com o casal que haviam convidado, levantei-me em silêncio e dirigi-me ao meu quarto, sabendo que ninguém daria pela minha falta. Sentia uma espécie de dor no peito, como se me estivesse a esquecer de alguma coisa muito importante e a minha subconsciência me tentasse relembrar. Sentei-me na cama, com os pés de fora a balouçar, e suspirei profundamente, deixando a minha cabeça repousar sobre uma das almofadas aí jazidas. Conseguia ouvir o som da chuva lá fora, na rua, e as árvores, que se moviam consoante o vento. Porém, no meio desses barulhos aconchegantes e naturais, chegou-me aos ouvidos o toque do meu telemóvel, que anunciava mensagens.
Não precisei de me levantar para pegar nele, apenas esticar o braço e semicerrar os olhos na direção do ecrã. Três mensagens por abrir apareciam nas notificações, com o nome Ashton a denunciar quem as tinha enviado. Não me apetecia falar com ele, apenas ficar ali a descansar, a ouvir a chuva e a pensar acerca de tudo o que me rodeia. Não me apetecia ouvir a sua voz e dizer-lhe que me doía a cabeça. Não me apetecia, sobretudo, ter de lhe mentir ao dizer-lhe que tinha muitas saudades dele ou que o amava muito. Não me apetecia fazer nada dessas coisas, apenas ficar ali, deitada, a fitar o teto. No entanto, antes mesmo de voltar a pousar o telemóvel, reparei que havia outra notificação.
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Naive ಌ l.h
Fiksi PenggemarSophie considera-se capaz de ajudar um rapaz intocável, porém, ela é ingénua e sofrerá as consequências das suas escolhas. Copyright © 2015, All Rights Reserved // tulipxs (16/06/2015)