Capítulo 36 - Oi, Pai

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Assim que Christopher estacionou o carro, em uma esquina de um cruzamento do bairro deserto, Alicia segurou os braços de Yukari que já pendiam em sua direção, prontos para uma comovente despedida, e a olhou com firmeza: - Sem adeus – a repreendeu, não querendo aceitar que poderiam estar se vendo pela última vez. Se virou para Christopher e Emmanuelle, sabendo que eram os únicos estáveis no momento para seguir com aquilo: - Se atenham ao plano. Não saiam dele. – E saiu do carro, ignorando os lamentos da amiga.

Enquanto o carro era manobrado, Alicia encarou Yukari, que espalmava as mãos no vidro da janela com o semblante contraído de angústia. Ela havia tido as Visões e pressentimentos que haviam levado Alicia até aquele momento, ela havia dito que a melhor opção era Alicia ir até a base de Dam sozinha, para resgatar os amigos e convencê-lo a mudar; sua amiga achava que estava mandando-a para morte e Alicia não teve muito o que dizer para refutar aquilo, não havia nada que pudesse ter dito para acalmá-la e garantir que sairia de lá viva.

Tiveram quase três horas de discussão dentro do carro, tentando decidir como ela poderia fazer aquilo, mas tudo poderia ser resumido em uma única palavra: suicídio. E depois de tentar enxergar aquilo sob vários ângulos e imaginar diversas possibilidades, Alicia se conformou, sabendo que, após a descida do carro, pouco estaria sob seu controle.

Teve que convencer seus amigos que o plano que havia surgido repentinamente em sua mente era o 'melhor' a ser feito, quando nem ela mesma estava convencida daquilo. A última meia hora dentro daquele carro foi corrida em um silêncio ensurdecedor, uma resignação dolorosa de que não havia nada que seus amigos pudessem fazer mais por ela.

A ideia de morrer nunca lhe foi algo casual ou que encarava sem medo. Quem em sã consciência não teme a morte? Talvez alguém experiente, que já tenha vivido, amado, visto e feito muitas coisas por esse mundo. Mas uma garota de dezoito anos, que finalmente descobriu que pode e deve decidir o que fazer da própria vida e que pela primeira vez se viu rodeada de amigos verdadeiros e provou um pouco do que era amor? Não. Alicia não queria morrer. Alicia queria pegar seus amigos e voltar para a 'sua casa' – como havia dito para Evan. Queria voltar para os braços dele e pedir desculpas por não ter se despedido, pedir desculpas por ter feito ele sofrer com a sua partida repentina. E para isso tudo, precisava estar viva.

Não que o fato de querer se manter viva fosse de fato mantê-la viva.

E isso começou a fazer com que não parasse de pensar no que era a 'tal coisa' que poderia fazer com aquela sua pequena chance de sucesso fosse o resultado final daquela incursão. Seria algo que Dam veria nela? Seria algo que de alguma forma comoveria seu pai? Ou talvez alguma frase seria mal interpretada e acabaria virando o jogo contra ela? Talvez alguma atitude ou reação que ele não gostasse?

Qual era o ponto-chave que detinha o poder de mudar completamente a história de suas vidas, daquela guerra?

Aquilo estava matando Alicia, pois duvidava que na presença do seu pai, sabendo tudo o que estaria em risco e que dependeria somente dela, conseguiria ficar raciocinando friamente, tentando pensar em como falar, se portar ou agir para que tudo desse certo.

Esfregou os olhos, tentando afastar o turbilhão de receios que invadia sua mente e se forçou a andar em direção a base, a colocar um pé na frente do outro, mesmo quando a imagem de Evan resolveu invadir seus pensamentos, atormentando-a ainda mais. Sabia que havia grandes chances de aquilo tudo dar errado, que poderia morrer ou até mesmo ser presa por Dam e viver um verdadeiro inferno, mas a ideia que mais a agoniava era a de ficar longe de Evan. Não queria perder o que havia entre eles, justamente quando haviam se aceitado e descoberto o quanto poderia ser indescritível estarem juntos, quando mal haviam começado e ainda tinham muito esperando por eles.

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