Capítulo 56 - Bora pra casa, cara

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Um visor, que fazia com que apertasse os olhos devido a luminosidade, indicava: 05:47. Sob uma névoa de sono e exaustão que não deixava que pensasse com clareza, nem muito menos se movesse, Alicia divagava entre a realidade e os sonhos, tentando ignorar a secura na garganta e não se mexer demais, porque sua bexiga parecia prestes a explodir. Os pensamentos rodopiavam em sua mente, sem controle ou sentido algum, até que seu estômago entrou no coro de órgãos revoltados, que exigiam que se levantasse e fizesse algo por eles.

Com o despertar forçado, Alicia reparou melhor no lugar a sua volta, notando que suas memórias finais eram nebulosas; haviam fugido de taxi, entrado em um prédio onde haviam decidido se esconder e era só até aquele ponto que conseguia alcançar. Assim que percebeu a lacuna em branco, virou-se exasperada a procura de Evan e, ao se mexer sob os lençóis, praguejou baixinho pela dor, pois, como uma árvore de natal que é ligada na tomada, todo seu corpo pareceu se iluminar revelando pontos de agonia, que pulsavam em dor latejante ou se retesavam com músculos fatigados em demasia.

Aquilo só fez com que redobrasse sua atenção em Evan, que também havia sido muito ferido. Ele estava deitado ao seu lado, mas afastado e encolhido no canto da cama. Descontando a estranheza daquilo, ele parecia bem. E, considerando que estava nua e coberta de curativos e ataduras, sabia que ele havia cuidado de seus ferimentos e acreditou que se algo sério tivesse acontecido a ele, também estaria da mesma forma e não vestido com as mesmas roupas de antes como estava.

Com a preocupação com o bem-estar dele sanada, voltou a prestar atenção em seu próprio corpo. Nunca havia sido baleada, nem quebrado nada em seu corpo, mas havia resolvido começar em grande estilo: estava parecendo um maldito queijo suíço atropelado por uma Emmanuelle furiosa. Sentindo seu ombro completamente rígido e com medo de realmente encontrar buracos em seu corpo, Alicia sentou-se na cama, disposta a fazer um 'inventário' completo; removeu com cuidado as ataduras e curativos e, quando não viu sangue sendo jorrado para todos os lados, ficou aliviada. Tateou receosa os lugares onde havia sido baleada: no peito, do tiro que levou quando tentava tirar Evan do prédio onde havia sido mantido preso, e no ombro, de quando a acertaram quando tentavam fugir juntos dos Discípulos de Dam. Nos lugares apalpados, somente encontrou a pele inchada e um pouco dolorida, que indicava que seu corpo estava se curando, graças aos deuses.

Voltou a observar Evan. Eles nunca haviam dormido sem que acordassem um agarrado ao outro, sendo atraídos um ao outro como imãs, e lá estava ele na beirada da cama, como se tivesse procurado o limite dela para se deitar. Aquela visão fazia com que seu peito se apertasse em agonia, pois, por mais banal que parecesse aos olhos de outros, aos seus parecia que ele queria ficar o mais longe possível dela e estava conseguindo. Coisa em que havia sempre falhado miseravelmente.

Com a sensação de que as coisas haviam mudado diante de seus olhos e de que ainda não haviam chegado ao final de todos os acontecimentos, Alicia deixou de analisar aquilo mais de perto, com receio das respostas que poderia conseguir. Checando a hora novamente, se perguntou se deveriam continuar deitados, já que estiveram sendo perseguidos e não deveriam ficar parados em um lugar muito tempo; mas, bastou olhar mais uma vez para Evan, que percebeu ainda dormir profundamente, para resolver que deixaria ele descansar 'só mais um pouquinho'.

Sabendo que aquilo só se aplicaria a ele, pois não conseguiria voltar a dormir sem antes ouvir as queixas de seu corpo, enrolou o lençol em volta do corpo e se arrastou até o banheiro de forma furtiva, sem fazer barulho e nem acender as luzes, para não perturbar Evan. Quando terminou de aliviar suas necessidades, foi até a pia e acabou pisando em algo pontiagudo, que fez com que imediatamente saltasse para trás. Com a pouca claridade do amanhecer que despontava, Alicia praguejou inúmeras vezes em busca do maldito interruptor e acendeu a luz do cômodo, enquanto fechava a porta, para ver em que raios havia pisado; pegou do chão um pedaço de algo espelhado e ergueu os olhos para a bancada a sua frente, vendo que o espelho sobre a pia havia sido destruído. De sua moldura apenas pendiam alguns pedaços pontiagudos que não caíram e foi na lixeira que encontrou seu resto. Mas que raios...

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