Capítulo 10 - Inferno

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Estava deitada no chão, encarando o teto, quando começou a reparar na cela. Daya havia dito que aquele lugar havia sido construído para prendê-la... As pequenas marcas na parede não eram somente marcas, eram Marcas - percebeu conforme se aproximou. Passou os dedos por cada uma, tão pequenas que não passavam de um centímetro quadrado, mas ainda assim cobriam todas as paredes, invocando um poder Divino além de sua compreensão. Tentou então forçar sua mente a se lembrar do que Evan havia ensinado: havia a marca de Anulação, que era uma espécie de camuflagem; a marca da Verdade, que era como a letra x e revelava se a pessoa estava mentindo ou não; a marca da Devoção...

Olhou para a palma da mão cortada sem saber porque exatamente havia feito aquilo. Lembrou-se de como Evan se ajoelhou a sua frente e prometeu protege-la mesmo que custasse a sua vida... E mesmo assim hav-

- Bom dia - Pulou do chão ao ouvir Clark. O homem havia se aproximado e estava encostado na grade a observando. - Você parece como alguém que andou pelo inferno... - E como não lhe respondeu nada, continuou: - Você tem tanta sorte de não ter sido eu aí dentro... Você não iria somente parecer, iriam olhar para você e ter certeza - Ele sorriu.

E apesar do filho da deusa ter lhe dado o "conselho" de falar quando pedissem, se manteve calada, pois havia algo em Clark que fazia com quisesse ficar o mais longe possível. O homem tinha todo um rosto normal, com pele clara e olhos e cabelos castanhos, mas havia algo no modo como seu sorriso se curvava e em como seus olhos pareciam brilhar diferente que a arrepiava completamente.

- Daya disse que eu não podia entrar na cela, mas não disse nada quanto a fazer o que eu quisesse do lado de fora.

Sabendo que algo ruim aconteceria, se levantou e se afastou da grade, conforme Clark enfiava as unhas no próprio pulso, sem tirar do rosto o sorriso, e deixava seu sangue pingar no chão: - Essa cela só responde ao sangue de algumas pessoas... Parece que eu sou uma delas.

Alicia começou a sentir o chão vibrar aos seus pés e rapidamente sua mente a lembrou do terremoto, fazendo com que se apoiasse nas paredes e levasse um susto ao notar como estavam quentes. Repentinamente uma parede de metal deslizou em frente a grade, selando-a dentro do cômodo, e seu impulso foi de correr até lá, mas lembrou-se que somente ganharia novas queimaduras. Seu desespero começou verdadeiramente quando notou que a temperatura parecia subir a cada segundo e percebeu que não havia para onde fugir.

Logo o suor embaçava sua vista, seu corpo estava mole demais e parecia que estava sendo girada, nada permanecia no mesmo lugar a sua volta. Quando caiu de joelhos no chão, viu o Fogo subir pelas paredes enquanto parecia sentir que o chão estava sugando-a para o seu interior. Morreria. Morreria alí sozinha e Evan nem saberia.

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Seria um pesadelo? Pois um pesadelo explicaria tudo. Explicaria ter deixado Evan para trás na UPA, ter sido descoberta no fim do mundo, ter lutado, falhado e estar naquele lugar. Em chamas. Sentindo as mãos dele em seu pescoço e a falta de ar que isso causava. Os homens de jaleco apontando agulhas em sua direção. Dam rindo de seu desespero. E mais fogo, mais sangue, mais fogo, mais sangue.

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Estava escuro de novo.

Provavelmente havia desmaiado. Pensou por um segundo que poderia estar morta, mas mortos supostamente não deveriam sentir dor, então estava bem viva. Havia sobrevivido. E sentia uma sede que era absurda. Privá-la de água estava sendo a tortura mais eficaz, mais até do que as "brincadeiras" de Clark.

Se não se mexesse talvez conseguisse aguentar.

Tentou imaginar o que estavam fazendo com Emmanuelle, Christopher e Yukari e sentiu seu estômago se revirar. Não conseguia aceitar a ideia de que eles pudessem estar sofrendo, ainda mais sendo tudo sua culpa. Rezou para que estivesse poupando eles e descontando toda sua raiva somente nela.

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