Brincando Com Fogo

Capítulo 38 - Lutar

                Todas aquelas cores lhe lembravam Evan – pensava Alicia, olhando para o teto. Havia uma profusão de cores que se pudessem se reorganizar e tomar forma, resultaria em Evan. Sentia falta dele. Sabia que, se ele estivesse alí, estaria fazendo algum discurso sobre como era irresponsável e, ainda assim, queria que estivesse. O calor, as cores e o cheiro lembravam ele, era lindo de se ver e convidativo a ponto de ser irresistível; ergueu a mão para o alto, tentando tocar o que via, mas acabou notando a pele do seu braço cortada.

E notando o corte, notou a dor no local. E notando aquele ponto específico, passou a perceber que todo seu corpo doía. E notando que algo estava errado com seu corpo, notou o zumbido incessante em seus ouvidos. E notando a audição, percebeu que algo irritava seu olfato e fazia seus pulmões se contraírem.

"Levanta, Alicia!" – A Água se fez ouvir sobre o zunido.

Fumaça. Gritos de dor. Crepitar de chamas. A pintura que se mexia no teto se revelou chamas que já consumiam tudo vorazmente. Fogo. A casa havia explodido e ainda estava dentro dela.

Alicia foi assaltada por uma onda de adrenalina e sentou rapidamente, tonteando na mesma hora. Maldição. Com todos os seus instintos gritando para que escapasse daquele lugar, se apoiou com as mãos no chão, tendo que fazer um esforço enorme para se firmar e conseguir se erguer. Olhou para os lados, a procura de uma saída e tentando descobrir onde Dam e Jeremy estariam, mas tudo que viu foram alguns vultos caídos no chão em meio as chamas, não conseguindo identifica-los. Tudo estava sendo consumido pelo Fogo e a fumaça, que começava a ficar mais espessa, e as labaredas, que se erguiam por todos os lados, impediam que conseguisse enxergar pouco mais que um ou dois metros a sua frente.

Precisava achar Jeremy e sair dalí, mas não conseguia acha-lo e estava quase se desesperando, quando uma rajada de ar correu por seu corpo, indicando uma direção. Sendo guiada, seguiu de pé meio abaixada, instintivamente tentando se manter longe do fogo, tomando cuidado com o chão coberto de escombros e tentando não olhar para os corpos desfigurados que via pelo caminho. Quando notou uma área em meio as chamas que parecia não queimar, localizou dentro dela seu amigo caído no chão, mas protegido, e o alívio que sentiu foi tanto, que sentiu os olhos pinicarem com lágrimas. Obrigada – agradeceu a todos os elementais.

Só que apesar de não ter queimaduras graças à proteção do Fogo, assim como Jeremy, a explosão havia cobrado seu preço, pois as chamas não eram o único perigo: havia a pressão que a explosão havia causado sobre seu corpo, o fato de ser atingida por vários destroços e o impacto de ter sido arremessada no chão. Aquilo tudo explicava a dor generalizada que sentia ao se mexer para alcançar Jeremy e o fato de ter um ponto úmido especialmente dolorido na parte de trás da sua cabeça, de onde seus dedos haviam voltado sujos de sangue. E não podia se esquecer que estava portando o Fogo em plena atividade, isso exauria ainda mais seu corpo a cada segundo passado.

Você está quase lá – disse a si mesma para suportar a dor e o cansaço. Você está quase lá, está quase lá, está quase lá, está quase lá... – passou a repetir incessantemente, quando sem querer tropeçou em algo, afundando uma mão na carne deformada da perna de um Sombra ao tentar se apoiar, e seu estômago começou a se contrair em uma ânsia quase irrefreável.

Já estava quase tocando Jeremy, quando sentiu um aperto em seu tornozelo e sua perna foi puxada para trás, fazendo com que caísse para frente, dando de cara com o chão. Se virou de costas, imaginando que o Sombra que havia tocado tinha ficado consciente, mas acabou dando de cara com o rosto desfigurado de Dam. Parte de sua pele parecia se descolar e querer cair. Parte sangrava profusamente em carne viva. Parte estava enegrecida como carvão. – Eu deveria ter deixado você morrer com a sua mãe... Traidora... Ingrata... Você vai me pagar... – Suas palavras grunhidas carregavam um ódio imensurável e Alicia não foi capaz de se mexer, congelada. – Eu vou torturar e matar toda coisa viva nesse mundo que você já amou e depois vou matar você com as minhas próprias mãos! Eu prometo isso a você! – gritou alto em um fôlego só e passou uma mão pelo peito, fazendo reluzir uma Marca da Verdade juntamente com todo o sangue que cobria seu corpo arruinado.