Bia tinha tudo que queria, do bom e do melhor, mas não podia ligar para casa nem por os pés no quintal, era uma vida de luxo e simplicidade ao mesmo tempo.
Estava pensando nisso quando foi dormir, naquele dia.
Teve o sonho de novo, o sonho que tinha desde criança, que só contou para seu tio.
Estava numa sala com homens vestindo roupas de monge, o capuz cobria seus rostos.
Eles não tinham pés, flutuavam? Bia estava com mais três pessoas.
Lembrava que um deles dizia:
_ Você irá descer, e vocês três vão te proteger. Esse é um dever e um compromisso sagrado, a assembleia agradece por terem assumido essa grande responsabilidade.
A frase era estranha, mas era esse o sentido. As palavas nunca eram as mesmas, parecia que Bia estava traduzindo uma língua que não podia ser traduzida, e a cada hora entendia a mensagem um pouco diferente.
No sonho, era uma das quatro pessoas para quem os monges falavam, as vezes as quatro! Parecia ver a cena de longe.
As vezes sentia que era um dos monges.
" Eu preciso contar esse sonho para minha pequena irmã Citere, ela vai me ajudar, isso é importante, preciso me lembrar."
Suas servas não estavam no quarto, aquilo era inusitado, uma delas sempre guardava o seu sono, as outras estavam prontas para lhe servir.
Seu café da manhã estava posto, mas, primeiro foi em seu oratório fazer as orações do dia.
Estava nervosa, não sabia porque.
Não conseguia se concentrar.
Voltou e tomou seu café sem gosto, sem pensar no que fazia.
Botou seu biquine e foi para a piscina, mas Citere não estava por lá, outra coisa incomum, ela sempre chegava antes de Bia.
Parecia que a casa estava estranhamente vazia.
Foi assim por todo o dia, a biblioteca, a cozinha, a varanda, até mesmo os sons de pessoas no quintal que sempre ouvia pareciam ter desaparecido.
Sentia-se só, no mundo.
"Parece que o apocalipse Zumbi finalmente chegou..."
Sem mais o que fazer, decidiu não se preocupar.
Passou o dia matando o tempo, estava ficando cada vez mais nervosa, não entendia o motivo. Resolveu ir ler na biblioteca. Acabou pegando no sono.
Acordou com um barulho distante, olhou o relógio, eram seis horas da tarde.
Foi até a janela da frente, ouvia um cântico, e um choro. seis pessoas carregavam um caixão branco, e uma pequena multidão os seguia.
Eles entraram na casa pela porta da frente, não respondiam as perguntas de Bia, dirigiam a ela olhares acusadores.
Depositaram o caixão perto da piscina, foi quando finalmente Bia teve acesso a ele.
Estava tampado, eles tiraram a tampa, mas Bia não precisou que tirassem a tampa para saber quem era.
Citere.
Sua pequena irmã.
Bia se ajoelhou e chorou ao lado do seu corpo.
Não sabe por quanto tempo.
A pessoas foram embora aos poucos, finalmente apenas Bia ficou ao lado do caixão.
Ouviu passos atrás de si, quando se virou viu Henry.
Ele estava de pé e vestia uma roupa estranha. Tinha o rosto coberto por um véu.
_ Eu sou o Askaari Kaahari.
Bia lhe fez uma referência, conhecia o cargo do executor da Sociedade da Sacerdotisa, mas nunca o tinha visto vestido assim, com roupas tradicionais.
_ Durante os últimos meses, você tem decidido o destino de milhões de pessoas, mas agora o conselho julgou sua atuação e suas atitudes. Acatará a decisão dos juízes como temos acatado as suas?
_ Eu vi a importância do que fazemos Henry, perdão, Askari Kaahari, o que decidirem sobre mim eu vou aceitar.
_ Siga-me.
Ela o seguiu para fora da casa, a noite já tinha chegado.
Estava escuro, parecia que iria chover, o vento soprava forte.
Atrás da casa uma pequena floresta começava, eles entraram nela, por um caminho que Bia ainda não conhecia.
Andaram até um local onde o chão era úmido, várias pessoas acendiam velas em cima de pedras, e choravam.
Era um cemitério.
Pararam em frente a uma cova aberta, era um buraco no chão, grande, escuro, ao lado dele, suas quatro servas choravam desesperadamente, ajoelhadas, elas haviam rasgado suas roupas e choravam sobre a terra.
Bia já tinha ouvido sobre pessoas que choravam assim seus mortos, mas nunca tinha visto um sentimento tão forte. Apesar dela mesmo ter chorado horas sobre o corpo de Citere, o choro das quatro mulheres a impressionou.
_ Dê-me suas joias.
Ela as entregou, nem lembrava que estava usando. Ele pediu e uma das servas que choraram se levantou, e ficou com elas.
_ Dê-me suas roupas.
Bia tirou toda sua roupa, ele fez um sinal e duas servas saíram e depois voltaram com uma pira, que deixaram ao lado da cova.
A um sinal de Henry a quarta serva apanhou as roupas, jogou na pira e acendeu o fogo. Agora, a cova estava parcialmente iluminada. Bia percebeu ossos no fundo da cova, ela era grande, parecia um pequeno quarto com paredes de terra e ossos no fundo.
_ Vai aceitar a decisão do conselho?
_ Vou.
_ Nós a sentenciamos a morte. Será posta na cova e ela será lacrada. Viemos nus para a vida e assim devemos voltar. Neste mundo ficam nossas joias, que simbolizam nossas realizações. Elas são nosso presente para os irmãos e irmãs que tivemos. Qual o seu desejo para suas joias?
Bia estava sem ação, não adiantava tentar fugir, já tinha aprendido o quanto eles eram cruéis com quem fugia nesses últimos dias. Não sabia o que tinha feito de errado, será mesmo que estava sendo punido por ter posto um pé para fora da casa?
_ Dê uma parte a essas irmãs que me serviram tão bem enquanto eu era uma Juizá. Outra parte distribua entre instituições de caridade. A terceira parte entregue a minha mãe, para que ela tenha uma boa vida.
Henry acenou com a cabeça, as quatro servas ergueram Bia e, com cuidado, a baixaram pelos braços para dentro da cova.
_ Que a cova seja lacrada, o tumulo de seus ancestrais. Que ele fique lacrado até que a morte toque outro de seus amados.
A tumba foi lacrada e Bia se sentou no chão de terra úmido.
_ Meu Ori, porque me abandonou? Porque não escuto sua voz? Eu só sai da casa seguindo sua voz... Citere, minha Citere, porque você tinha de morrer?
Tanto trabalho para nada, pensou. Deveria ter deixado seu tio lhe dar um tiro na cabeça.
Em quanto tempo se morre de fome e sede?
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Ade Oba
General FictionSó Beatriz pode salvar uma criança sequestrada por um maniaco. Mas ela foi capturada por um Psicopata e vai contar com a sorte para tentar escapar. Enquanto isso, Hanna começa a treinar seus assassinos para que se tornem os melhores matadores que já...