Capítulo 23

843 58 3
                                    

MALUMA

Sinto como se estivesse prestes a explodir, o olhar sereno e encantador de Amanda me distrai do sinistro vazio lado escuro que tento prender dentro de minha mente há muito tempo. Lentamente como uma cobra a arrastar-se, sinto as lembranças retornarem. O ar parece entrar pesado em meus pulmões e o desespero começa a invadir-me.

_Você não precisa fazer isso – ouço sua voz e suas mãos em meu rosto, mas eu já não podia vê-la, não podia senti-la não quando as lembranças retornavam com tanta intensidade – Maluma... Maluma, respira!

Eu era um prisioneiro dentro de minha própria mente. E não podia impedir as palavras de serem ditas.

_Eu tinha oito anos quando ele voltou...- sussurrei quando a cena começou a desenrolar-se em minha cabeça.


Dezessete anos atrás.


Já era noite e fazia um tempo que ele não voltava para casa. Ele era o melhor amigo do meu pai, que já estava desaparecido há alguns anos. Minha mãe não havia chegado do trabalho ainda e eu estava cuidando da minha irmã pequena, Manuela. Lembro-me como suas mãos eram pequenas e como ela se escondeu em baixo da cama quando ouviu sua voz. A primeira coisa que eu vi nele foi seu rosto, manchado de sangue e suas mãos que não tinham mais alguns dedos.

_Olha só pra você, pequeno bastardinho – disse ele ao colocar um cigarro na boca – Verdadeiramente o filho de seu pai.

O cheiro podre fez minhas narinas contraírem-se e afastei-me do quarto com a esperança de que ele não chegasse a ver Manuela. Ele encontra-me no meio do caminho e me segura pelo cabelo, mas incrivelmente não estou com medo por mim, estava muito preocupado com Manuela. Desvio meus olhos de suas botas grandes manchadas de barro e encontro seus olhos, desejando que ele mantivesse seu foco em mim e não chegasse perto da minha irmã.

_Juan! – grita minha mãe vindo em minha direção.

Ele joga-me para longe e o vejo retirar seu cinto. Ele bate nela com aquela coisa e estou correndo em sua direção.

_Sua puta! Vadia! Você é uma mulher fodida sua prostituta! – grita ele em cada estocada –Você deu filhos a ele? Sua fodida!

O choro de Manuela faz-me parar no corredor. Estou dividido entre ir para ele e correr para mamãe. Fecho a porta do quarto tendo apenas o vislumbre da cara assustada da minha irmã antes de correr em direção à cozinha. Encontro-a encolhida como um gato assustado, ela está menor que uma pequena bola e não posso deixar de comparar sua altura com a minha, ela parecia menor que eu.

Mamãe olha-me e faz um sinal de silencio com as mãos. Não, mamãe! Vejo quando ele retorna com um chicote e vai em sua direção ignorando-me. As palavras cafetina e prostituta se misturam em minha mente conforme escuto o som do estralo do chicote marcar a pele de minha mãe.

_Juan – choraminga ela protegendo-se do chicote enquanto olhava para mim com lagrimas nos olhos – Pegue Manuela e saia da casa.

Não, mamãe não.

Ele está rindo quando olha para mim novamente. Seu cheiro é desprezível e quando ele tenta avançar para mim, mamãe salta sobre ele. Vejo quando o sangue começa a sair de seu nariz no exato momento em que ele marca seu punho em seu delicado rosto, ele retira uma faca da cintura e tropeço um passa para trás.

_Marlli – grita a voz de um homem. Viro para trás encontrando os olhos do meu pai. Ele está imponente com uma roupa preta que nunca havia visto na vida. Ele parte em direção ao homem afastando-o de minha mãe.

Livro 1 - Doce TempestadeOnde histórias criam vida. Descubra agora