Eu penso em apartamentos amarelados pela luz de abajures depois que a noite engole a cidade e o barulho dos carros diminui. Penso no seu abraço no meio desse momento quando a gente descobre que o barulho que o mundo faz é a poesia mais bonita que a gente já ouviu. Penso no seu abraço no meio do momento quando pensamos que antes tínhamos medo do escuro e agora a gente vive dentro dele.
Penso em me encher de livros de bolso sobre auto ajuda e me fotografar nas ruas limpas de algum lugar do Brasil, levando em mim a certeza que só obedeci o que me diziam "seja você mesma" descobrindo que quando diziam isso na verdade não era para me encorajar a ser quem eu realmente era e sim para me perturbar e não ter a liberdade de ser. Me imagino contando sobre um bocado de histórias e prosas por aí, sobre o mistério do triângulo das bermudas, e nos domingos solares vestir um short confortável e me sentir esquisita. Estar com você era uma viagem constante, imprevisível e emocionante, como se frequentemente a vida fosse um filme bonito vencedor de prêmios importantes de fotografia e trilha sonora.
Hoje penso em fazer desenhos brilhantes nas paredes onde o sol bate todo fim de tarde e lembro de todas as coisas bonitas que aprendi com você e que colorem os meus dias. Escrevo na mesma parede, num canto secreto para nunca esquecer: nenhum medo ou saudade vão escurecer os fechos de luz que apareceram no céu no mesmo dia que a gente se conheceu. Da minha parte, um amor eterno e a mesma paz que carregamos no peito em nossos primeiros dias nessa cidade verde que pra sempre terá a mesma cor, ainda que você já não seja a mesma e não esteja mais aqui. Eu poderia nunca mais me permitir ficar triste depois que de ouvir você dizer que não me queria mais na sua vida. Eu poderia chorar nos longos e incessantes meses e escrever os textos mais tristes e mais bonitos que já fiz na vida, mas minha cabeça viaja demais, my dear. Eu não fiquei, eu me toquei rápido demais. Eu comprei presentes, eu pegava metrôs lotados para atravessar a cidade e te deixar um bilhete cheio de amor, eu te esperei todos os meses acreditando sempre que na hora seguinte você finalmente entenderia que era eu O Grande Amor da Sua Vidinha e me levaria pra Roma num barquinho roubado, eu que esperei tanto pelo momento de só segurar a sua mão sem culpa nem medo. Mas tudo que existia do seu lado era uma mania sem sentido e um tanto cansativa de pensar que a porra do mundo girava ao redor dos meus terríveis atos. Sinto te dizer agora, talvez um pouco tarde, que as coisas não são bem assim. Ainda que seu umbigo seja o meu umbigo favorito no mundo inteiro, eu não sei girar em volta dele, ainda que talvez um dia eu quisesse, vai saber. Eu que a vida inteira construí castelinhos de sustentação, eu que tomei Biotônico Fontoura pra crescer saudável e decidir que nada me deixaria menor, ninguém remaria contra minhas decisões de ser sempre maior até que eu abraçasse o mundo. Era isso que eu queria ao ser grande, abraçar o mundo com mãos de mãe, cheia de hidratante cheiroso. E você e sua mania de achar lindo o fato de eu abraçar o mundo, mas sentir uma vontade maníaca e secreta de cortar meus braços, me impedindo de esticar a mão pra apertar a tua e dizer, finalmente, estamos sós.
Hoje em dia eu já não tenho medo das minhas estranhezas, e resolvi vesti-las e desfilar no meio da rua com todas elas balançando e fazendo o maior barulho, pra você me ver e descobrir, pra minha família me ver, pro mundo me enxergar e tentar entender. Eu me sinto absurdamente triste quando olho bem no meio do olho dos moradores de rua que ficam na avenida, e penso por longos minutos em como seria o mundo se eu resolvesse roubar todo o dinheiro de um banco e mudar a vida daquelas pessoas. O mundo seria o mesmo, mas o meu mundo seria um pouco mais feliz. Eu sinto uma tristeza contínua, interrompida por momentos de euforia, quando algo muito grandioso está prestes a acontecer. Dar um passo à frente, encerrar um ciclo, começar uma nova fase, me enche sempre de um desespero porque eu tenho muito apego ao que estou vivendo sempre, e meu estomago dá giros intermináveis e minha cabeça lateja e toda vez que algo diferente acontece nos meus dias, é o fim do mundo. Toda semana eu enfrento o apocalipse e sigo sorrindo. Se eu começar a viver diferente, quanto isso vai me custar? Nessa minha nova vida que começa na próxima segunda-feira, a dor vai ser ainda maior? Eu me sinto esmagada pelos dias quando raciocino que estou presa às responsabilidades, e fico dolorosamente dividida entre a sanidade de jogar tudo pro alto e a loucura de continuar vivendo uma vida quadradinha, num carrossel sem graça e sem música de fundo. Mas fico completamente feliz quando penso que te encontrei e quando me encho de esperança de que depois que te apresentar os bastidores da minha mente confusa, você pode não ficar. Contra todos que já me deixaram porque não souberam lidar com tanto amor, você vai ficar? e vai fazer a maior festa com todo esse amor que foi muitas vezes confundido com loucura?
Aqui está então outra confissão medrosa: meu amor pelo mundo é tanto que eu quase explodo. Quase explodo nos segundos em que alguém sorri com um carinho que eu não estou acostumada e me acostumar seria perder essa alegria. Talvez por isso eu feche a cara esperando alguém me sorrir. Irônico. Quase me desmonto inteira quando entro em contato com uma gentileza que está cada vez mais ausente no mundo. Quando algo muito bonito acontece, eu quero correr pra casa e chorar chorar chorar e não é dor nem tristeza, é amor. Não existe um único agente receptivo, não existe uma razão científica, eu nasci com a cabeça na lua e uma infinita sensação de que a vida é poesia todos os dias. E assim chegamos ao resultado final: sentir demais é tanto que me pego sempre sozinha com medo de não ser compreendida. Se eu te contasse tudo isso, você não entenderia, você ia rir na minha cara e ia pro banheiro tomar um banho e deixar a água levar embora todos esses meus segredos mais íntimos que pra mim valem o mundo e pra você parecem mero exagero. E eu volto a ter onze anos quando fico sozinha no meio da sala da minha casa e juro pra mim: foi a última vez que eu assumi minha loucura pra alguém.
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Quimeras Abortadas
RandomDevaneios, ilusões, pseudo-conclusões, questionamentos. Sou o que escrevo.