Eu cresci por volta de 12 anos de idade, passei a observar melhor tudo em volta e realmente reparar que os contos dos quais eu ouvia falar nos filmes da disney eram de fato uma grande mentira inventada pra que pudéssemos crer, mesmo que crer por enquanto, enquanto éramos crianças, enquanto tínhamos quase que o dever de crer, era isso, né? Foi assim com bicho papão pra nos assustar, com o conto de fadas pra nos impor padrões, com o papai noel pra inventar um mundo bonito e vermelho, onde crianças boas ganhavam presentes, aos 12 eu já lia de tudo e vivia um drama dolorido dentro de casa, mas não era drama inventado infelizmente, acontecia ali na frente do meu nariz e eu tinha que crescer, foi então que sem aviso prévio ou qualquer preparação cresci sem querer.
Eu vi um mundo cruel de boca escancarada engolindo meu irmão e minha família, eu vi o vício querendo separar pessoas que se amavam, eu vi brigas em alto e bom som, eu me escondi embaixo da cama e quando saía de lá tinha que tomar um bom banho pra limpar a urina de medo nas roupas pequenas ainda, eu tive medo dos meus pais acordarem de madrugada quando eu rezava um pouco mais alto que o normal na esperança de ser ouvida por alguém que pudesse me ajudar, eu conheci a insônia, eu conheci as mil faces de ser adulto antes de ser adulta, tropecei da infância pra fase adulta num susto que hoje eu procuro usar de maneira positiva, eu me lembro de ser óbvio para os meus pais que eu crescesse com problemas na escola, eu quis contrariar o óbvio e fazê-los ver que era possível, tirei o máximo de nota azul possível. Passei pela adolescência sem muito medo do que viria porque me tornei forte, eu segurei em tudo que me foi possível porque algo me dizia que quando tudo melhorasse eu veria coisas que seriam impossíveis serem vistas se eu não fosse quem os fatos me tornaram. Cresci, sem querer.
Aos 18 anos sentei com meus pais, expus que estava reclusa porque eu amava uma mulher e não queria de forma alguma decepcionar meus pais, mas havia chegado a hora de contar a verdade. No início tudo virou de ponta cabeça mas o tempo fez-se necessário, ajustou tudo em detalhes, meus pais me viram trabalhar, chegar cansada, pedir colo, chorar, falar sobre a primeira moça pela qual me apaixonei, pela dor de descobrir que aquela não seria a moça que eu casaria (porque a gente sempre acha que é) endureci no amor mais do que na vida, conheci a Victoria, nova, com todas os trejeitos que eu queria ter, com esperança nos olhos, com beleza nos fatos pequenos, com delicadeza de uma pessoa que não veio pra bagunçar mas pra ajeitar, pra se aninhar. Eu não sabia se estava preparada, e hoje sei que não estava, dei o fora mais feio possível, mas era ela, entende? Aquela história de era pra ser, e foi e é. Voltamos pr'aquilo que nos faz florescer. Eu cresci sem querer mas quando olho pros olhos dela, sou criança outra vez, acredito no mundo melhor, no conto de fadas bonito sem padrões, na proteção contra o bicho papão, no amor e não na solidão dolorosa, até no papai noel, porque às vezes tudo que a gente precisa é acreditar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Quimeras Abortadas
CasualeDevaneios, ilusões, pseudo-conclusões, questionamentos. Sou o que escrevo.