ENGANADA

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Seu rosto estava à polegadas de distância do meu, eu podia sentir seus hálito fresco sair de seus lábios entreabertos. Meu corpo estava roçando no seu e através dele seu coração martelava forte, tanto que fazia o meu tremer dentro do peito.

Eu precisava dessa confirmação e quando enfim ele tomou a ação eu soube a verdade.

Seus lábios quase tocaram os meus antes que eu o afastasse rudemente.

Não posso acreditar no que está acontecendo. Simplesmente não posso.

Como alguém pode ser tão cruel assim? A ponto de torturar a possível filha?

David passou a mão esquerda na bainha, procurando sua espada e logo percebeu o objeto em minha mão direita.

As lágrimas queimavam meu rosto e o nó crescia a cada instante em minha garganta. Como ele pode ter feito isso? Como pôde ser tão mau?

- Hannah o que... - ele tentou se aproximar, mas logo passei sua espada para a mão esquerda e me posicionei em modo de ataque.

Isso não vai ficar assim.

- O que está fazendo, Hannah? - ele parecia confuso, mas não me enganaria nem um segundo a mais.

Eu queria muito acreditar que era verdade, que eu teria mais uma chance com ele. Que eu podia tê-lo salvo e não sentir esse buraco enorme no meu peito crescer a cada segundo que permaneço olhando em seus olhos novamente. Mas não podia. Não posso tapar os meus e esperar que tudo fique bem, que vou conseguir ver seu sorriso novamente, que vou rir do seu sarcasmo e ouvir sua gargalhada gostosa, porque isso simplesmente nunca mais vai acontecer. Ele está morto. David morreu naquele campo de batalha, Érica me traiu e de alguma forma estou nesse lugar ilusório.

O verdadeiro David jamais permitiria que eu me aproximasse tanto ou o tocasse daquela forma, muito menos tomaria a iniciativa para me beijar.

- Pensou que eu não perceberia? - minha voz soa como um susurro sob meus soluços involuntários.

David não era do tipo rebelde, mas também jamais me aconselharia a contar tudo ao rei. Ele sempre me apóia em todas as minhas escolhas e certamente nessa não seria diferente e mesmo que eu me foda com cada uma delas, sei que ele estaria ali, gargalhando lindamente das minhas mancadas, mas ainda sim, estaria ali para mim.

- Hannah... Por favor - ele tentar se aproximar novamente.

Num golpe rápido, passo a lâmina em seu uniforme, fazendo um pequeno corte no couro marrom.

- Será que dá para parar com isso? - limpo as lágrimas que teimam a cair - Já chega Kiron!

Sua face torna-se neutra, como se estivesse entediado com tudo aquilo.

Tudo começa a transluzir e mudar de forma e cor, como um pingo ao cair num lago, quando as ondas cessam percebo que nem ao menos saí do lugar. Os tantos reflexos esbranquiçados permanecem ali, imagens minhas deformadas em espelhos turvos e sem perspectiva me encaram.

Olho para as mãos e vejo que não seguro a espada, há apenas o espaço entre minha palma e dedos onde ela deveria se encontrar. Mas de alguma forma consegui sentir, a brisa, o hálito de David, a base fria e o peso de sua espada...

Porém tudo não passou de uma ilusão de Kiron, uma lembrança deformada de tudo o que acontecera.

Como pôde fazer tudo isso apenas para arrancar informações de mim?

Logo um dos espelho brilha e surge a imagem borrada de Kiron me observando, apoiando seu corpo pesado em seu cetro de lado.

- Por que fez isso? - soluço

Ele me encara em silêncio e simplesmente some.

- Aaaaaaa - corro e esmurro várias vezes o espelho onde a imagem dele surgiu - Desgraçado! Como pode fazer isso comigo? Com David! Não importa se por meus pais aqui em minha frente. Você nunca saberá nada e nunca poderá matar o dragão sem minha ajuda! Vou destruir você! Destruir tudo o que você construiu!

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