Heroína

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Como seria morrer? como era a sensação de matar alguém? Seria ruim?


Talvez a morte viesse me visitar mais depressa do que eu imaginasse, tão precoce, inesperada e cautelosa. Ela poderia me arrancar dos braços da vida e me aniquilar do devastado mundo de atualmente.
Talvez Deus tivesse compaixão para comigo e me deixasse respirar um pouco mais do abafado ar que domina o planeta Terra. Idosa, sentada ao relento  admirando as estrelas que enfeitam o triste céu na escuridão da noite, com a pele sensível e problemas na visão, uma árvore, uma rede e um copo de café com leite. Essas eram algumas das hipóteses de como eu deixaria de existir, de respirar, de enxergar as cores, sentir os sabores e enfatizar sentimentos inexistentes.

Inspira, respira.
Inspira, respira.

Contei até três mentalmente esperando ouvir o som do gatilho e finalmente  abraçar a morte,
mas não, não dessa vez, a morte não queria me levar para junto de si, pelo menos não naquele momento e nem naquelas circunstâncias.
O som do gatilho veio, seco e perturbador, mas eu não senti nada, nem dor, nem a tal queimação que dizem que o tiro proporciona a muitos.
Talvez por estar escuro Aurora tenha errado o alvo, mas ouvi um grito alto e inesperado, abri os olhos e procurei ver de onde ele vinha, era muito dificultoso pois estava escuro e eu não enxergava direito, não tinhas forças para limpar minhas vistas. Apenas percebi que a luz da lanterna havia se apagado e que Aurora gritava sem parar.

" - Quem está  ai? "

Ela gritava muito e havia raiva no seu tom de voz, havia passos e mais passos, muita inquietação, muitos movimentos.
Era como se muitas pessoas tivessem entrado na sala e estivessem nos observando.

Senti alguém puxar meu cabelo bem forte me fazendo gritar de dor, eu não sabia quem era, não sabia o que faria comigo e meu medo só aumentava a cada instante.

Luz, eu finalmente via a luz, era tão bom poder ver tudo de novo, as cores, os tons.
Com a luz da sala acesa eu pude entender tudo que se passava naquele exato momento, na porta eu vi, eu não sei dizer se era um humano ou uma criatura divina. Era quem eu menos esperava ver naquela hora, era ela, com os cabelos molhados e o rosto repleto de pavor, com seu casaco estranho e suas botas pretas de couro leve. Como uma guerreira, uma salvadora, uma heroína, Ares friamente apontava uma arma para Aurora que segurava fortemente em meu resto de cabelo.
Ao meu redor havia vários homens de preto com óculos escuros e jaquetas de couro lustroso, talvez fosse uns seis homens, eu não estava enxergando muito bem.
Ares com certeza era a líder deles, ela era estável, controladora, fria, e muito forte, eu realmente me inspirava nela, queria ser como ela, enfrentar os obstáculos e ser forte.

Aquilo tudo só poderia ser um sonho, no exato momento de minha morte Ares aparecer não podia ser real. Me dei conta de outra coisa que me deixou boquiaberta, era Nero, ele estava caído no chão com a perna sangrando e com as mãos sujas de sangue. Ele suave frio e olhava para Ares de modo furioso, sua arma estava jogada a pouca distância do seu corpo, deduzi que ele havia levado algum golpe que fez sua arma voar e ele não ter como se defender.

Ele não iria morrer, pelo menos era o que parecia, olhei mais um pouco em volta e vi o homem que estava naquela enorme porta de grade por onde eu havia passado.
Ele era o mesmo homem do dia em que Ares me abordou nas ruas de São Paulo, e ele estava com eles, do lado deles, que confuso aquilo se tornava. Daí eu me toquei, tudo fazia sentido, ele estava lá como espião esse tempo todo, observando o lugar para informar os que estavam por fora, "esperto'', pensei.

Algo faltava, eu não sabia o que era mas eu sentia que algo estava faltando naquele lugar, Aurora gritava que iria atirar na minha cabeça se eles não fossem logo se afastando de nós. Nero estava jogado no chão com sangue ao seu redor, ele estava quase inconsciente e eu também.

- Abaixe a arma Aurora!
Ares gritava sem parar.

Eu podia sentir que Aurora tremia com a arma apontada para mim, e para a minha falta de sorte eu estava quase adormecendo,  a dor era tão agonizante que meus ossos pareciam derreter, queria gritar por socorro, mas nem isso eu era capaz de fazer.

- Fique longe dela Ares, ela é  perigosa.

Essa foi a única frase que consegui dizer, eu estava sentindo uma onde de choque se passando por meus órgãos constantemente.

- Não se aproxime ou eu atiro!
Aurora gritava com total certeza.

- Solte- a e eu a deixo viver!

- Hahaha! Não seja idiota, eu vou acabar com você.
Aurora gritou com um sorriso maléfico e frio no rosto.

- Não tenha tanta certe...

" Pow "

O som estridente do disparo me fez doer os ouvidos, Ares não teve oportunidade de terminar sua frase contra Aurora, porque a mesma havia disparado primeiro em sua direção, acertando então seu ombro.
Vários gritos de "NÃO" foram saindo da minha boca machucada, eu não podia acreditar que minha heroína estava baleada.

Ouvi outro grito e virei meu pescoço para ver o que estava acontecendo, um dos homens aliados de Ares segurava os dois braços de Aurora para trás, enquanto isso chutou a arma que não sei como ele tirou da mão dela para longe. Talvez fosse mais um golpe de karatê,
ela gritava como uma fera, um animal sem controle, um ser sem raciocínio.

- Eu vou acabar com você Jully! Isso não acabou, eu vou te destruir maldita!

Ela tinha os olhos repletos de fúria, ódio, maldade. Era tão cruel e sombria.

Ares estava encostada na parede com uma das mãos no ombro, talvez para estancar o sangue de seu ferimento, seu semblante era de cansaço mas havia também muita satisfação, e no fundo eu pude ver um sorriso de lado perfeitamente gentil seguido de um piscar de olhos acolhedor.

Meu Deus! Estou sem roupa! Pensei, era isso que eu estava esquecendo, me deparei com meu estado logo após um dos homens me libertar daquela prisão, senti um enorme constrangimento por todos eles estarem me vendo naquela situação, mas não tinha outra saída.

O gosto de sangue ainda estava na minha boca, dois dos homens me ajudaram a levantar-me da cadeira, logo após um deles pegou o tecido que cobria a mesma e colocou envolta do meu corpo.

Eu estava tonta, não conseguia me equilibrar ao pisar no chão, as paredes estavam girando e eu não me lembro o que aconteceu dali em diante, apenas sei que acordei tendo em vista dois lindos olhos castanhos que me olhavam sem parar. Eu estava em seus braços fortes e quentes e ele me abraçava com uma força enorme, porém com a mais pura delicadeza, havia um olhar preocupado em seu rosto.
Dentro de um carro sem saber para onde ia, mas me sentindo segura, eu estava com ele o homem dos meus sonhos, ou seria aquilo um sonho?!

- Dominik, é  você?
Falei tentando me levantar de seu colo e sendo interrompida no mesmo instante.

- Não! Quietinha aí.

- Dominik, deixe-me toca-lo...

- O que fizeram com você minha doce Jully?
Ele disse com compaixão exalando de sua doce voz.

- Eu.. Onde está Ares? Ela...

- Não diga nada, apenas durma! Eu estou aqui agora.
Disse ele tocando em meus ferimentos na boca.

Eu não pensei em contestar,  apenas sorri e adormeci em seus braços.

Aos 18Onde histórias criam vida. Descubra agora