Distante

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Antes de qualquer coisa, onde eu estava? Eu só conseguia sentir o medo me dominar, e a angústia de não poder mais ver meus tios e amigos, esperei que viesse daqueles estranhos qualquer reação fosse boa ou má.
A mulher abaixou a arma que apontava para meu crânio, lentamente dizendo:
- Eu sempre soube que era você, mas foi prazeroso te ouvir dizer.

Não me contentei com tanta especulação sobre quem eu era ou deixava de ser e acabei falando sem pensar:

- Tá! Já podemos pular pra parte que você diz o que quer comigo, se pretendo me roubar perdeu seu tempo, eu estou mais dura que pedra! Retruquei.
Uma risadinha tosca ecoou pelo beco, um dos cachorrinhos da mulher me encarou e disse:
- Você deveria ficar calada, não vamos te roubar!
Pensei rapidamente, se eles não iriam me roubar, pelo amor de Deus o que pensavam em fazer comigo??!!! Que droga!

 O suor começava a escorrer por meu rosto nervoso, mordi meus lábios totalmente secos, eu tinha esperança de acordar e perceber que era só  um sonho ruim.
Eu usava um vestido amarelo palha, tecido fino desajustado com um tênis bem antiquado branco meio encardido por fazer horas que eu o usava.

 O frio começou a invadir meu corpo rapidamente sem pedir licença, eu virei os olhos e perguntei esgotada:
- Posso ir embora agora? Já disse o que vocês queriam saber.
- Venha conosco, você precisa  conhecer alguém. Disse a mulher.
- E se eu não estiver afim? Respondi afrontosamente.
- Depois de tudo você ainda se recusa a cooperar conosco?
- Posso pelo menos avisar meus tios? Eles devem estar pirando agora!
- Não! Ela respondeu curta e grossa.
Eu poderia arriscar, me salvar era mais importante que a curiosidade de saber quem eles eram. Olhei no relógio já era 8:00 horas da noite. Com os ponteiros azuis, antigo e meio desbotado, ele era cor rosa e claro como as flores do Jardim da nossa vizinha Odete.
É, até de Odete eu sentia falta, uma velha rabugenta que colocava os cachorros atrás de mim para que eu não pudesse subir no pé de laranja em frente a casa dela, corcunda e enrugada, já tinha seus 70 anos ou mais, me chamava de menina levada e quando estava de bom humor me dava balas de canela que ela mesma fazia.
Ok, hora de esquecer um pouco dona Odete e focar na minha fuga, quando me deu conta os três desconhecidos estavam conversando distante de mim, em sussurros e gestos, eu não conseguia ouvir absolutamente  nada. Aproveitei que estavam distraídos e num súbito ataque de angústia sai correndo em direção a entrada do beco, meu tênis não meu ajudou muito pois estava apertado demais para correr do modo que eu corria. Mal me afastei e um dos homens me agarrou pelo braço puxando-me violentamente contra seu corpo, eu só senti minha cabeça chocar contra seu peito como se fosse um certo objeto em alta velocidade em contato com uma parede. Senti uma dor passageira nos olhos devido ao impacto. Quando os abri olhei para cima, para aquele homem monstruoso e ao mesmo tempo lindo. Estava tão perto que eu podia ver seus lábios e olhos castanho mel, seu cabelo dourado que brilhava na noite e uma cicatriz em forma de T em sua testa que me tirou do transe em que eu estava.  Percebi que o silêncio reinou enquanto eu admirava o homem. Me recompus e gritei:
- Me solta idiota!!!
- Deixe de teimosia! Ele respondeu me apertando mais.
- Eu consigo dar um soco em alguém sabia?
- Você pode tentar se quiser!
- Eu não vou com a sua cara! Eu falei emburrada.
- Isso não importa. Ele respondeu friamente.
Me veio uma vontade estranha de saber qual era o nome daquele brutamonte arrogante, para poder chamar ele de babaca e logo em seguida gritar seu nome ridículo.  

Encorajada eu perguntei  rapidamente:
- Qual seria o nome do ser arrogante que está me segurando com tanta força?!
- Edgar Ferdoni. Ele respondeu sem interesse, como se não gostasse do seu nome. Eu assenti rapidamente enquanto ele me levava em direção  dos outros dois mal feitores.
Sinceramente eu desisti de tentar fugir, era inútil, apenas me conformei que eles agora me dariam um novo caminho para seguir. Talvez me levar para o exterior  para ser garota de programa, ou ser feita de refém em alguma ilha distante. E por mais incrível que pareça  isso existe muito no mundo, principalmente no Brasil. Me veio mais medo nos olhos só de imaginar.
Seguindo  a mulher os dois caras foram em direção a saída do beco, lá se encontrava um carro preto, vidros negros, e designer moderno como se tivesse acabado de sair da loja.
Fiquei boquiaberta enquanto a mulher abria a porta do carro me jogando lá dentro rigorosamente. 

Todos entraram no carro, os cachorros na frente e a domadora atrás com essa pobre adolescente que sou eu. 
O carro começou a se mover e eu não fazia a mínima idéia de como escapar daquela situação.

Durante o caminho começou  a chover, uma chuva fina mas relaxante, o cheiro de umidade logo se alastrou pelo carro, os pingos de chuva na janela faziam fila para descer sobre o vidro. Eu me sentia mal, sem esperança, sem mais nenhum objetivo em mente, apenas com uma vontade enorme de chorar mas nenhuma lágrima  fazia menção de escorrer em minha face cansada.
As luzes da cidade foram diminuindo aos poucos, o silêncio era claramente perturbador, ficar calada para mim era uma tortura. 

Comecei a cochilar, acordando consecutivamente de cinco em cinco minutos. O cara de olhos cor de mel me observava pelo canto do olho esquerdo, eu pude perceber mas não dei muita importância, talvez estivesse admirando minha falta de beleza. Isso porque não me considero bonita, muito menos atraente, uma magricela com o cabelo enorme despenteado, com os olhos inchados de sono, com a pele pálida não é o tipo de mulher que alguém  se interessa.
Ele não parava de me encarar, isso já estava me incomodando e como indagar era minha única opção, perguntei tediosa:
- O que está olhando? Minha beleza te assusta?
Falei com um sorriso torto e sem graça.
- Talvez.
Ele disse se virando para trás e me encarando de novo.
Não desistindo de confronta-lo eu disse:
- Ainda vamos discutir minha beleza avassaladora Edgar?

Na esperança de receber uma resposta eu fiquei esperando, mas o vácuo  foi enorme.
A chuva foi aumentando e o sono veio me pegando de jeito, eu não queria dormir, eu estava com medo daquelas pessoas, eu só queria estar em casa na minha cama confortável  e quentinha. Não vi e nem senti, apenas peguei no sono exaustivamente.

Eu não me lembro quanto tempo eu dormi, mas quando eu acordei, tive um pressentimento que estava bem longe de casa, vi que eu estava em uma poltrona  confortável e quentinha, sentada ao meu lado estava a mulher do beco lendo um livro calmamente. Olhei em volta, paredes brancas com um tom de cinza várias poltronas e uma moça de roupa branca e sapatos vermelhos. Aquela cena me causou  espanto, pisquei várias vezes para ampliar minha visão. Por fim vi uma janela pequena ao meu lado, tudo ainda girava ao meu redor.
Mantive meu foco na janela até perceber algo assustador.

Aquilo era um avião e então tive a absoluta certeza  que eu estava longe de casa.

Aos 18Onde histórias criam vida. Descubra agora