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[Narrador]

 Um silêncio perturbador tomou conta da casa. Um silêncio não completo, porque ainda ouvia-se baixinho a televisão ligada se misturando com o choro alto da manager parada à porta. Um silêncio de palavras em contraste a explosões de sentimentos, em ambos. O roteiro completamente desfeito, as coisas acontecendo antes do planejado, descobertas deslocadas.

“Meu filho”

“Me desculpe”

“Mãe”

 Tudo o que Taemin não esperaria ouvir naquele dia, ou talvez em dia algum de sua vida. Pareceram frases sem sentido, sem nexo. Ele se lembrava de ter feito a última carta aos onze anos, quando deixou de acreditar que teria uma família como a de outros. Se lembrava de como obrigou-se a acreditar que ter uma família composta pelos membros que considerava irmãos também era normal e suficiente. Por que ele teria uma mãe agora? Por que ela apareceria agora? Por que seria alguém tão próximo? Oh Na Yeon era só uma sunbaenim, era a manager de um dia, não era? Não fazia sentido algum que ela fosse algo mais.

 Em flashes de memória Taemin tentava recuperar qualquer informação que tivesse sobre o passado, sobre a mãe que nunca teve, mas nada lhe vinha em mente – afinal, não sabia nada sobre ela. Uns falavam que havia morrido, outros que tinha desaparecido com algum homem, outros que deveria ser alguma mulher sem coração. Tudo de que se recordava eram as falas das pessoas que sentiam pena dele por ser um garoto abandonado.

 Mas ter uma mãe não fazia sentido pra ele. Como ele sentiria falta de algo que nunca teve? Como ele saberia o sentimento de pertencimento de uma relação em que nunca esteve? Tudo que sabia sobre mães se resumia à observação da vida dos outros. Toda a curiosidade em saber quem ela era e porque desaparecera havia ficado na adolescência, as esperanças tinham sumido há muitos anos.

 Já a cabeça de Na Yeon funcionava em um ritmo totalmente contrário. Ela sabia qual era a sensação de carregar uma vida no ventre por meses, sabia como era sentir um amor incondicional por alguém que é parte de você, e sabia também como ingenuamente tinha se separado deste amor. Suas buscas nunca acabaram, sua esperança nunca se perdeu, sua dor nunca se foi. Vivia com o objetivo de se redimir, de poder ser mãe outra vez.

 Mesmo que em tom de pergunta e desconfiança, ouvir a palavra “mãe” pela boca de Taemin pela primeira vez, fez com que Na Yeon perdesse totalmente o chão. Sentiu seu coração apertar, o peito doía com uma falta de ar que era sintoma da tal bomba relógio explodindo. Não havia se preparado, não havia pensado no que dizer, não sabia o que esperar. Tudo fora de seu controle, fora de seu roteiro. Pensou em mentir, em fugir da pergunta, em inventar... Mas não conseguiria sustentar nenhuma das hipóteses.

 Yeon perdeu toda a força que seu corpo tinha, caiu de joelhos na entrada, sem ainda ter olhado pra trás. A bolsa e as chaves escaparam de suas mãos, que tremiam como nunca. Chorava tanto que não conseguia controlar a respiração, tanto que desconfiava estar sendo ouvida pelos vizinhos. Sentia o coração batendo forte, quase como se pudesse ouvi-lo. Queria parar as lágrimas, mas eram muitas, acumuladas por anos e anos em um silêncio cortante, em uma dor escondida do mundo e de si.

 Foram minutos em que nenhum dos dois conseguia processar a situação e menos ainda resolvê-la. Ele, sentado no sofá, encarando a mulher que acabara de chama-lo de filho, sem nenhum aviso prévio. Ela, ajoelhada, sem conseguir unir forças para se levantar ou dizer toda a verdade. A televisão ligada que parecia estar muda; os ponteiros do relógio da sala se movimentando mais devagar do que o natural; a confusão contra o descontrole.

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