Hoje não, amanhã

79 6 1
                                    

~~Na Yeon~~

Eu passei todas as horas da minha tarde dentro daquele orfanato e posso dizer que foi uma experiência no mínimo interessante. Na Reum saiu sem me explicar nada, adiantando apenas que trabalharia até a noite, sendo que eu sequer sabia que ele estava trabalhando. Felizmente a diretora do lugar permitiu que eu o esperasse e, por mais que eu fosse uma completa estranha, tentei me encaixar ali por algumas horas.

Eu nunca gostei tanto assim de crianças, mas como não sei mais me reconhecer de uns tempos pra cá, não pareceu mais tão estranho fazer companhia para tantas naquela tarde. Foi emocionante tomar conta de alguns bebês em especial, porque segurar aquelas crianças no colo me fazia relembrar de quando eu entreguei o meu bebê – pelo jeito existem tantas mães que ainda fazem como eu fiz, e eu não poderia julgá-las, claro. Quando eu não estava por perto desses pequenos, estava rodeada de algumas meninas e meninos um pouco maiores, que me pediam coisas aleatórias como participações em brincadeiras ou minha presença em sua loja imaginária.

Senti falta da minha infância, por mais que não tivesse tantas lembranças dela. Parece tudo mais fácil quando somos crianças. Ou talvez só tenha parecido pra mim, porque eu tinha meus pais numa casa de classe alta com todos os brinquedos que eu queria ao meu redor. Não me parece mais tão fácil pra essas crianças, pra Reum; não deve ter sido tão fácil pro meu filho. As mordomias dessa fase da minha vida era algo que eu gostaria de ter dado ao Taemin e que espero poder dar pelo menos no fim da adolescência do Reum.

Enquanto eu estive no orfanato, pude conversar e observar alguns funcionários também. Existem os simpáticos e os estúpidos, como em todo lugar, mas o balanço era felizmente positivo. No entanto, nenhum deles parecia se preocupar ou buscar uma maneira para acabar com o bullying que Na Reum vinha sofrendo na escola. Eles me contaram que ele voltava abalado todos os dias, desde o primeiro dia da semana, mas que nunca queria importunar ninguém e que sequer pedia ajuda aos mais velhos. E, pelo que ouvi pelos cantos, não eram só as crianças da escola que o incomodavam, mas as do orfanato também. Tiravam sarro dele por não ter debutado, por ter sido mandado embora, por estar atrasado na série do colégio. E eu não imagino o quanto deve estar sendo difícil pra que ele suporte tudo isso de uma vez só.

Nesses poucos dias longe da minha casa ele já voltou pra escola e arrumou um emprego que, segundo a diretora, é em uma loja de conveniência aqui perto e dura toda a tarde e a noite (ele sequer volta no horário do jantar). Se eu soubesse disso, teria o impedido, não sei por que ele precisa se sobrecarregar com esse trabalho agora. Eu só queria que Na Reum pudesse se sentir bem, mesmo depois da palhaçada que a SM fez com sua vida; me deixa angustiada notar que a empresa consegue seguir destruindo a vida das pessoas em todos esses anos.

Pude conversar muito com a diretora e trocamos informações sobre a vida do Reum antes e depois de sair do orfanato. Ela me disse que ele sempre foi um garoto quieto e obediente, que adorava cantar e foi descoberto em um show de talentos da escola, ainda pequeno. Foi deixado pela mãe ainda bebê e passou toda a infância no mesmo lugar, chegando até a passar por um período de teste com duas famílias diferentes, sem permanecer com nenhuma. A SM o contratou como trainee em 2009, quando ele tinha só 9 anos, era uma criança do fundamental. Saiu do orfanato definitivamente em 2015, da escola no ano seguinte – é claro que a empresa apresentava laudos à justiça como se ele estivesse estudando ou sendo educado em casa, mas qualquer um sabia que não era verdade. E todas essas datas resumem que Na Reum viveu metade de sua vida tentando se encaixar nos padrões da SM, entregando sua adolescência e dormindo em salas de prática por mais de dois anos.

O que Han Se Min fez foi no mínimo cruel.

Eu contei à diretora (que é uma senhora muito simpática, aliás) o quanto Na Reum era um garoto esforçado e carinhoso, ela não parecia surpresa. Mas, quanto mais eu falava dele e descobria sua pureza, mais meu coração apertava. A vida é muito injusta com esse menino. Contei também sobre minhas intenções de pedir judicialmente a guarda integral dele e ela me parabenizou, desejando sorte. O processo de adoção não é tão simples e pode ser que eu não consiga, então pedi pra que guardasse segredo – seria ainda mais doloroso se ele criasse expectativas e elas fossem esmagadas depois.

FIND MEOnde histórias criam vida. Descubra agora