Lista Negra

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~~Na Yeon~~

"Você é o maknae, não é?" – perguntei, interrompendo a milionésima questão que aquele menino me fazia. Ele assentiu, apenas confirmando o que eu já esperava. É tão fácil descobrir os mais novos dos grupos, eles sempre tem cara de criança, são curiosos pra tudo e ainda falam como se tivessem esperança na vida - "E quantos anos você tem?"

"15... Quase 16, na verdade" – respondeu, em um sorriso tímido. Eu não sabia se chorava por ter que tomar conta dele ou se chorava por saber que aquela criança ainda ia passar por tanto sofrimento

O maknae sozinho já tinha me feito contar quase toda minha vida, até porque ele aparentemente era o único que sabia sobre minha passada profissional pela empresa anos atrás – e olha quem ele nem era nascido naquela época. Eu não sei porque, mas essa criança aparentemente achou que podia ter a liberdade de me perguntar quantos álbuns eu lancei, quanto tempo durou minha carreira, onde andam minhas antigas parceiras e se eu tinha um lighstick oficial. Crianças de hoje em dia aparentemente não sabem calar a boca e ouvir algum superior.

"Jisungie" – o garoto do lado o cutucou, talvez percebendo minha cara de desgosto ao ter que responder uma criança de 15 anos – "Já chega"

Descobrir o líder é tão fácil quanto descobrir o maknae. O líder é o único que te olha diretamente nos olhos, como se te desafiasse. É aquele que fica a frente, nem que por um passo de distância, te encarando como se fosse a mãe de todos os outros, pronto para sair à defesa dos menos favorecidos. Aquele que tem o ar de superioridade frente aos calados que estão por perto. E aquele garoto, o que parou o mais novo, era o líder com toda certeza.

"Líder?" – parei em sua frente, cruzando os braços. Foi a vez que ele finalmente abaixou a guarda. Assentiu, um tanto envergonhado, eu diria – "Qual seu nome?"

"Taeyong" – retrucou. Soltei um riso abafado, era engraçado como ele tentava disfarçar o nervosismo mantendo a expressão séria

"E quem é o trainee?" – questionei, buscando com os olhos qual deles parecia ser o que ainda enfrentava o limbo do debutar ou não

Outro menino timidamente levantou a mão, sem dizer qualquer palavra. Óbvio, o trainee tem que ser o mais submisso de todos, o que aceita qualquer coisa e qualquer imposição para ter uma futura chance. Eu sei, já fui um deles um dia. Ele não parecia muito mais velho que o maknae, e não podia esconder sua expressão desesperada – é como se a todo momento ele dissesse "por favor, me dê uma chance". É uma pena que ele não saiba o que esse mundo dos idols reserva, se soubesse talvez desistisse antes mesmo de começar.

Era o único a usar uma daquelas plaquinhas de identificação, consegui ler que o nome era Na Reum. Okay, já descobri tudo que precisava pelo primeiro momento – Jisung é um típico maknae; Taeyong um típico líder; Na Reum um típico trainee. Dos outros ainda não preciso saber nomes ou informações, não acredito que a pessoa que procuro esteja no meio deles e mais tarde terei todas as fichas em mãos.

O CEO havia saído da sala fazia uma meia hora, assisti ao término do ensaio dos meninos antes de termos essa breve conversa. Eu não via a hora de ir embora, mas foi bom observá-los enquanto praticavam. Tinham as típicas características da SM, eram multi talentosos, carismáticos, bonitos e calados quando recebiam ordens. O pacote perfeito. Passei os olhos por todos os dezenove mais uma vez, não tinha nada de diferente em nenhum deles.

"Bem, meu nome é Oh Na Yeon, e um dia eu já estive na posição de vocês, como o maknae lembrou" – iniciei minha apresentação, rompendo o absurdo e perfeito silêncio que se estabelecera – "Sei o que fazem, o que precisam fazer e o que a empresa fará por vocês. Já tive minhas missões, meus managers e minhas práticas; portanto, não me tratem como se eu fosse leiga no assunto, eu não tolero que ajam como se eu fosse estúpida! Não achem que poderão passar por cima das minhas regras ou questionar meus posicionamentos porque eu sei bem mais desse meio que qualquer um de vocês. Existem regras básicas de convívio comigo... Eu não peço mais de duas vezes, eu não preciso de opiniões, eu não suporto choradeira ou crise existencial. Se não suportam estar aqui é só desistir"

Foi mais ou menos esse o discurso do meu primeiro manager, não foi? Talvez eu ainda siga muito daquele exemplo sem perceber. Mas realmente é ótimo estar no lugar em que ele estava sempre, é ótimo inverter os papéis e deixar de abaixar a cabeça para passar a dar as ordens. São 19 adolescentes, não é como se eu pudesse bancar a boazinha sonsa e pintar um mundo cor-de-rosa como manager. Ou eles aguentam a pressão ou serão esmagados por ela, é assim que o mundo da fama funciona e eu aposto que já estão acostumados.

"E esse líder responde por todos vocês" – voltei a encarar Taeyong, que agora desviava o olhar pelos outros membros – "Não saiam da linha se não quiserem que o líder seja punido e responsabilizado. Se fizerem isso irei assumir que não se importam com ele e, assumindo isso, assumo também que o grupo já fracassou"

Em um instante os outros 18 olhares assustados se voltaram àquela única pessoa que os representava. O líder não tem sua função dada a toa, se ele não responde pelo grupo ou não consegue manter as rédeas dos próprios membros, supõe-se que ele fracassou em sua posição. É um cargo um tanto pesado, quase dá pra ver o fardo de responsabilidade caindo em cima das costas desse menino. Tenho pena dele.

"Ah, e eu odeio quando não prestam atenção no que estou dizendo" – aumentei o tom de voz assim que me deparei com um dos garotos, no fundo da sala, prestando mais atenção da própria jaqueta que na minha presença – "Quando eu falo espero que olhem pra mim"

O tal menino percebeu que eu o encarava e logo levantou o olhar. Novamente, deixei um riso escapar; não só pelo desespero que ele transmitiu ao notar minha reprovação, mas também pelo fato de que era claro que ele era do tipo que me traria problemas. As pessoas andam tão decifráveis ultimamente.

"Qual seu nome?" – me aproximei um pouco. Os que estavam em sua frente, abriram caminho, como se eu fosse atropelar todo mundo se não saíssem da frente. O menino engoliu seco; era mais alto que eu e não tinha os traços exatamente coreanos – "Não tenho tempo pra ficar esperando sua resposta e não queira que eu descubra sozinha"

"Ahm... Lucas" – respondeu, se movimentando estranhamente como se não soubesse o que podia ou não fazer na minha frente – "Meu nome é Lucas"

"Parabéns, Lucas, você é o primeiro na minha lista negra" – como acontecera com o líder, os outros 18 olhares se voltaram à mesma pessoa. Todos mais assustados que antes. Parecia que aquele garoto nunca tinha escutado uma bronca antes, era como se ele fosse começar a chorar na minha frente. Por onde andam os managers dessa empresa? – "E vocês todos... Não queiram fazer companhia pra esse colega na minha lista. Não é uma boa ideia"

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