Capítulo 37

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Kelly

Eu começo a chorar compulsivamente enquanto a médica e André estão com os olhos assustados em mim.

— Se acalma, Kelly. Seu filho é um menino sim, mas isso não significa que ele será igual ao Daniel. Na verdade ele não será. Seu filho é outra pessoa, tem outra vida. — André diz olhando para mim segurando a minha mão como uma forma de me consolar.

— Ele tem razão querida. — Kátia comenta olhando para nós dois. Mas tem certeza que é apenas isso que te incomoda? Voce parece muito nervosa.Ela diz fixando seus olhos mais em mim e se aproximando de forma lenta como se tivesse cautela e se certificando de que não invadiria a minha privacidade, meu momento mais reflexivo e delicado.

— Perdão dona Kátia pelo incômodo, é que a Kelly está muito sensível com algumas coisas que estão acontecendo ultimamente. — André diz me olhando timidamente, como se me pedisse desculpa pelo assunto que acabara de começar.

Entendo onde ele pretende chegar no mesmo instante em que percebo a forma do seu olhar para mim. Num primeiro momento até senti a chateação começar a tomar conta de mim. Mas talvez fosse melhor assim, que ele falasse sobre aquilo com ela. Porque sinceramente, eu acho que nunca conseguiria. Então, resolvo aceitar e esperar para ver se a conversa tomaria o rumo que eu e ele estávamos imaginando. Afinal minha mãe precisaria de mais ajudas do que as que conseguimos até agora. Então não custaria nada tentar.

— Ah, sim. Se eu puder ajudar em alguma coisa eu estou às ordens. Dona Kátia reage da forma exata que imaginamos. Sinto um misto de sentimentos tomando conta de mim. Sentimentos como medo, nervosismo, vergonha...

Olho para os aparelhos a minha frente evitando o contato dos dois, pois me sinto sem graça com o rumo que imagino que a conversa irá tomar. Sei que estou sendo repetitiva mas é que droga, eu nem sei mais o que pensar.

— Bom talvez a senhora possa ajudar de alguma forma já que é médica. Só talvez...

Mesmo sem olhá-lo eu percebo a tensão na voz de André, denunciando que ele também está nervoso.

— Posso tentar, se me disserem exatamente qual é o problema. — Ela diz dando uma gargalhada gostosa em seguida.

Volto meu olhar para André e vejo que suas expressões estão mais relaxadas, assim como as minhas. Então ele continua.

— É que a mãe da Kelly teve um AVC recentemente e ficou com os movimentos de braços e pernas comprometidos. Por conta disso, ela precisará de fisioterapia para tentar recuperar o máximo possível dos movimentos. Os médicos pensam que a melhor opção seria um tratamento alternativo na capital, acham que teríamos melhores resultados. A senhora conhece bons fisioterapeutas por lá, e que tenham um preço acessível?

— Há, era isso? Claro que conheço. Fiz amizade com um ótimo em um dos congressos de medicina que participamos juntos. Na verdade sempre nos encontramos nos congressos. Ele tem uma clínica incrível em São Paulo. Eu conseguiria que ele atendesse a mãe da Kelly de graça. E quanto a estadia da sua mãe lá eu adoraria ajudar, já que até agora você não nos permitiu dar um centavo para o meu neto e eu entendo suas razões Kelly, apesar de me sentir triste com tudo isso. Então me deixe ajudar a sua mãe? — Ela diz as últimas palavras olhando diretamente para mim.

— Dona Kátia eu não quero que pense que sou uma interesseira porque..

— Eu nunca pensaria isso de você, Kelly. Se você fosse uma interesseira já poderia ter se aproveitado com a gravidez, não acha? — ela diz me interrompendo com seus olhos azuis ainda fixos em mim. Afirmo com a cabeça. — E eu gosto de ajudar as pessoas, sinto prazer nisso. Sentiria ainda mais em ajudá-la com isso. Eu já disse o quanto sinto carinho por você, por acaso duvida disso?

— Claro que não. Eu também gosto muito da senhora. — Respondo pegando uma de sua mãos enquanto continuo segurando a de André com a outra.

— Então me deixa te ajudar? — Pergunta ela com aquele sorriso tão lindo em seus lábios.

— Tudo bem então. Eu nem sei como fazer para agradecer a senhora por isso. — Eu digo sorrindo também.

— Não precisa me agradecer, Kelly. Faço isso porque gosto  muito de você, nada mais do que isso. Mas se quiser me agradecer de alguma forma eu só quero te pedir que não se afaste de mim.

— Isso a senhora não precisa nem pedir. Eu não quero me afastar. — Deixo as palavras fluírem  acariciando sua mão e sentindo uma enorme vontade de abraçá-la.

— Bom tá bem.. tudo lindo, mas eu só gostaria de te avisar que a senhorita está livre de mim e já pode se levantar quando quiser. — Kátia avisa imprimindo os papéis da ultrassonografia do meu bebê e entregando em minha mão.

Meu deus, eu estava tão distraída que nem sequer percebi que ela retirou os aparelhos de minha barriga. Eu dou um sorriso ainda mais com esse pensamento. Quando me levanto solto a mão de André por um momento para abraçar Kátia de um modo forte, é tão gostoso que me sinto extremamente acolhida e confortável em seu abraço.

— Mais uma  vez obrigada por tudo. Agradeço de coração pelo que está fazendo por mim e pela minha mãe. — Termino de falar dando um beijo em seu rosto antes de me afastar.

— Eu é que agradeço por permitir que eu tenha tido esse momento lindo com você e meu neto, Kelly.

Ela diz sorrindo enquanto vejo algumas lágrimas caírem dos seus olhos.

 
Eu me despedi de dona Kátia prometendo que ela acompanharia a todas as consultas do meu bebê comigo, o que fez com que eu me sentisse muito aliviada de alguma forma.

Agora eu e André já estamos do lado de fora do hospital quando paro de caminhar de repente e olho sorrindo para ele.

— Como eu posso te agradecer por hoje? — Solto, acaricio seu ombro.

— Deixe-me ver. —  Diz ele pondo uma das mãos na cabeça como se pensasse em algo enquanto a sua outra mão continua segurando a minha. — Já sei como pode me agradecer, querida.

— Diga? — Pergunto ansiosa.

— Continue com esse sorriso lindo no seu rosto por muito tempo. — Ele me olha fixamente ao dizer isso e eu me aproximo mais colando o seu corpo no meu.
O abraçando com toda minha força encostando minha cabeça em seu peito. Nesse momento eu sinto uma vontade de ficar assim em seus braços por muito tempo.
Desejo muito beijá-lo mas me contenho, por precisar entender os sentimentos em mim, em um outro momento com mais clareza. A última coisa que eu quero é magoá-lo. Então apenas me mantenho em seu abraço enquanto sinto os nossos corações e a respiração se  acelerando.

Marcas do PassadoOnde histórias criam vida. Descubra agora