52. Conversa com Hyewon

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Jungkook estava deitado no tapete, encarando o teto com um claro cansaço estampado em seus olhos. Suas pernas balançavam inquietas e tinha fome, mas não conseguia dizer não à sua sobrinha insistente, que o fizera entrar no quarto e se sentar na cama. Tentou fugir com um sorriso no rosto, mas Hyewon gritou as palavras mágicas, uma brincadeira que fizeram durante toda a infância dela, e ele ficou imóvel, sobre o tapete.

Jungkook, impossibilitado de sair de casa durante o dia, preparava o lanche da tarde para quando ela voltasse da escola, a poucos quarteirões dali e era ele também quem tomava conta dela até que seu irmão e sua cunhada voltassem do trabalho. Hyewon era uma criança que, como o próprio Jungkook, era bastante agitada, mas como era também muito imaginativa, era acalmada por brincadeiras e faz de conta. Uma vez, o tio Gguki disse a ela que os dois eram mágicos com poderes um sobre o outro e que se dissessem as palavras mágicas secretas, os dois poderiam controlar um ao outro. As palavras mágicas eram o nome um do outro ao contrário e uma ordem. Mesmo quando Hyewon cresceu e deixou de achar graça na maioria das brincadeiras do tio, aquela maneira particular de pedir ou implorar ao outro favores foi ficando entre os dois como um segredo e sinal de intimidade que só os dois tinham um com o outro.

Ao ouvir "KookGnuj pare", Jungkook imediatamente parou, mas como estava cansado, com sono, com fome e com a mente agitada, deitou-se sobre o tapete do quarto da sobrinha, como se de fato fosse obrigado por ela a ficar ali e responder as perguntas dela. Em sua cama, ela estava deitada de barriga para baixo, reconhecendo no tio o sono e o cansaço, mas não poupando-o, no entanto, de ter que contar toda a história que acontecera entre ele e Jimin com detalhes.

-Como é que vocês se conheceram? Eu quero saber tudo! Vamos.

-Ah, Hyewon, eu quero dormir, estou cansado, já é quase dia e você não vai fazer o tour pela universidade daqui a algumas horas?

Hyewon ignorou a fala dele e apoiou o queixo sobre as mãos unidas, indicando que esperava pelas respostas dele.

Jungkook contou toda a história de como se conheceram, e como Hyewon não parava de perguntar todos os detalhes, ele contou coisas até demais. Sentia um pouco de vergonha de contar como ele beijara Jimin pra ganhar uma carona e mais ainda quando ela insistiu tanto que se viu narrando com detalhes qual era a sensação de fazer sexo com um vampiro quando se é humano. Curiosamente, sentiu-se mais encabulado ao dizer como se sentia em relação a Jimin, a confusão entre atração e a possibilidade de um afeto fazendo com que questionasse o que sentia de positivo. Na verdade, o envergonhava pensar que quem quase o matara, o aprisionara e o tratara como um objeto pudesse receber dele algum tipo de consideração. Racionalmente, não fazia sentido nenhum. Era uma síndrome de Estocolmo que ele lutara para abafar durante todos esses anos. Agora, desabafava sobre como apesar de deixar vir à tona somente sentimentos que o ajudavam a combater o que sentia em relação a Jimin ou mesmo aos outros, havia algo de bom que sentia em relação a eles. Era vergonhoso ser um homem de quarenta anos de idade, imortal, que não conseguia se entender bem.

Hyewon não se sentiu nem um pouco envergonhada. Pelo contrário, ela achava tudo aquilo extremamente interessante e sempre teve o hábito de ver o tio como um confidente, de qualquer modo. Jungkook sempre fora mais tímido para falar sobre aquele tipo de assunto, mas procurava fingir firmeza quando a sobrinha lhe perguntava o que os pais, avós ou professores não respondiam, porque pensava que de algum modo ela descobriria o que tentavam esconder dela de qualquer maneira e ele achava que era muito melhor ter orientação de um adulto, mesmo que ele não fosse uma boa referência para responder sobre todos os assuntos. A confiança que tinha no tio e o não-julgamento dele fizera Hyewon dividir com ele todas as inseguranças que não dividia com os pais. O tio Gguki fora o primeiro a saber sobre as paixões dela por um garoto na escola e o único a quem ela ouviu quando todos a aconselharam a deixá-lo de lado porque ele estava brincando com os sentimentos dela. Quando estava na Nova Zelândia, Hyewon ligava sempre para o tio para contar tudo que acontecia. O primeiro beijo, a primeira vez que fez sexo com um garoto e como tinha achado tudo nojento, a atração dela por uma garota com quem dividia um quarto no alojamento do trabalho dela: Jungkook ouviu sobre tudo isso sem julgá-la, o que era ainda mais importante para ela, já que não tinha muitos amigos em quem confiar.

Noites vivas - JikookOnde histórias criam vida. Descubra agora