capítulo vinte;

5.4K 437 339
                                    


G A B R I E L


PlayHard parecia preocupado quando trocou um rápido olhar comigo antes de voltarmos a atenção para a garota ao meu lado.

Seria cômico se não fosse trágico e se meus interesses não estivessem em causa, mas ela parecia bem nervosa naquela cadeira. 

E tudo bem, era uma coisa meio espantosa de se propor mas não era muito grandioso. Não é como se PlayHard estivesse colocando uma arma em nossa cabeça e nos obrigando a assumir um namoro da noite pro dia com a condição de nos chutar da guilda.

Ou era isso que ela pensava?

Que ele a mandaria embora assim que recusasse?

Ela ainda não sabia, mas PlayHard não perderia um cordeirinho assim tão fácil. Ainda mais um cordeirinho que estava dando a ele mais mídia do que nunca.

Talvez fosse bom que pensasse assim; que não tinha opção, porque eu, por outro lado, não tinha.

—— Me desculpe... Eu não posso aceitar isso —— ela soprou, olhando de mim para PlayHard e repetindo o gesto várias vezes, como se estivesse procurando uma confirmação de que havia dado a resposta certa.

Eu olhei para o pequeno porta-lapis em cima da mesa, titubeando sobre minhas opções agora. Eu teria de continuar com as minhas metas e planos anteriores, sem esse atalho que surgiu inesperadamente.

Talvez não tivesse sido um bom momento pra PlayHard fazer essa proposta (eu comentei, mas com ele tudo era do seu jeito e na sua hora). Minha relação com ela não era uma das melhores —— na verdade, eu nem queria ter de vê-la por aqui ——, e não pensei que minhas ações que um dia quiseram que ela fosse embora o mais rápido possível estariam agora sendo julgadas por mim mesmo quando neste exato momento eu queria que ela tivesse aceite a maldita proposta.

Mas como eu teria adivinhado que o público era lunático o suficiente para ver alguma coisa em mim e... Daphne?

—— Bom, eu entendo sua decisão, Daphne —— PlayHard cortou o silêncio, parecendo um pouco mais sério agora. Toda aquela áurea simpática sumindo em um estalo. Ele claramente não imaginava que ela fosse negar assim sem nem considerar pensar, porque... talvez eu não tenha contado o que havia acontecido entre nós recentemente. —— Mas eu posso saber o porquê?

PH insiste, noto, não quer perder a chance de ganhar mais dinheiro. Ganancioso ontem, ganancioso hoje, ganancioso sempre.

Às vezes eu me achava ruim nesse quesito, mas aí olhava pra PlayHard e percebia que ele era muito pior.

—— É que eu... E-eu tenho um namorado —— balbuciou.

Sua declaração encaixa uma peça em minha mente e eu finalmente entendo o motivo dela ter recusado uma proposta dessas. Porque, tudo bem. Ela podia me odiar nesse momento, mas receber uma grande quantidade de dinheiro só pra fingir gostar e depois me ignorar normalmente não era possível?

—— Ah...! —— PlayHard exclamou, surpreso. —— Sendo assim, entendo. Me desculpe, eu devia ter perguntado antes. Que inconveniente da minha parte.

Ele me olhou de soslaio, me encarando como se dissesse «acho que se esqueceu de me contar esse pequeno detalhe».

Levantei os ombros.

Como eu saberia?

—— Tudo bem. Vocês podem ir, era só isso que tinha pra tratar com vocês.

Daphne se levantou em um vulto, quase tropeçando nos próprios pés ao dar a volta na poltrona e começar a se dirigir para fora.

PlayHard me fitou sugestivamente, olhando na mesma direção em que ela ia e voltando a me encarar.

Bufei, me levantando e apertando o passo para alcançá-la. Encontrei seu corpo virando o corredor, pronto para seguir pela sala, e então envolvi meus dedos em seu pulso.

—— Podia ter aceitado —— falei quando ela virou o rosto. —— Não teria de trair seu namorado ou nada do tipo. Era só contar pra ele que é seu trabalho. Não estamos falando de dez ou vinte mil, Daphne.

Com um puxão nada gentil ela tirou seu braço de mim, dando um passo para trás.

—— Por nenhum dinheiro desse mundo eu aceitaria fazer isso com você —— sua voz saiu ácida. —— Você já deveria saber disso.

E me dando as costas, ela sumiu do meu radar.

...

Meu cigarro pendia entre meus dedos. Tinha mais ou menos quinze minutos que saí do escritório e agora estava ali na piscina, pensando.

Ainda não era meio dia mas já havia um grande movimento na mansão, de pessoas carregando coisas de decoração para a festa de amanhã, e eu estava tranquilo quanto a tudo isso porque PlayHard é que estava se encarregando de toda essa merda.

Olhei sobre o ombro quando ouvi passos atrás de mim, vendo ele caminhar nessa direção.

—— Você realmente devia largar esse seu hábito —— ele falou parando ao meu lado e colocando as mãos nos bolsos.

Encarei a piscina a nossa frente, semicerrando os olhos por causa do sol.

—— Não é tão fácil assim —— concluí, mas a verdade é que eu não queria.

—— Enfim, não foi disso que eu vim falar aqui, acho que já está meio grandinho.  —— Amém. —— Você sabe que essa é uma oportunidade única —— foi direto ao ponto.

—— Sim, eu sei. —— Descartei a unidade na lixeira ao lado. —— Mas ela já tomou a decisão que queria.

Ele avaliou o céu contemplativamente.

—— Ainda podemos fazer isso da nossa maneira. —— Olhei pra ele, cruzando o cenho. —— Ela não precisaria saber.

Uma risada escapou da minha boca.

—— Isso não daria certo.

—— Não vamos obrigá-la a nada, mas é claro, você teria um trabalho extra pra fazer isso funcionar —— concluiu, coçando a barba e olhando pra mim. —— Como está sua mãe?

É como se aquela pergunta despertasse alguma coisa dentro de mim que fizesse meu estômago revirar e meu coração bater mais rápido. Apertei meu maxilar, percebendo o que ele fazia e então, murmurei:

—— Bem.

—— Você quer dizer completamente bem ou be...

—— Ela está bem, PH —— interrompi-o, sentindo o sangue correr mais rápido em minhas veias.

Ele tentou disfarçar ao coçar o queixo, mas consegui ver quando um sorriso ameaçou surgir no canto dos seus lábios.

—— Você sabe que é como um filho pra mim, não sabe? —— Voltou o corpo pra mim, colocando a mão sobre o meu ombro. Meus olhos foram até ela e eu segui toda a extensão do seu braço antes de encontrar seu rosto novamente. —— Tudo que estou fazendo é dar a você uma oportunidade de cuidar dos seus problemas, como deve ser. Tem algo que queremos aqui, devemos pegar essa coisa. Simples. Não ache que não percebi que você e ela não se dão bem, pois percebi, mas você nao é tão orgulhoso assim, Gabriel... Não quando pode ajudar alguém com quem se importa.

PH joga sujo, e infelizmente consegue me atingir.

Fitei a gravata perfeitamente atada em seu pescoço.

—— Eu vejo o que posso fazer —— murmurei, amargo.

Ele sorriu, dando dois tapinhas no meu ombro.

—— Sei que vai fazer o melhor —— Ajeitou o terno antes de fazer menção de se retirar. ——  O seu melhor.

Secrets (loud bak)Onde histórias criam vida. Descubra agora