Capítulo 21

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O castelo encontrava-se à mil com a estadia inesperada do duque de Icarus. Ele passaria uma semana no palácio para tratar de questões urgentes com o rei. Pelo visto, tropas do reino vizinho se moviam de forma suspeita ao redor de Velorum. O misto de preocupação e incerteza sobre o futuro veio à calhar. Assim, poderia esquecer brevemente sobre a imagem de Christian e Alene juntos. Como um casal de verdade.

Os empregados continuavam a me tratar como a vadia pessoal do rei. Os comentários desagradáveis tornaram-se cada vez mais frequentes e, às vezes, eram precedentes para algo pior. Havia momentos em que passava pelos corredores e alguém colocava o pé, propositadamente, na minha frente fazendo-me cair. Em seguida, ouvia um "levanta-se, vadia, não é hora de ficar de quatro. Não ainda." Se o que passei na casa de Rudson foi um purgatório, os meus dias no palácio são o próprio inferno.

Martha e Cherly tentavam diminuir as provocações direcionadas à mim, mas as duas tinham afazeres durante o dia inteiro. Então, nem sempre podia contar com suas presenças reconfortantes.

Para piorar, não podia pedir ajuda à Christian. Ele se encontrava tão tenso com uma possível guerra que sequer saía do seu escritório. Desde a chegada de Lorcan, o loiro optou por se trancar em sua sala para incontáveis reuniões com o seu aliado. Quanto ao duque, não tive a oportunidade de conversar com ele de forma direta. Às vezes, ele passava pelo corredor ignorando a maneira como todos os empregados se encolhiam diante da sua presença, como se o próprio Diabo pisasse os pés no solo imaculado do palácio.

Imaculado. Não sei se essa palavra se encaixaria bem diante de tudo o que ando passando.

— Abaixe a cabeça também, vadia. — murmura um empregado apoiando a mão em minha cabeça, forçando-me a fazer uma reverência. — Não se deve olhar os nobres diretamente nos olhos. Saiba qual é o seu lugar.

Contive qualquer reclamação a ser feita. O duque passou como um vendaval pelo corredor, alheio à nossa conversa. O seu olhar é tão distante como se vivesse em seu próprio mundo, preso naquela mente perturbada. Mesmo sendo a sua criadora, não faço ideia de metade dos seus pensamentos. Aquele homem tinha atitudes suspeitas e, às vezes, contraditórias. Uma parte de mim deseja conhecê-lo melhor, mas trato logo de reprimir essa vontade idiota. Quanto mais distante do vilão, mais segura estarei.

Quando a sua presença não passou de um borrão ao fim do corredor, o empregado soltou a minha cabeça mas não perdeu a chance de comentar:

— Por que não segue as regras básicas? Por acaso, quer dar para o duque também? Nossa. Você é realmente uma puta sem escrúpulos.

O meu sangue ferveu e abri a boca para comentar algo, mas todos os demais serviçais tinham o mesmo olhar julgador. Se eu revidasse, apenas daria munição para ouvir mais comentários maldosos. Os guardas estavam com os braços cruzados e sorrisos presunçosos em minha direção. Ninguém me ajudaria nesse momento, afinal secundários nunca são notados.

Então, dei as costas e segui em direção aos quartos para limpar conforme o ordenado pela governanta. A senhora Hopkins também não perdia a chance de lançar farpas quanto à minha "condição" com o rei.

Ao cruzar com Christian no corredor, suspiro aliviada ao vê-lo sozinho e ouso me aproximar. O loiro abre um sorriso reconfortante em minha direção, afastando parte das sombras que me cercavam. Antes de poder falar o quanto precisava do seu abraço, Jonnathan cruzava o corredor e caminhava em nossa direção segurando alguns papéis. A presença desse homem fez todo o meu corpo estremecer e respirei fundo, disfarçando o meu medo. Ou ao menos, tentando.

Como Christian não podia demonstrar que somos próximos, apenas murmurou quando passou ao meu lado:

— Tenha um bom dia, Diane.

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