Capítulo 40

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Sem opções de fuga, fui obrigada a sentar ao lado do trono de Amis. Desta vez, sem nenhuma coleira, mas o garoto gesticulou para que o mordomo fosse para o subterrâneo, pegar outra corrente. Enquanto isso, precisava ser o seu "bichinho de estimação" à contragosto. O salão encontrava-se vazio, nem mesmo Roseta estava presente.

— Nem adianta tentar fugir. Há guardas do outro lado. — comenta apontando em direção à porta. — É inútil.

— Se o seu irmão conseguiu fugir, eu também consigo.

Amis arqueia a sobrancelha, ainda mantendo a arma apontada em minha direção.

— Então, descobriu sobre Aloys? Que garota inteligente. Pensei que todos os soldados de Icarus não passassem de um bando de inúteis usando a imagem de falsa crueldade, mas estou enganado. E eu odeio estar enganado. — ele pressionava o cano da arma contra minha testa. O suor escorria pela face e o medo em meu semblante era evidente. Não queria morrer, sentia a necessidade de lutar por minha vida e liberdade. Mas há momentos onde nos encontramos de mãos atadas, como agora. — Só preciso matá-la e, assim, voltarei a estar certo. Sabe, no final das contas, eu vou acabar com você e seus amiguinhos.

— Por que fez isso com seu próprio irmão? — pergunto a fim de ganhar tempo. O Sol já se despedia entre as colinas, indicando o fim do dia.

Nada do Lorcan aparecer.

— O papai sempre gostou mais dele, eu podia sentir isso. Nunca seria olhado a menos que estivesse no trono, o que era impossível. A minha mãe disse que, juntos, poderíamos ter o reconhecimento merecido. E ela me ajudou a acabar com o papai e prender o Aloys.

— Tudo pelo poder?

— Tudo para que todos em Valfem me amassem.

Era duro admitir mas Amis possuía alguns traços semelhantes à Lorcan. A única diferença é que o maldito garoto de doze anos conseguia ser mais cruel do que o vilão da minha obra.

— Isso é doentio...

Amis dava nos ombros.

— Uma pessoa como você nunca entenderá como é ser tratado como segunda opção. E eu não nasci para me contentar com migalhas!

Para piorar, eu entendia muito bem como ele se sentia. Afinal, passei a vida inteira lutando para ter o mínimo de afeto das pessoas ao meu redor e, quando conseguia, me apegava sentimentalmente à elas. Infelizmente, duvido muito que Amis esteja disposto a ouvir os relatos das minhas inseguranças.

Suspiro em desistência, abaixando o olhar. Antes de poder falar algo, a porta do salão é aberta por um dos guardas. O garoto encara o pôr do Sol através da enorme janela e comenta:

— Ótimo. Os meus novos servos de Icarus retornaram.

Porém, o soldado apenas abria a boca cuspindo sangue e caindo no chão. Só então percebo que há uma flecha em sua cabeça enquanto o líquido vermelho se espalhava por todo o tapete. Amis arregalava os olhos surpreso, erguendo-se do trono em um sobressalto. Por um momento, ele esquecia da minha existência para focar nas três figuras se aproximando na escuridão do corredor.

As botas pretas pisavam com firmeza sobre o solo, profanando-o com sua presença. É como se um demônio passasse pelo jardim de Éden, corrompendo cada bela flor durante o caminho. O longo manto preto balançava de maneira sutil, trazendo consigo escuridão e terror. O olhar gélido do homem focava em Amis enquanto as mãos, cobertas pelas típicas luvas de couro, estavam fechadas ao lado do corpo. As mechas do cabelo se moviam levemente a cada passo dado. Lorcan era a representação do próprio diabo saindo do inferno.

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