Antes de retornar para Icarus, havia uma parada a ser feita. A carruagem ficou na estrada ao lado da floresta enquanto segui mata adentro. Lorcan se ofereceu para me acompanhar, mas pedi para ir sozinha e ele aceitou a minha decisão. Então, atravessei os espessos arbustos, ignorando os passos dos animais silvestres até estar diante da cabana da xamã. A mulher regava a sua horta com um sorriso leve, ressaltando as rugas no canto de seus lábios.
Ao notar a minha aproximação, ela repousa o regador sobre o solo virando-se em minha direção.
— Finalmente você veio, mocinha.
— Já esperava pela visita, certo?
Ela concorda com a cabeça. Lembro-me vagamente de um momento na nossa última conversa, onde ela afirmou que apareci antes do esperado. Talvez essa mulher saiba mais de Velorum do que eu, a própria escritora da obra.
Circe gesticula para acompanha-la e sigo até o interior da cabana. O cheiro de madeira com flores invade as minhas narinas. Mesmo sendo uma casa simples, tinha uma inexplicável sensação de aconchego. Quando chegamos na cozinha, ela retirava a água do bule e depositava a mistura com ervas na xícara, preparando o chá.
Esse mulher não come? Toda vez que venho, ela está tomando chá.
Dou nos ombros, ignorando meu próprio pensamento.
— Por que disse que o Christian era a minha alma gêmea?
Ela toma um lugar na cadeira do canto enquanto opto por ficar de pé, ao lado da janela.
— Você chegou dizendo era ele quem havia feito pedido à estrela. Então, o que mais eu poderia dizer?
Suspiro em desistência. Para piorar, ela tinha razão.
— No começo, pensei que era o Christian mas depois de ver a sua dedicação à Velorum, percebi que não podia ser. Ele faria de tudo para ser amado por todos, mesmo que isso significasse me deixar em segundo plano. — respondo bebericando o chá. O gosto adocicado acariciava o meu paladar. — E alguém que olhou para o céu e viu esperança naquela estrela, assim como eu, precisaria estar quebrado por dentro. Precisava desejar com todas as suas forças por algo nunca experimentado em sua vida... Por um amor verdadeiro.
Circe balança a cabeça em concordância. As mãos enrugadas seguravam a xícara velha. A brisa invadia o cômodo bagunçando as mechas soltas do seu cabelo.
— Descobriu quem fez o pedido?
Arqueio a sobrancelha.
— Vai fingir que não sabe que foi o Lorcan?
Ela ria baixo.
— Garota esperta.
— Como sabia sobre o pedido?
— Ele apareceu aqui alguns meses atrás querendo saber dessa lenda. É muito suspeito que um homem treinado para matar se preocupe com algo tão "banal". O duque falou de uma empregada de sorriso radiante e, pela primeira vez, ele abaixou a guarda. Então, depois que você apareceu, comecei a ligar os pontos.
É uma confissão que me deixa surpresa e, ao mesmo tempo, feliz. Quer dizer que o meu sorriso o deixou desconcertado? Que fofo.
— Mas por que o Christian teve que me decepcionar tanto? — murmuro com um longo suspiro. — Eu o criei para ser perfeito.
— Porque são os defeitos que nos fazem melhorar. Se o criou para ser perfeito, Christian não iria evoluir em momento nenhum. Ele estaria preso para sempre em uma bolha de comodismo porque, em sua mente, não cometia erros. — Circe respondia dando um breve gole no chá. — A sua essência é a perfeição, algo tão vazio.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Velorum
RomanceUm pedido. Duas almas conectadas. Uma nova realidade. Natasha Martin é uma escritora que perdeu o seu ânimo após seu livro, Velorum, ser alvo de críticas negativas. Depois de retornar para o apartamento, decepcionada com uma descoberta do seu namora...