Capítulo 34

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Durante dois dias, sequer saí da cama. As empregadas surgiam periodicamente para entregar os remédios caseiros e as refeições. Isaac veio me visitar pela manhã e passou um bom tempo comigo, fazendo companhia. Logo após se recuperar do resfriado leve, tomei meu último café da manhã no quarto e vesti a roupa de treino. Alguns minutos antes, havia sido informada de que retornaria à base do exército.

— Cuide-se. Sentirei a sua falta. — comento segurando a mão de Isaac.

Ele sorria timidamente e deposita um beijo suave em minha bochecha. Então, Isaac se afastava para retornar às suas atividades diárias. Aproveitei para ir ao estábulo, onde me despedi de Polar acariciando sua crina macia. A égua relinchou em resposta e roçou o focinho comprido em meu rosto.

Por mais que quisesse me despedir de Arvid, ele estava na casa dos seus pais do outro lado de Icarus.

Enquanto esperava a carruagem na frente do castelo, notei algumas mulheres perto dos portões. Elas conversavam entre si mas param quando dois guardas aparecem. Eles apontam para algumas casas ao oeste de Icarus e pareciam dar instruções. Estou tão concentrada em entender sobre o que conversavam, que mal notei a aproximação silenciosa do duque.

— É deselegante ouvir conversas alheias.

Dou um leve pulo devido ao susto. Viro o rosto em direção à Lorcan que me analisava com curiosidade. A calça e o coturno preto não podiam faltar, mas ele usava uma camisa vermelha em uma tonalidade escura de um tecido macio, que destacou a sua beleza "sombria". A manga da camisa e o colarinho eram revestidos por bordados pretos que formavam espirais. A espada longa estava contida na bainha e presa em sua cintura. O cabelo levemente bagunçado e molhado.

O seu cheiro amadeirado é tão viciante, não posso negar.

— Não estava ouvindo a conversa de ninguém. — rebato cruzando os braços.

Ele apoiava as mãos nas costas, mantendo a cabeça erguida e o olhar focado no horizonte.

— Eu não sou um tolo.

Suspiro pesadamente e desisto de continuar a discussão. Lorcan é um cabeça dura, teimoso e arrogante. Então, retorno à atenção para as mulheres que agora estavam com a atenção voltada para nós dois. Elas faziam uma reverência formal para o duque antes de iniciarem uma caminhada para o centro da cidade.

Naquele momento, reconheci seus rostos e arregalei os olhos, surpresa.

— Elas trabalhavam na casa do senhor Rudson!

Lorcan assente silenciosamente.

— O que fazem aqui?

— Depois que ele foi morto... — comenta olhando para mim por breves segundos, antes de retornar o foco ao horizonte. — Por não possuir esposa e filhos, seus empregados seriam mandados para a casa de qualquer outro nobre. Mas o senhor Rudson corrompeu a imagem de suas empregadas aos quatro cantos de Velorum e era bem provável que todos pensassem que elas eram prostitutas.

Controlo a ânsia subindo em minha garganta. Ainda não havia esquecido a sensação desagradável daquelas mãos imundas passeando pelo meu corpo e as palavras ofensivas que fui obrigada a ouvir.

— Aquele maldito ainda conseguiu ferrar com a vida delas mesmo depois de morto!

— Eu ofereci a chance de viver em Icarus, desde que não saíssem e jurassem seguir todas as regras daqui. — Lorcan profere enquanto a brisa jogava o longo cabelo para trás. — Elas aceitaram sem pensar duas vezes.

Imediatamente, encaro o duque com um misto de surpresa e confusão no olhar. Ele salvou aquelas mulheres de um destino cruel, onde viveriam sendo tratadas como meros objetos. Não sei se Lorcan havia feito isso para diminuir a mão de obra na capital ou porque realmente se sentiu afetado ao presenciar a maneira como essas mulheres sofreram. Como eu sofri. Mas nem me importei com o motivo. Finalmente, alguém olhou para a situação delas e decidiu estender a mão.

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