Capítulo 59

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Dias depois, Alessandro se ausentou em uma viagem, destinado a entregar uma obra recentemente finalizada. Lembro-me de tantas vezes ter acompanhado o passo firme dele nesses eventos, mas agora, quem compartilharia dessa experiência seria sua nova assistente, Megan Scott. Às vezes, dou voltas sobre se essa decisão de sair foi a certa. Segundo minha irmã, tal inquietação provém do vínculo profundo que cultivei com aquele lugar ao longo dos anos. Acreditava, fervorosamente, que ao romper com o trabalho e abraçar uma rotina nova, finalmente encontraria a felicidade. Mas por que então, este vazio persiste?

Alessandro costumava ocupar cada centímetro do meu tempo, e agora, a ausência dele é uma lacuna que se faz notar de maneira estranha. Jenny, em seus sábios conselhos, sugeriu que eu deveria estudar o que sempre sonhei desde o início. Embora ela quisesse arcar com as mensalidades, por conta de nosso acordo, recusei e insisti em assumir as despesas. A pintura, compreendia eu, dotava o indivíduo com técnicas e saberes para moldar uma expressão mais aguçada, capacitando-o a criar nas superfícies bidimensionais as mais diversas formas.

— Primeiramente, o curso de graduação em pintura é, acima de tudo, uma oportunidade encantadora para vocês poderem ampliar suas técnicas, traduzindo tudo o que sentem em manifestações artísticas particulares. — disse o professor, deslizando vagarosamente pela sala, gesticulando com eloquência. — Por outro lado, é requerido dos estudantes um comportamento disciplinar bastante rigoroso, o que pode, em partes, fazer com que alguns procedimentos fiquem metódicos e contínuos, influindo no potencial do artista. — eu o observava atentamente, tomando nota de cada palavra. — O graduando em pintura costuma colocar muita emoção e sentimento em seus trabalhos. Dotado de uma sensibilidade sem igual, é capaz de retratar detalhes que muitas vezes, passam despercebidos por aqueles que não têm essa capacidade de percepção. — ele parou diante de sua mesa, apoiando-se nela com gravidade. — Ser um pintor não é simplesmente combinar cores! É reunir sentimentos, sejam eles bons ou ruins, e transformá-los em mensagens para o público. Aqui, vocês vão aprender: oficina de criação, desenho artístico, história da arte, teoria da pintura, teoria da percepção, análise da composição, conservação e restauração, exposição individual e, por último, a pintura em si. Para ser um bom pintor, é necessário, acima de tudo, enxergar com os olhos da alma, buscar detalhes ainda desconhecidos e descobrir formas e cores que encantem e mostrem verdade! — eu acenei com a cabeça, absorvendo suas palavras.

O toque do sinal anunciou o fim da aula. As cadeiras começaram a ranger com o movimento das pessoas que se erguiam. Observando-as, levantei-me também, recolhendo minhas coisas e pegando minha bolsa. Ao chegar em casa, fui recebida com afeto pela minha cachorrinha, acenando o rabinho com entusiasmo. Larguei a bolsa no sofá e dirigi-me ao banheiro. Após abaixar a calça, libertei-me. Após a limpeza, notei a mancha de sangue, indicando que, finalmente, aqueles dias haviam chegado.

Descartei o papel no lixo e decidi tomar um banho. Enquanto a água escorria, minha mente vagueava pelos momentos compartilhados com Alessandro, um sorriso espontâneo despontando nos lábios. Minutos depois, deixei o chuveiro, envolvendo-me numa toalha, e retornei ao quarto. Depositei as roupas sujas no cesto e, ao abrir a gaveta da cômoda, peguei uma calcinha e um absorvente.

Acomodada em um pijama, dirigi-me à cozinha para preparar o jantar. Optei por um miojo, uma opção rápida, econômica e descomplicada. Enquanto a água aquecia, liguei a televisão, sintonizando-me com as notícias do mundo. Repentinamente, um sinal anunciou a chegada de uma mensagem no celular.

Alessandro: Boa noite. — um sorriso brincou em meus lábios com o modo como ele me chamava, uma pitada de sarcasmo, mas tão característico dele.

Eu: Boa noite, senhor Russell.

Alessandro: Está em casa? — sentei-me no sofá, mordendo a unha, ao ler sua mensagem.

Eu: Sim, por quê?

Alessandro: Poderia abrir a porta para mim?

Li aquelas palavras com completa surpresa. Olhei para a porta e, ao abrir a porta, vi Alessandro, de pé, desviando os olhos da tela para mim. Ele sorriu, um daqueles sorrisos cativantes que só ele possuía, enquanto guardava o aparelho. Sem hesitação, encurtei a distância entre nós, pressionando os lábios contra os seus. Ele correspondeu, envolvendo-me com as mãos em minha cintura. Ao afastar nossas bocas, olhei em seus olhos.

— Aconteceu algo? — perguntei, seguindo-o e retirando seu blazer.

— Sim. — ele se virou em minha direção. — Estava com saudades de você. — nos encaramos por um momento. Sorrio, negando com a cabeça. Minha cachorrinha, aproximou-se.

— Oi pra você também. — Enquanto observava os dois, um pensamento flutuou em minha mente: a água no fogo!

— Ai meu Deus, esqueci da água! — corri até a cozinha e desliguei o fogo.

— O que estava fazendo? — ele perguntou, se aproximando.

— Estava esquentando a água para fazer macarrão instantâneo.

— Sabe que isso é veneno não é? — ele franziu o cenho.

— Eh, eu sei. Mas não como direto. Além disso, se você for parar para pensar tudo que consumimos é veneno.

Virei-me e abri o armário, estendendo a mão para pegar o macarrão. De repente, senti algo atrás de mim. Olhei para cima, encontrando sua mão ágil pegando o pacote com facilidade. Enquanto nossos olhares se encontravam, uma tensão elétrica percorreu o ar. Alessandro não hesitou, selando nossos lábios num beijo impetuoso.

Respondi com a mesma intensidade, envolvendo minhas mãos em seu pescoço. Seus dedos pressionaram minha cintura, e ele levantou minha coxa, prensando-me contra a bancada da cozinha, enquanto seus lábios encontravam meu pescoço. Mordi o lábio inferior, acariciando seus cabelos. Senti sua mão explorar a borda da minha calça, até que a realidade retornou: eu estava naqueles dias. Interrompi o momento.

—  Hoje não... — engoli em seco, abrindo os olhos.

— Por quê? — ele afastou uma mecha de cabelo do meu rosto.

— Porque não posso. — olhei para ele, o silêncio pesando entre nós.

— Ahh... — Ele faz uma pausa, deslizando a mão pelos meus braços.

— Então... — Me desvinculo dele. — Você já jantou?

— Não.  Acabei de deixar a Megan na casa dela.

— Ahh... — concordei com um aceno lento. Gostaria de jantar aqui? — perguntei.

— Só se não comermos macarrão instantâneo.

— Ok, então... — olhei para a televisão, onde passava um comercial de comida. — O que acha de pizza!? — Voltei a encará-lo.

— Pizza?

— Sim, pizza! Podemos pedir também um refrigerante. — meus olhos brilharam.

— Eu não como pizza.

— Mas hoje, vamos! — passei por ele, indo em direção à sala. Peguei meu telefone e abri o aplicativo de delivery. Fiz o pedido de uma pizza média e duas latas de refrigerante. — Prontinho! Agora é só aguardar. Enquanto isso... — envolvo minhas mãos em volta do seu pescoço e o beijei.

O Tubarão de Terno [Em breve atualizações]Onde histórias criam vida. Descubra agora